Após marcha, povos indígenas da região Sul pedem a Maia que devolva PL 191 a Bolsonaro

No Cimi

Na manhã desta quarta (12), 50 lideranças dos povos Guarani, Guarani Mbya, Ava Guarani, Kaingang e Xokleng marcharam até a Câmara dos Deputados, em Brasília, em manifestação contra o PL 191/2020, projeto do governo Bolsonaro que abre as terras indígenas para mineração, garimpo, hidrelétricas, agronegócio e exploração de petróleo e gás natural.

Após a marcha, as lideranças protocolaram um documento no qual cobram do presidente da Casa, Rodrigo Maia, que mantenha seu compromisso e devolva o projeto de devastação das terras indígenas ao Executivo.

Acompanhadas de integrantes da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos Indígenas, as lideranças de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná foram recebidas por uma assessora do presidente da Câmara, a quem entregaram o documento.

“Esse PL é um projeto de morte para os povos indígenas. Por isso, Rodrigo Maia, pedimos a você: não seja cúmplice do genocídio dos povos indígenas do Brasil”, afirma trecho do documento.

Confirma o documento na íntegra:

RODRIGO MAIA, DEVOLVA O PL 191/2020: LIBERDADE É TER NOSSA TERRA DEMARCADA, SEM MINERAÇÃO, SEM HIDRELÉTRICAS E SEM AGRONEGÓCIO

Ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia

Nós, lideranças dos povos Guarani, Guarani Mbya, Ava Guarani, Kaingang e Xokleng, dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, manifestamos nosso repúdio ao Projeto de Lei 191/2020, levado à Câmara pelo governo de Jair Bolsonaro e assinado pelos ministros Bento Albuquerque e Sérgio Moro.

Consideramos que esse projeto de lei, que abre nossas terras à exploração e aos interesses econômicos dos ricos e poderosos, significa uma declaração de guerra aos povos indígenas do Brasil. É um projeto anti-indígena que esconde, sob uma falsa ideia de “liberdade”, uma licença para aqueles que sempre invadiram nossas terras, derrubaram nossas matas, massacraram nossos povos e, agora, buscam devastar e se apropriar do pouco que ainda resta de nossos territórios originários.

Não aceitamos mais esta mentira do governo Bolsonaro e de seus ministros – entre eles, Sergio Moro, que finge que não existimos, mas assina nossa sentença de morte. Liberdade, para nós, é usufruir de nosso território tradicional sem mineração, sem hidrelétricas e sem agronegócio, em comunhão com os rios, as matas e os animais.

Em muitas regiões, como a nossa, a situação é agravada pela demora do Estado brasileiro em cumprir seu dever constitucional de demarcar nossas terras, o que nos causa grande sofrimento e até obriga muitos de nós a viver em acampamentos, às margens das terras que nos pertencem e pelas quais nunca deixamos de lutar.

O que Bolsonaro chama de “sonho” é, para nós, o pior dos pesadelos

Para os ruralistas, as mineradoras, as empreiteiras e seus serviçais, como Jair Bolsonaro, mesmo o pouco que temos é demais: seu objetivo é acabar com as terras e com os povos indígenas, e com o pouco de mata que ainda nos resta.

O presidente da República Jair Bolsonaro definiu este projeto como um “sonho”. O que Bolsonaro chama de “sonho” é, para nós, o pior dos pesadelos.

E não se enganem aqueles que pensam que nosso destino não afeta a todos: vivemos sob o mesmo céu, respiramos o mesmo ar e bebemos a mesma água. A devastação das terras indígenas por mineradoras, a destruição dos rios por hidrelétricas e a redução da biodiversidade pelos transgênicos terá consequências terríveis para o meio ambiente e para a vida de todos, não só a nossa.

O pacote de maldades reunido no PL 191/2020 não é o único ataque do governo Bolsonaro à Constituição Federal e aos nossos direitos originários. Desde que assumiram seus postos no governo federal, Jair Bolsonaro e Sergio Moro transformaram a Funai em um escritório de ruralistas e fundamentalistas religiosos.

Processos de demarcação de terras indígenas já paralisados estão retrocedendo sem justificativa. Ao invés de nos defender na Justiça, a Funai alega “falta de interesse” e abandona processos judiciais que discutem nossas terras. A cada dia, o governo Bolsonaro rasga a Constituição e fomenta ataques contra nossos territórios e nossas lideranças.

Tudo isso é feito com base na tese do marco temporal, uma invenção dos ruralistas para mudar o sentido da Constituição e legitimar o roubo das nossas terras. Enquanto o marco temporal legitima as invasões ocorridas no passado, o PL 191 busca legalizar as invasões de nossos territórios no presente e no futuro.

Rodrigo Maia, pedimos a você: não seja cúmplice do genocídio dos povos indígenas do Brasil

O PL 191/2020 não prevê consulta a nós, povos indígenas, para nos perguntar se queremos ou não esses empreendimentos em nossas terras – não temos nem sequer o direito de dizer NÃO. A tutela e o autoritarismo, superados com a Constituição de 1988, agora retornam com força para tentar calar a nossa voz. Essa postura afronta e desrespeita totalmente a convenção 169 da OIT.

Por isso, pedimos aos parlamentares e especialmente a você, Rodrigo Maia, que honre o compromisso assumido conosco e com os demais povos de outras regiões e devolva o PL 191/2020 ao Poder Executivo, como você disse mais de uma vez que faria. Pedimos que não permita mais esse ataque contra nossos direitos originários.

Esse PL é um projeto de morte para os povos indígenas. Por isso, Rodrigo Maia, pedimos a você: não seja cúmplice do genocídio dos povos indígenas do Brasil.

Nosso futuro, hoje, está em suas mãos. Esperamos que elas não se sujem com nosso sangue.

Imagem: Povos indígenas da região Sul marcharam até a Câmara contra o PL 191/2020. Foto: Tiago Miotto/Cimi

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