Nota de repúdio do Grupo Tortura Nunca Mais

NOTA DE REPÚDIO DO GTNM-RJ SOBRE O DECRETO DE BOLSONARO QUE EXTINGUE OS GRUPOS DE TRABALHO DE PERUS E DO ARAGUAIA

Rio de Janeiro, 22 de abril de 2019.

O Grupo Tortura Nunca Mais-RJ, repudia mais um ato do governo Bolsonaro. Por meio do Decreto 9759, assinado dia 11 de abril, – que extingue conselhos e órgãos colegiados ligados à administração federal -, Bolsonaro extinguiu os dois Grupos de Trabalho de identificação das Ossadas de Perus e do Grupo de Trabalho do Araguaia (GTA).

Este Decreto assinala o desrespeito à sociedade brasileira, aos mecanismos de proteção internacionais e à memória dos que foram mortos, torturados, exilados, abusados, sequestrados e desaparecidos pela violência do Estado durante a ditadura empresarial-militar de 1964. É uma completa violação aos Pactos Internacionais nos quais o Brasil reconhece a jurisdição desde o fim da ditadura, dentre eles, a Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948; a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, criada em 1959; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966; a Declaração de Viena, de 1993; a Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984, ratificada em 1989 e afirmada pelo Protocolo Facultativo à Convenção, em 2007. Dentre outros acordos internacionais, a Convenção Americana de Direitos Humanos, assinada em San Jose da Costa Rica, em 1969, entrou em vigor em 1978 e foi assinada pelo estado brasileiro em 25 de setembro de 1992.

Em 1969 se aprovou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que entrou em vigor em 1978 e que foi ratificada em setembro de 1997 por 25 países: Argentina, Barbados, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dominica, República Dominicana, Equador, El Salvador, Grenada, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Suriname, Trindade e Tobago, Uruguai e Venezuela. A Convenção define quais os direitos humanos que os Estados ratificantes se comprometem internacionalmente a respeitar e a dar garantias de cumprimento. No mesmo documento, foi criada a Corte Interamericana de Direitos Humanos, definindo as atribuições e procedimentos tanto para a Corte quanto para a CIDH. A CIDH mantém poderes adicionais anteriores à Convenção e que não decorrem diretamente dela, dentre eles, o de processar petições individuais relativas a Estados que ainda não são parte da Convenção. (https://cidh.oas.org/que.port.htm)

Vale ressaltar que, em 14 de dezembro de 2010, a Egrégia Corte Interamericana de Direitos Humanos julgou a ação Gomes Lund (Araguaia) X Estado brasileiro, reconhecendo assim, que o Brasil cometeu crime contra a humanidade no caso da Guerrilha do Araguaia.

A Corte estabeleceu um período de dois a quatro anos para o cumprimento da Sentença (dependendo do caso). Um dos resolutivos foi a criação de um Grupo de Trabalho Tocantins (GTT) e mais tarde denominado Grupo de Trabalho Araguaia (GTA), com a atribuição de realizar o levantamento, na área da Guerrilha, dos sítios onde foram enterrados os combatentes e a identificação dos seus restos mortais, o que até hoje não ocorreu.

O Brasil não acertou as contas com a sua história. Passados mais de trinta anos do fim da ditadura militar, não há esclarecimento sobre as circunstâncias das mortes e desaparecimentos políticos, a localização das ossadas dos mortos e desaparecidos, os torturadores não foram julgados e nem foram apuradas as responsabilidades pelos crimes de execução, tortura, desaparecimento, abuso sexual, dentre tantos outros. Mais de três décadas de governos civis não foram suficientes para completar a transição da ditadura e fazer com que o povo brasileiro conhecesse a sua história. Arquivos da ditadura permanecem fechados. A lei de Anistia permanece sendo interpretada pelo STF como um duplo perdão para os torturadores e torturados.

O decreto dando cabo da identificação das ossadas de Perus e não cumprindo minimamente a Sentença do Araguaia vem no bojo de um revisionismo histórico, em que torturadores se tornam heróis e golpes de estado são considerados movimentos democráticos.

Bolsonaro e seus aliados promovem o culto dos mais torpes personagens da ditadura, estimulam o ódio à democracia e pregam o retorno ao arbítrio, defende os crimes mais bárbaros praticados pelo Estado brasileiro durante a ditadura e defende os torturadores. Consideram o período da ditadura como um tempo benfazejo, sem os “perigos” da prática política democrática.

O presidente age como se não houvesse o ordenamento constitucional previsto na Carta de 1988. Ataca o instituto da anistia e os anistiados. Não respeita decisões judiciais. Desrespeita tratados e acordos internacionais dos quais o país é signatário.

Nosso repúdio à tentativa de negar o terror do período da ditadura, de tentar reescrever a história a partir do ponto de vista dos torturadores.

O nosso repúdio à paralisação do Grupo de Trabalho de Perus e do Grupo de Trabalho Araguaia.

Pela Vida
Pela Paz
Tortura Nunca Mais!

Imagem: Creative Commons. Das Wortgewand en Pixabay

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