Para Raquel Dodge, vedação do debate pedagógico acerca de temas político-partidários, de gênero e orientação sexual fere preceitos fundamentais
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), com pedido de medida cautelar, a fim de suspender qualquer ato do poder público que autorize ou promova censura a docentes no ambiente escolar. De acordo com a PGR, a medida foi motivada pelo crescente número de leis e movimentos que buscam implantar um modelo de ensino que contraria o modelo educacional vigente, definido pela Constituição Federal e regulamentado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996).
Entre os movimentos apontados pela PGR, está o Escola Sem Partido, que propõe restrições à liberdade de expressão dos docentes com base em vedações genéricas e vagas à “doutrinação” política e ideológica. Além disso, visa a impor limites à emissão de opiniões político-partidárias, religiosas ou filosóficas, à manifestação de convicções morais, religiosas ou ideológicas eventualmente contrárias às de estudantes, pais ou responsáveis, e à abordagem de questões relacionadas a gênero e sexualidade no ambiente escolar, aponta a PGR.
De acordo com a procuradora-geral da República, a ADPF tem como propósito resolver a controvérsia conforme o tratamento conferido à matéria pela Constituição Federal e, com isto, afastar as graves ocorrências, verificadas em âmbito nacional, que colocam em risco a garantia do direito fundamental à educação. “A escola é o espaço estratégico para a construção de uma sociedade de pessoas que se dirigem umas às outras de forma ética, sendo essencial, a tal propósito, a abordagem de questões como gênero, identidade de gênero e orientação sexual”, ponderou.
Para Raquel Dodge, normas que buscam obstar a discussão pedagógica desse e de outros assuntos violam o direito fundamental à igualdade de gênero, uma vez que reforçam o paradigma heteronormativo e rejeitam a diversidade sexual. Além disso, ferem preceitos fundamentais, dentre os quais estão o direito à igualdade de gênero, à educação voltada ao exercício da cidadania e ao respeito às diferenças, bem como princípios e objetivos de uma educação democrática. Ela também apontou violação à liberdade de ensinar como uma manifestação do direito fundamental à educação e ao direito da criança, do adolescente e do jovem de ser colocado a salvo de toda forma de discriminação e violência.
Pareceres anteriores – Na ADPF apresentada, a PGR destaca que o Ministério Público Federal (MPF) vem sendo provocado de forma cada vez mais frequente a atuar em casos homólogos. Em virtude disso, solicita efeito liminar para sobrestar decisões do poder público relacionadas ao tema até que seja solucionada a controvérsia. Anteriormente, a PGR já havia se manifestado em pelo menos 11 ADPFs e 3 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) contra normas que instituíam censura ao exercício docente e à liberdade de expressão.
Em todas as manifestações, a PGR reforçou a sustentação dos requerentes no sentido de que as respectivas leis usurpam a competência da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, afrontando o princípio do pacto federativo. Além disso, defende que normas que limitem a abordagem pedagógica relacionada a questões de gênero e orientação sexual não se compatibilizam com os princípios constitucionais que conformam a educação nacional.
Os pareceres da PGR tiveram como alvo leis municipais de vários municípios, dentre eles Petrolina e Garanhuns (PE); Cascavel, Paranaguá e Foz do Iguaçu (PR); Ipatinga (MG); e Tubarão (SC). Em todas elas, a PGR manifesta-se pelo conhecimento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) e, no mérito, pela procedência do pedido no sentido de suspender a eficácia dos dispositivos, de modo a preservar a interpretação constitucional relacionada ao tema.
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Arte: Secom/PGR