As borboletas, a farofa e o PSL. Por José Ribamar Bessa Freire

No Taqui Pra Ti

Borboleta amarela / no céu azul / infinita beleza. / Não fazer mal a ninguém / infinita beleza. (Avaju Poty Guarani)

Essa história é verdadeira? Quer que eu conte? Contarei o conto que ainda nem contei. Estamos no ano 2.025. A cadeia de lojas “Mariposão” dedicada ao ramo de exportação e importação comercializa borboletas da Amazônia exportando-as para a Europa e os Estados Zunidos. De lá, traz sucatas para vender em Manaus. Por isso, ninguém entendeu quando o seu proprietário, que respondia pelo nome autenticamente amazônico de Wuppslander Rienk – o Vupinho, para simplificar – comprou vastas extensões de terra em Coari, capital da banana, a preço da dita cuja:

– Vamos plantar milhões de bananeiras e fabricar rios de cachaça no Alto Solimões.

A notícia caiu como uma bomba na Associação Manauara de Exportadores de Borboletas Amazônicas (AMEBA), formada por empresários falidos da antiga Zona Franca de Manaus. Afinal, toda a economia amazônica girava, agora, em torno da exportação de cerca de 3.500 espécies de borboletas, umas mais procuradas que outras, dependendo das cores e do sabor.  

– Por que bananas e cachaça, se o mercado quer borboletas? – perguntavam-se intrigados os filiados à AMEBA, que desconheciam aquilo que Wuppslander Rienk e Maurício Babilônia sabiam muito bem.  

O mundo inteiro, efetivamente, começara a comprar mariposas, quando o chef Pascal Foucher, do restaurante Le Cabanon de Versailles, apresentou no Festival Gastronômico de Paris sua mais nova criação – uma farofa supimpa de borboletas da Amazônia feita com crosta de ervas de Provence, pimenta doce, échalotes fleur de sel de Camargue.

A partir daí, a receita se espalhou por todas as regiões da França, levada à Corrèze pela chef Juliette Moulin e para Brive-la-Gaillarde por Daniel Patridgeon. A Farrofá de Papillon de l’Amazonie entrou no menu das escolas francesas, depois da experiência exitosa em escolas bilíngues da Occitânia – as calandretas – por sugestão dos sauciers Mathias Gibert e Delphine Piffeteau.

Negócio do século

A receita ganhou o mundo enriquecida pelo chef Jean-Claude Frébourg do restaurante Momofuku Ko, de New York, que trocou os échalotes, indecisos sem saber se são alho ou cebola, pelo tomilho e o alecrim.

Vupinho, o dono do “Mariposão”, em entrevista aos jornais de Manaus, revelou que cada unidade comprada dos cabocos pela mixaria de R$ 2,00 era vendida ao exterior por R$ 463.50. A burguesia de igarapé fez as contas e descobriu, maravilhada, que estava diante do negócio do século, tão rendoso quanto criar um partido político como o PSL (vixe, vixe) que recebera mais de um bilhão de reais repassados pelo Fundo Eleitoral para, de acordo com lei sancionada pelo então presidente Jair Bolsonaro, em setembro de 2019, pagar advogados e contadores, comprar e alugar imóveis e impulsionar conteúdos na internet. O “laranjal” dava para enriquecer rapidamente.

Com exceção do Fundo de Financiamento de Campanha e do Fundo de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, em toda a história do sistema capitalista, nenhuma outra atividade proporcionou margem tão fabulosa de lucro como a exportação de borboletas. Havia um porém: as brigas entre os Bivar, os Bolsonaro, as Joice, os Delegado Waldir, os Major Olimpio et caterva, em busca voraz pelo controle da grana, tornava a exportação de borboletas mais lucrativa.

Dizem que até o procurador Leonardo Azeredo dos Santos, de Minas Gerais, que não podia mais viver naquele miserê com um salário de R$ 24 mil, se demitiu do Ministério Público, desistiu de se filiar ao PSL e foi para o Amazonas, armado de redes de filó e puçás de tule para caçar as libélulas voadoras.

