Paulo César Feital monta front contra o extremismo em novo álbum

Um dos compositores mais gravados do país lança álbum de forte crítica política

Por Augusto Diniz, na Carta Capital

Ao lado de Lucas Bueno, o compositor e poeta Paulo César Feital acaba de lançar um dos discos mais contundentes de crítica sociopolítica dos últimos tempos. O álbum Lágrimas apresenta 10 faixas de forte condenação ao momento.

“A minha arma contestatória é a música, e esta obra simplesmente narra as mazelas, sem deixar de apontar as saídas, de uma Vera Cruz contemporânea”, diz Feital, contando orgulhar-se da parceria musical com Lucas Bueno: “Tão jovem comprometido com ideais”.

Feital é um dos compositores mais gravados do país. Suas composições já passam de 500 gravações e regravações pelo primeiro time da MPB, como Milton Nascimento, Beth Carvalho, Leny Andrade, Roberto Menescal, entre outros. Lágrimas é o seu quinto disco.

Bueno e Feital se conheceram no campo de Chico Buarque

Bueno conheceu Feital no Politheama, campo de peladas de Chico Buarque. Achava na época “audácia” a troca de passes ir além do campo. Mas o compositor gostou do que viu fora dele, num movimento musical com a nova geração da MPB.

“Depois da minha apresentação, Feital, generosidade materializada que é, acabou gostando e convidou-me para compor com ele. Começamos a ser parceiros numa série de canções e num rompante percebemos que todas possuíam um cunho crítico e social”, diz.

Daí nasceu o CD Lágrimas, impulsionado pelo cenário sociopolítico desastroso. “Diante de tamanha intolerância, ódio, cerceamento de liberdade, esfacelamento de direitos conquistados, não cabe sermos indolentes num país governado por ardis”, afirma Bueno.

Na faixa É Foda, uma estrofe significativa da junção do pensamento de ambos compositores da realidade: “Bem sei quais são as lições / Que aprendi no porões entre chagas e gritos / Um: Não temer opressões / Que reprimam canções e separem amigos / Dois: Despertar multidões / Dos letárgicos dons que apavoram inimigos / Três: É unir corações / Retomar as paixões pra falência do ‘Mito’”.

Na música Palhaços, que fecha o disco, um grito lírico: “Eu sou um palhaço / De um circo montado / No lado mambembe / Baldio de mim / Também sou um mágico / Tiro da cartola / Sapatos sem sola e trapos de brim / Ando no arame por sobre a tristeza / Linha da pobreza / Me equilibro assim / Pois sou trapezista de um circo de horrores / Na lona das dores dos Tupiniquins”.

Duas faixas da dupla Feital e Bueno têm parceria póstuma com João Nogueira: o jongo Setembrina e o baião Pão com Goiabada. Já Samba pra Darcy, que abre o CD, é uma homenagem a Darcy Ribeiro. O disco tem participações especiais de Nina Wirtti, Cláudio Nucci, Moyseis Marques, Vidal Assis e Soraya Ravenle.

Nova geração desconectou-se da história

“A composição litero-musical brasileira, com mais destaque na minha geração, postou-se sempre como denunciadora das injustiças e querelas causadas pela prepotência e ambições dos poderes extremistas”, ressalta Feital.

Mas isso mudou para um estacionamento cultural depois da Ditadura, crê ele. “Os herdeiros políticos, aliados ao poder econômico mundial, desconectou as gerações vindouras do passado histórico da nação”.

Isso estaria expresso na música brasileira de lá para cá. “Entristece-me testemunhar companheiros que assistiram a degradação imposta pelos porões, apoiarem o extremismo”.

E vai além: “Qualquer um que concorda no que está em vigor no país, não deve negar a sua concordância com o homofobismo, racismo, feminicídio, aniquilamento indígena. Enfim, tudo aquilo que o presidente eleito jamais escondeu”.

Não é de hoje que Paulo César Feital faz através da música contestação daquilo que o aflige, como nas músicas 1789 (composição com Claudio Cartier e gravada por Olivia Home), 40 Anos e Brasil de Oliveira da Silva do Samba (ambas com Altay Veloso e interpretada por Emílio Santiago e Alcione, respectivamente) e Paralelo a Neruda (com Cartier e gravada por Nana Caymmi).

“O momento atual não nos deixou, para mim e Lucas, alternativas. Era necessário um posicionamento de resistência pacífica perante a gravidade das ações e das resoluções para o aniquilamento cultural e pouco que ainda sobrevivia do sistema educacional”.

Mesmo com esse quadro de sufocamento cultural, Feital aponta um front de resistência de jovens talentos, como os artistas que participaram do CD Lágrimas.

Autor de grandes sucessos

O violonista Claudio Cartier foi o primeiro parceiro prolífero musical de Feital e com quem fez grandes composições. É o caso de Saigon (Carlão também assina a música), eternizada por Emílio Santiago.

“A voz mais bonita e aquele que me deu grandes alegrias, com Saigon,  Flamboyant (parceria com Jota Maranhão), Perfume Siamês (com Altay Veloso) e tantas outras interpretações”, lembra Feital do inesquecível intérprete falecido em 2013.

Entre os sambas antológicos de Paulo César Feital, cita-se Mais Feliz (com Elton Medeiros e Carlinhos Vergueiro), Carvão e Giz (com Luiz Carlos da Vila) e Labareda (com Jorge Simas).

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Osni Diaz.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

catorze + 19 =