MPF pede que Justiça obrigue União, ANM e Banco Central a planejarem combate ao comércio ilegal do ouro

Também foi pedida decisão que obrigue prestação de contas sobre quais foram as medidas tomadas nos últimos cinco anos contra as irregularidades

Ministério Público Federal no Pará

O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal que obrigue a União, a Agência Nacional de Mineração (ANM) e o Banco Central (BC) a apresentarem à Justiça um conjunto de ações de combate à extração e comercialização de ouro ilegal. O MPF pretende ainda que  União, ANM e BC sejam obrigados a apresentar à Justiça relatório com informações sobre todas as medidas tomadas, nos últimos cinco anos, para combater a comercialização ilegal do minério.

O MPF também pediu à Justiça Federal que obrigue a União e a ANM a informatizarem o sistema de controle da cadeia econômica do ouro no país, a fiscalizarem o uso das licenças simplificadas para garimpos, e a definirem quem pode ter acesso a essas licenças.

Em relação ao BC, foi pedido pelo MPF que seja exigida a apresentação e execução de plano de medidas administrativas que garantam um maior controle da custódia do ouro adquirido pelas Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) e pelos Postos de Compra de Ouro (PCOs).

Os pedidos foram feitos em uma das ações ajuizadas pelo MPF em 2019 com base em provas e dados coletados durante três anos pela instituição e pela Polícia Federal (PF). A investigação inédita esmiuçou o funcionamento de uma das maiores empresas compradoras de ouro no maior polo da mineração ilegal no Brasil, a bacia do Tapajós, no sudoeste do Pará.

Nessa ação, o MPF cita, pela primeira vez, trechos de um manual de atuação da instituição para o combate à mineração ilegal. O documento foi elaborado pela força-tarefa Amazônia do MPF, que fez um diagnóstico aprofundado sobre os problemas, indicando soluções para a questão.

Detalhes dos pedidos – Tão importante quanto à reversão da tendência atual de sucateamento da fiscalização ambiental, é necessário que os demais entes estatais e privados responsáveis assumam suas obrigações e participem da resolução do problema, entende o MPF.

“O que se quer é trazer novos atores à cena: entes estatais (União, ANM e Banco Central), que até então estão completamente omissos no enfrentamento do problema; assim como entes privados (Postos de Compra de Ouro/Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários), que atualmente operam em um ambiente regulatório extremamente propício a fraudes”, critica o MPF.

Por isso, além do MPF pedir que a Justiça obrigue a União, BC e ANM a prestarem contas das medidas tomadas e a planejarem novas providências para o combate à extração e ao comércio ilegal do ouro, o MPF pediu que a ANM seja obrigada tanto a normatizar o Sistema Brasileiro de Certificação de Reservas e Recursos Minerais, nos termos da lei 13.757/2017, quanto a informatizar todos os procedimentos relativos à compra, venda e transporte do ouro, em obediência à portaria nº 361/2014 da agência. Também foi pedido que a ANM seja obrigada a cancelar todas as Permissões de Lavra Garimpeiras (PLGs) com prazo de exploração vencido e as PLGs cujos relatórios anuais de produtividade não tenham sido apresentados ou que não tenham informado a produção efetiva da lavra.

Assinada pelos procuradores da República Camões Boaventura, Paulo de Tarso Moreira de Oliveira, Ana Carolina Haliuc Bragança, Patrícia Daros Xavier e pelo assessor jurídico do MPF Rodrigo Magalhães de Oliveira, a ação do MPF também pede à Justiça Federal em Santarém (PA) que seja declarada a omissão ilegal e inconstitucional da ANM em adotar ato administrativo normativo que defina a atividade garimpeira de modo claro e objetivo, e que a agência seja obrigada a publicar regulamentação com critérios técnicos sobre quais atividades podem ser autorizadas por meio de PLGs e, portanto, se enquadram no conceito constitucional e legal de atividade garimpeira.

Essa regulamentação, segundo o pedido do MPF, deve estar em conformidade com a Constituição, no que se refere à pobreza do garimpeiro e à utilização de instrumentos rudimentares, aparelhos manuais ou máquinas simples e portáveis. Deve excluir, do enquadramento legal de garimpo, atividades empresariais e/ou capitalizadas, que utilizem maquinários de alto valor, tendo em vista a incompatibilidade desse perfil com os conceitos constitucional e legal de garimpo. E também deve, segundo o pedido do MPF, proibir que uma mesma pessoa ou cooperativa seja detentora de mais de uma PLG.

Enquanto esse ato normativo não for adotado, o MPF quer que a ANM seja impedida de emitir novas PLGs e que, quando a nova regulamentação estiver valendo, não seja mais permitida a expedição de PLGs em desacordo com ela, e ainda, que sejam feitas a revisão e a fiscalização de todas as PLGs já emitidas, e que sejam canceladas as permissões incompatíveis com as novas regras.

O MPF também pediu que o BC seja obrigado a proibir a DTVM Ourominas de comercializar ouro até que a empresa promova a devolução aos cofres públicos dos prejuízos causados, faça a compensação pelos danos ambientais provocados, e apresente plano que preveja mecanismos internos de accountability. O plano deve incluir, necessariamente, a fiscalização rigorosa das atividades dos PCOs vinculados à empresa, pediu o MPF na ação judicial.

Em denúncia criminal ajuizada pelo MPF pouco antes da ação civil pública, integrantes do PCO da Ourominas em Santarém foram acusados de formarem uma organização criminosa para fraudar documentação e, assim, “esquentar” (acobertar) a origem clandestina do ouro. Só entre 2015 e 2018, o grupo fraudou a compra de 610 quilos do minério, causando um prejuízo de R$ 70 milhões à União. E esse prejuízo pode ser muito maior, tendo em vista que o valor foi calculado com base nas indicações das notas fiscais, que são preenchidas apenas pelos criminosos, com indicações bem inferiores ao valor de mercado.

Série – Desde o final de julho o MPF está publicando uma série de notícias para resumir como as várias fragilidades do sistema de controle da cadeia do ouro possibilitam a atuação de organizações criminosas como a denunciada pela instituição e geram prejuízos financeiros, sociais e ambientais de proporções devastadoras.

Também estão sendo descritos os pedidos feitos pelo MPF à Justiça relativos às instituições públicas e às empresas processadas.

Este é o sexto texto da série.

O conteúdo integral das ações, com todos os detalhes disponíveis, estão nos seguintes links:

Ação cível: processo nº 1003404-44.2019.4.01.3902 – 2ª Vara da Justiça Federal em Santarém (PA)

Íntegra da ação

Consulta processual

Ação criminal: processo nº 0000244-28.2019.4.01.3902 – 2ª Vara da Justiça Federal em Santarém (PA)

Íntegra da ação

Decisão judicial

Consulta processual

Imagem: Garimpo ilegal desativado na região da Terra Indígena Munduruku, no sul do Pará. Foto: Vinícius Mendonça/Ibama

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