Moro sugere encaminhamento de operação contra Intercept

A ideia de que o crime está em andamento confere a Moro uma carta na manga: pode recorrer ao “estado de flagrante delito” para, mais cedo ou mais tarde, deflagrar ações que atinjam o site

Por Jornal GGN

Em entrevista publicada pelo Estadão na última sexta-feira (14), Sergio Moro fez uma declaração que demonstra que o jornalismo do Intercept Brasil pode estar na mira da Polícia Federal.

Sem uma investigação conclusiva, o ex-juiz associou o dossiê da Vaza Jato – divulgado pelo site do jornalista Glenn Greenwald em doses pequenas, desde o domingo passado – aos ataques hacking reportados por membros da força-tarefa nas últimas semanas.

Moro declarou: “Não é só uma invasão pretérita que um veículo de internet resolveu publicar o conteúdo. Nós estamos falando aqui de um crime em andamento.”

Os hackers, segundo a narrativa do ministro da Justiça, “não pararam de invadir aparelhos de autoridades ou mesmo de pessoas comuns e agora têm uma forma de colocar isso a público”. O Intercept, insinuou Moro.

Provocando o site, o ex-juiz acuado por fortes indícios de advocacia administrativa e prevaricação, acrescentou: “Esse veículo não tem nenhuma transparência com relação a esse conteúdo. Então vai continuar trabalhando com esses hackers?”. Quis dizer: vai continuar trabalhando com “criminosos”?

A ideia de que há um crime em andamento confere a Moro uma carta na manga: pode recorrer ao “estado de flagrante delito” para, mais cedo ou mais tarde, deflagrar ações que atinjam o Intercept.

As diligências no âmbito de uma possível operação policial incluem medidas como busca e apreensão, prisão preventiva e condução coercitiva – tudo que está no menu da Lava Jato, como o Brasil inteiro bem sabe há alguns anos.

São duas questões graves: a primeira é a distorção dos fatos por parte de quem atrela as invasões recentes aos celulares de procuradores e juízes da Lava Jato às reportagens do Intercept. O portal jamais forneceu qualquer detalhe sobre a natureza de sua fonte.

Há correntes que acreditam, inclusive, que o vazamento poderia ter ocorrido a partir de alguém de dentro da operação ou com acesso facilitado aos aparelhos dos procuradores. Ou que o dossiê teria sido montado ao longo de anos. São hipóteses alternativas à história sacada por Moro em sua auto-defesa, que um grupo de hackers bancado por recursos milionários estaria em ação desde abril, e teria adulterado as mensagens – suspeita providencial para quem não quer assumir a autoria dos diálogos.

O segundo ponto é o eventual uso do aparato de Estado em causa própria.

O cientista político Alberto Carlos Almeida já defendeu o afastamento imediato de Moro do cargo, assim como o ex-deputado federal Wadih Damous (PT). O motivo é claro: o ex-juiz não pode estar acima da instituição (Polícia Federal) que já investiga as invasões hacking em 4 inquéritos.

O QUE ACONTECE COM MORO

plot twist se dá quando a malandragem é capaz de engolir o malandro.

Criminalizar o Intercept para abortar os vazamento é “a estratégia mais óbvia” para Moro, mas investir numa operação policial ostensiva é a saída “mais truculenta e burra de se realizar, porque ao fazer isso ele estará confessando o uso do Ministério da Justiça para criminalizar um veículo e um jornalista que estão o acusando de cometer os crimes de advocacia administrativa e prevaricação.”

É o que avalia, em entrevista ao GGN na tarde deste sábado (15), o professor de Direito Rogério Dultra, da Universidade Federal Fluminense.

Dultra explicou que se Moro recorrer a essa jogada, estará sujeito a dois tipos de ação: uma por crime de responsabilidade – em que o Congresso será chamado a se manifestar e processar – e outra por improbidade, cuja tramitação é mais “eficaz”.

“Qualquer um pode entrar com a ação [no Supremo Tribunal Federal] contra ele. Na hipótese de Moro usar cargo público para finalidade indevida, ele fica submetido aos crimes previstos no artigo 11 da lei de improbidade.”

“A lei de improbidade não é a mesma que a lei de impeachment. Ela vale contra qualquer funcionário público. Uma das penas é a exoneração do funcionário, e a outra pena é banir, por alguns anos, o agente condenado de qualquer cargo público – similar ao que está previso na lei do impeachment”, explicou Dultra.

DESMORONANDO

Apesar das suspeitas sobre quais serão os próximos passos de Moro, o professor – um dos especialista em Direito que sempre esteve atento e denunciando os abusos e decisões esquizofrênicas produzidos pela Lava Jato – acredita que o ministro, em breve, “não terá mais força para fazer qualquer movimentação”.

“Sua posição é praticamente insustentável. E se por acaso se publicizar uma ação truculenta dessa natureza [uma operação policial contra o Intercept, por exemplo], ele não teria condições de permanecer ministro, pois submeteria o governo Bolsonaro à situação de conivência e de parceria com investigações irregulares contra a imprensa.”

“Moro já provou que, como juiz [da Lava Jato], fez advocacia administrativa, ou seja, advogou para a parte [acusação]”, disse Dultra. “Para o País, é mais interessante que Moro seja escorraçado da vida pública o quanto antes”, finalizou.

Moro conversa com o senador Aécio Neves em premiação em 2016. Foto: Alex Silva /Estadão.

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