O tema foi debatido em audiência pública da comissão externa da Câmara que acompanha ações do Ministério da Educação
Por José Carlos Oliveira, Câmara dos Deputados
Especialistas apontam problemas de gestão, orçamento e estrutura para a educação indígena no Brasil. O tema foi debatido (em 3/7) em audiência da comissão externa da Câmara que acompanha as ações do Ministério da Educação. Na avaliação do Conselho Nacional de Educação, a situação é “ruim” nas 3.345 escolas indígenas do país, onde estudam quase 256 mil alunos. A conselheira Suely Menezes sintetizou o diagnóstico quanto a dois dos principais gargalos da área: a formação de professores e a qualidade da oferta e funcionamento das escolas.
“A grande discussão é operacional: são legislações e normas ignoradas, desobedecidas ou interpretadas de modo equivocado, gerando muita frustração, desânimo e até revolta nas populações”.
Organizadora do debate, a deputada Joênia Wapichana, da Rede de Roraima, deu exemplos práticos de problemas atuais.
“Para se ter ideia, as crianças só começaram o ano letivo praticamente em maio, enquanto outras escolas do Brasil todo já estão quase de férias. E há professores que, com o pouco salário que têm, ainda devem dar conta da limpeza da escola, da merenda escolar e do transporte. Essa é a realidade”.
O próprio MEC apresentou dados do Censo da Educação Básica, do ano passado, que apontam número elevado de escolas indígenas sem tratamento de água (1.970), esgoto sanitário (1.634) nem energia elétrica (1.076). A esmagadora maioria não tem biblioteca (3.077) nem banda larga (3.083). Outro ponto preocupante: das 3.345 escolas, cerca de 30% (1.029) não funcionam em prédios escolares e quase metade (1.546) não utiliza material didático específico da educação indígena. Para reverter esse quadro, o Conselho Nacional Educação elabora as diretrizes nacionais dos parâmetros de qualidade da educação indígena e quilombola. Relatora desse processo, Suely Menezes pretende cobrar mecanismos mais eficazes de punição dos gestores nas leis e demais normas.
“Não dá para pensar em qualidade se a gente não pensar nos aspectos culturais, indenitários, linguísticos, territoriais, pedagógicos. É fundamental a gente discutir as penalidades”.
Até dezembro, o governo federal pretende elaborar o Plano Nacional de Educação Escolar Indígena com foco no fortalecimento das ações de União, estados e municípios e no controle social. Porém, o representante do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena, Ibui Pataxó, se queixou da falta de investimento público e do que chamou de “riscos de retrocesso” no governo Bolsonaro.
“Como se constrói um plano nacional sem recurso específico para educação escolar indígena? Não tem como discutirmos educação escolar indígena quando as nossas terras garantidas por lei são impedidas de ser demarcadas”.
Já o secretário de Modalidades Especializadas de Educação, Bernardo Goytacazes de Araújo, minimizou os problemas orçamentários, criticou estados e municípios que não aplicam os recursos repassados pelo MEC e ressaltou que os problemas atuais são “herança” de governos passados.
“Não houve contingenciamento na educação básica. Insistem em mentir em relação a isso. Por exemplo, hoje estão parados, só nos estados do Centro Oeste, R$ 6,7 milhões só para questão indígena. Quando a gente avalia os municípios do Centro Oeste no geral, tem-se um valor que ultrapassa R$ 1 milhão. Tenho ciência de que a gente não vai conseguir resolver tudo: são mais de 1.100 escolas que faltam no país inteiro só para a questão indígena. Fora as que estão ruins. Fico muito satisfeito de vocês verem o tamanho do passivo e da herança que nós recebemos. Mas estamos aqui para trabalhar com isso”.
Segundo o secretário, os recursos de emendas parlamentares são bem-vindos no apoio às escolas indígenas. Goytacazes acrescentou que atrasos no repasse de recursos para programas de ensino superior de indígenas acontecem por recomendação do Tribunal de Contas da União, devido à falta de prestação de contas das universidades. O governo anunciou 4 mil novas vagas no Programa Bolsa Permanência, voltado para universitários indígenas, quilombolas e em situação de vulnerabilidade.
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Foto: Funai