Foi uma loucura. Deputados, senadores e até ministros do STF renunciaram ao mandato, em busca desta atividade mais rentável. A febre delirante se apossou da alma dos brasileiros, conscientes de que aquele curto período de prosperidade seria seguido por longa fase de crise, desemprego e miséria, como acontecera com o pau-brasil, as drogas do sertão, a cana de açúcar e o ouro no período colonial e com o café, a borracha e o cacau no Império e na República.

Caça predatória

Acontece que as borboletas, que antes eram vistas aos milhares, voando tranquilamente e dançando em movimentos lentos e compassados, começaram a rarear. Por que? Os pesquisadores passaram a estudá-las. Leandro Moraes, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), flagrou uma delas bebendo as lágrimas de um pássaro adormecido, usando a parte bucal tubular longa como um canudinho para sugar o líquido, Publicou artigo na revista Ecology.

Outros estudiosos observaram que elas se alimentavam também de lágrimas de tartaruga, uma forma de obterem sal, ausente do néctar. Um deles documentou na Amazônia colombiana uma mariposa se alimentando das lágrimas de um martim-pescador. Os pássaros, no entanto, desapareceram com a queimada da “porra” das árvores.

Foi aí que as borboletas, que parecem silenciosas, sofisticaram a forma de se comunicar, como descobriu a entomologista da Universidade da Flórida (UFA), Mirian Hay-Roe, que com um gravador capturou suas falas e publicou artigo no Journal of Insect Behavior.

A voracidade dos predadores humanos, a poluição, o desmatamento, as queimadas e as mudanças climáticas ameaçavam extinguir muitas espécies. A notícia do extermínio circulou entre elas, que procuraram refúgio nas terras indígenas, fazendo com que o presidente da República, o Messias Mi(n)to, com coragem e desassombro, denunciasse:

– É uma coincidência impressionante que todas as terras reclamadas pelos índios sejam justamente os celeiros de borboletas. Aí tem o dedo das multinacionais. A Amazônia é nossa. As borboletas acima de tudo.

O ciclo da borboleta estava mesmo esgotado? Estariam as multinacionais interessadas na banana e na cachaça? Por que o empresário Wuppslander havia, de repente, planejado plantar bananeira, quando a cotação desta fruta na bolsa de Nova York estava mais baixa do que a baixa da égua?

Essas eram perguntas que empresários se faziam em assembleia convocada pela AMEBA. O mistério foi esclarecido por Vupinho que inventara um engenhoso sistema:

– A banana e a cachaça não são para a exportação. Elas servem para aumentar a proliferação de borboletas.

Plantando bananeiras

Como ninguém entendera, ele explicou. As lagartas que se transformam em crisálidas, antes de parirem as borboletas, se alimentam de folhas de bananeira, certo? Desta forma, plantando bananeiras se cria condições para aumentar a população das lagartas e, em consequência, das borboletas, certo?

– E a cachaça? – indagou um dos sócios da AMEBA.

– Bem, a cachaça é na verdade uma isca, um método de captura. Os entomólogos e os lepidopterologistas observaram que quando as borboletas, que são frugíferas, querem se alimentar, procuram nas flores ou nos frutos fermentados os líquidos que aspiram avidamente com a tromba distendida, como se fosse um canudinho, certo?

Ele tinha o cacoete de terminar suas frases assim, certo? Aí revelou o procedimento adotado:

– Consiste em amassar a banana, derramar a cachaça sobre ela e colocá-la nas árvores. Atraídas pelo cheiro, as borboletas pousam sobre essa gororoba e sorvem a cachaça, tomando o maior porre de caipirinha de banana. Bêbadas, podem ser capturadas com a mão por qualquer criança. Podemos, então, contratar menores de idades para a caça desses insetos diurnos, que são fáceis de identificar e se entregam sem resistência, certo? É o Partido de Saquear Libélulas em ação.

A AMEBA aprovou o método revolucionário do trabalho infantil usado na Inglaterra no séc. XIX, que diminuirá os custos de produção, interferindo na propensão a poupar e na relação capital-produto. Um dos empresários sugeriu medidas de precaução para evitar atrair a família Bolsonaro sempre de olho na bufunfa, certo?

Entrou pela perna do pato, saiu pela perna do pinto.
Quem acredita no relato, faça fé que eu não minto.

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