Após mobilização, MEC garante 4 mil Bolsas Permanência a estudantes indígenas e quilombolas

Cerca de 1200 estudantes não serão contemplados pelo Programa Bolsa Permanência devido aos cortes de recursos. MEC comprometeu-se a incluí-los em outro programa

Por Tiago Miotto/Cimi

Durante semana de mobilização em Brasília, o Ministério da Educação (MEC) garantiu a abertura de quatro mil novas Bolsas Permanência para estudantes indígenas e quilombolas até o dia 29 de junho. O compromisso foi assumido em reunião realizada após uma marcha de estudantes e lideranças até o MEC, na quarta-feira (5).

Devido à falta de recursos alegada pelo MEC, entretanto, as bolsas não contemplarão a totalidade de indígenas e quilombolas que ingressaram no ensino superior entre 2018 e 2019 e encontram-se atualmente desassistidos, que é de 5200 estudantes – uma estimativa baseada em levantamentos dos próprios estudantes, já que o Ministério não dispõe de dados sobre o tema.

Por isso, o MEC comprometeu-se a “facilitar o diálogo” com reitores de Instituições de Federais de Ensino Superior (IFES) para que os aproximadamente 1200 estudantes que deverão ficar desassistidos sejam priorizados em outra plataforma, o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES).

Para Lucas do Nascimento Pataxó, coordenador do núcleo dos estudantes indígenas da Universidade Federal da Bahia (UFBA), a mobilização resultou numa vitória parcial.

“Avaliamos de uma forma positiva, mas ainda não é o ideal porque não foi solucionado completamente. A gente agora precisa dialogar com as universidades, reitores, pró-reitores, para ver como vamos atender os que ficarão fora”, avalia. “Nossa meta não é que se atenda só uma parte dos estudantes, e sim garantir que todos os que entraram na universidade tenham o acesso e o direito a permanecer nela”.

Os compromissos foram assumidos pelos titulares das Secretarias de Educação Superior (Sesu) e de Modalidades Especializadas de Educação (Semesp), e firmados em documento assinado também por lideranças indígenas e quilombolas. Segundo os secretários, o recurso de que o MEC dispõe para as Bolsas Permanência é de vinte milhões de reais.

A quilombola Gilvânia Silva do Rosário, estudante de serviço social da UFBA, pondera que a inclusão de indígenas e quilombolas no PNAES é uma solução paliativa, porque o valor das bolsas do programa é menor. Os estudantes aguardarão para ver se as promessas irão se concretizar nos próximos meses.

“Se o MEC não der nenhuma posição sobre essas 1200 pessoas, a gente tende a voltar aqui para cobrar que todos os quilombolas e indígenas sejam incluídos no Bolsa Permanência”, defende a quilombola.

Mobilização contínua

O Programa Bolsa Permanência é considerado indispensável para que indígenas e quilombolas que, especialmente a partir da instituição de cotas no ensino superior, passaram a ocupar cadeiras nas universidades e institutos federais do Brasil. A assistência de 900 reais, em muitos casos, é o que garante que eles possam sobreviver e estudar longe de suas aldeias e comunidades.

“Eu vim para cá não só para mim, mas para os meus primos, irmãos, que pretendem um dia cursar o ensino superior. Na minha universidade, tem indígenas que já estão desistindo. É um direito nosso, e viemos com a proposta também de fazer virar lei, porque atualmente é uma portaria”, afirma Kumreiti Cardoso Kiné, indígena do povo Gavião do Pará e estudante de Ciências Sociais da Universidade Federal do Sul do Pará (Unifespa).

A proposta de transformar o Programa Bolsa Permanência em lei foi levantada por indígenas e quilombolas no ano passado, quando realizaram sua primeira grande mobilização nacional em defesa de Permanência Já. Na ocasião, ações afirmativas para o segmento foram incluídas no Projeto de Lei (PL) 1434/2011, sob relatoria da deputada Alice Portugal (PCdoB/BA).

Assim como ocorre agora, o primeiro semestre de 2018 vinha transcorrendo sem que o governo Temer abrisse novas inscrições para o programa. Após uma primeira incidência, no ano passado, o MEC prometeu 800 bolsas para um conjunto de mais de quatro mil estudantes, o que impediria muitos de prosseguirem com seus estudos.

A mobilização nacional, realizada em junho de 2018, garantiu vitória aos indígenas e quilombolas com a abertura de Bolsas para os cerca de quatro mil estudantes que estavam desassistidos. Os que ingressaram no segundo semestre, entretanto, já encontraram o edital de inscrição encerrado – e desde então, nenhum novo foi aberto.

A estimativa de 5200 estudantes desassistidos, portanto, engloba os que ingressaram no segundo semestre de 2018 e no primeiro de 2019, já sob o governo Bolsonaro.

Contra os cortes

Indígenas e quilombolas também participaram das mobilizações contra os cortes do governo Bolsonaro na educação pública realizadas depois que o MEC anunciou, em abril, cortes de R$ 7,4 bilhões na Educação – reduzidos depois para R$ 5,8 bilhões.

Mesmo após o recuo de Bolsonaro, as universidades sofrem com cortes que chegam a R$ 2 bilhões, o que representa 30% da verba disponível para gastos cotidianos nas instituições de ensino. Em Brasília, a defesa da educação pública e o fim dos contingenciamentos também foi uma das pautas apresentadas por estudantes e lideranças.

“Estamos também mobilizados contra o que o governo está chamando de contingenciamento de verbas, e que nós chamamos de corte. As universidades não têm como manter os estudantes enquanto a bolsa não abre, com um auxílio emergencial, com esse corte de verba”, afirma Lindinês Gonçalves, quilombola da comunidade do Rio Preto, na Bahia, e estudante de Ciências Exatas e Tecnológicas na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

Imagem: Marcha em defesa de políticas de permanência para indígenas e quilombolas no ensino superior. Foto: Tiago Miotto/Cimi

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