Manifesto dos Atingidos do Paraopeba – Os atingidos e as atingidas não param de lutar!

Manifesto dos atingidos e atingidas organizados da Bacia do Paraopeba sobre decisão da audiência da 6ª Vara Fazendária do TJMG no dia 28/11

No Mab

Nestes dez meses de crime da Vale na bacia do Paraopeba é fato a incansável luta dos atingidos e atingidas por direitos e pela reparação integral. Todo o dia 25, denunciamos juntos aos familiares das vítimas e entoamos o mesmo grito por justiça a todas as joias enterradas na lama e a todos os projetos de vida destruídos.

Reafirmamos que enquanto os responsáveis não forem punidos e os direitos dos atingidos forem garantidos, com participação ampla, informada e com poder de decisão, continuaremos lutando para que não aconteçam novos crimes das grandes empresas em seus projetos extrativistas pelo lucro que violam os direitos do povo e do meio ambiente.

Na luta pelo processo de reparação dos danos socioeconômicos e socioambientais, acompanhamos do lado de fora do Tribunal de Justiça de Minas Gerais todas as audiências, onde pudemos mostrar mais uma vez que não nos calaremos diante desta corporação reincidente em destruição da vida humana, de sonhos e da natureza. Sabemos que todas as decisões que geraram conquistas foram fruto da luta dos atingidos/as na garantia de seus direitos e não por “bondade” da Vale.

Na audiência do dia 28 de novembro de 2019, tínhamos dois pontos de luta que são fundamentais para os atingidos/as. Demandávamos que o pagamento integral do emergencial permanecesse para as 108 mil pessoas atingidas nos critérios já elaborados e que fossem inseridos os demais atingidos que estão fora do critério atual, mas que tiveram seus modos de produção e reprodução de vida atingidos e tem direito ao auxílio emergencial como forma de mitigação dos danos gerados. Ainda, contávamos com a aprovação da assessoria técnica, somente com a qual poderá se iniciar o processo de construção de parâmetros, diretrizes e ações que garantam a reparação integral dos atingidos/as.

No entanto, ao termino da audiência, o resultado não foi o esperado.  O acordo, realizado a portas fechadas pelas partes – Vale e Instituições de Justiça – sem participação dos atingidos, determinou que a empresa continuasse a pagar o valor do auxílio emergencial por 10 meses de forma integral somente a cinco comunidades em Brumadinho: Parque da Cachoeira, Alberto Flores, Córrego do Feijão, Canta Galo e Pires, além dos atingidos que moram no entorno do Córrego Ferro Carvão e daqueles que já estão cadastrados em algum programa da Vale.

Porém, todos os demais atingidos e atingidas que já recebem o auxílio ou que estão na fila de espera de aprovação do cadastro emergencial terão o valor do auxílio reduzido em 50% a partir de 25 de janeiro de 2020. Ainda, não foi criado nenhum critério para inclusão das pessoas que necessitam do auxílio, mas não estão incluídos nos critérios atuais. Ou seja, um enorme retrocesso e uma violação dos direitos de reparação dos atingidos, mas também ao direito de participação e ao direito dos atingidos e atingidas em dizer o que deve ser reparado e como deve ser reparado.

A contratação da Assessoria Técnica também não teve desfecho. Escolhidas desde maio, a Vale tem se negado a aceitar que as entidades entrem em campo para início do trabalho. Sabemos que a Vale tem interesse na produção unilateral de dados técnicos, como maneira de negar os direitos dos atingidos.

Ainda que tenha sido escolhida a UFMG como perita do juízo, é direito dos atingidos que haja uma entidade independente que assegure a participação popular de forma ampla e informada. Não se trata de mais um simples processo judicial em que somente o juiz tem o poder de decisão. São centenas de milhares de vidas que foram atingidas individual e coletivamente, onde a culpa é clara e o dever de reparar integralmente também.

Se tratam de violações de direitos humanos em que a tutela do Estado – nesse caso, do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e das demais Instituições de Justiça – deve assegurar a ampla participação com qualificação técnica, sob o risco de violar novamente os direitos humanos de todos.

O paradigma que está colocado para o Sistema de Justiça é o da democratização do acesso à justiça, para que realize não somente a jurisdição, mas que represente a concretização dos valores constitucionais e dos direitos humanos.

A quase um ano do crime da Vale, os atingidos estão desprotegidos por não terem uma Assessoria Técnica que os ajude na luta por reparação integral. A Assessoria Técnica é uma inovação na garantia dos direitos humanos em conflitos socioambientais, pois respeita a centralidade da vítima no processo de reparação, com a produção de dados técnicos independentes, ampliação da participação com a criação de mais espaços qualificados de informação e participação, e criação de resiliência dos atingidos na continuidade do processo de reparação que deve se prolongar ao longo do tempo, tendo em vista a gravidade do dano ao meio ambiente e à saúde de todos. Enquanto isso, vemos a atuação sistêmica da Vale no território, com desrespeito aos direitos em todos os níveis do processo.

A proposta para que o pagamento do auxílio emergencial seja pago no valor de 50% de um salário mínimo para quem já recebia o auxílio, em sua maioria, serve somente para minimizar os gastos da Vale no processo de mitigação e reparação integral dos danos causados pela empresa na bacia do Paraopeba.

Como reflexo de tal decisão, a Vale já iniciou o processo de corte de fornecimento de água em diversos territórios afetados, para excluir ainda mais o número de pessoas inscritas em programas que também teriam direito à continuidade no recebimento do auxílio emergencial. Ainda, diversos atingidos que deram entrada no pedido do auxílio emergencial ainda se encontram desassistidos, sem saber como recorrer, vez que a execução do pagamento emergencial se encontra na mão da empresa violadora.

A Vale vai cada vez mais ganhando tempo, enrolando os atingidos/as e apresentando para mídia e para a sociedade que está realizando programas e ações para resolução de todas as questões dos atingidos/as, quando de fato, como denunciam os atingidos/as, nada é resolvido. Tal lógica atende somente aos seus acionistas e investidores, para os quais a responsabilidade social da empresa é aquela apresentada em seus relatórios anuais, ainda que não haja seja reflexo da realidade.

Toda luta é justa, e a dos atingidos/as deve continuar para não perder o que conquistamos e para conquistar mais direitos. A luta deve ser daqueles que neste primeiro momento conquistaram mais direitos e dos que estão tendo o direito violado. A união faz a força. Seguiremos em luta com os atingidos/as e que não fique nenhum atingido sem amparo e sem seu direito.

Atingidos e Atingidas da Bacia do Paraopeba

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