Aliado de relator da MP da Grilagem abriu empresa para regularizar terras em Minas

Ambos são réus no TRE; vídeos mostram ex-diretor de Projetos de Assentamento do Incra, Ewerton Giovanni, em campanha para deputado Zé Silva (SDD-MG) em 2018; MP-910, de 2019, beneficia empresa criada no mesmo ano pelo amigo, a Legaliza Brasil

Por Alceu Luís Castilho e Leonardo Fuhrmann, em De Olho nos Ruralistas

Um aliado do deputado federal Zé Silva (SDD-MG) criou em julho do ano passado, em Brasília, uma empresa de regularização fundiária. Zé Silva é hoje o relator da MP 910, conhecida como MP da Grilagem, que trata justamente de regularização fundiária. A proposta, apresentada como medida provisória pelo governo Jair Bolsonaro, tem como objetivo facilitar a regularização da ocupação de terras públicas federais. É a primeira vez que uma proposta assim inclui outras áreas do Brasil que não apenas a Amazônia Legal.

Ewerton Giovanni dos Santos, diretor geral da empresa Legaliza Brasil, hospedada no site Minha Terra Legal, se apresenta como ex-secretário-adjunto da Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Indicado por Silva. Ele também foi Diretor de Desenvolvimento de Projetos de Assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra (2016-2019), consultor jurídico geral do município de Gouveia-MG (2013-2016) e extensionista agropecuário da Emater-MG (1997-2012).

A empresa tem sede em Brasília e foi fundada em julho do ano passado. O mesmo ano em que Bolsonaro enviou ao Congresso a MP da Grilagem. O Solidariedade tem poder no Incra desde o governo Temer. Mas Zé Silva só se tornou relator no início deste mês, quando a matéria foi enviada ao Plenário da Câmara. Antes, o projeto havia sido relatado em comissão pelo senador Irajá Abreu (PSD-TO).

De Olho nos Ruralistas mostrou nesta segunda-feira (11) que o senador Irajá Abreu (PSD-TO), tinha interesses diretos no processo de regularização fundiária: “Texto de Irajá na MP da Grilagem beneficia negócios do padrasto“. Seu padrasto e um dos principais assessores de sua mãe, a também senadora Katia Abreu (PP-TO), têm uma empresa dedicada à comercialização de terras.

As histórias das duas duplas (Zé Silva e amigo, Irajá e padrasto) — são similares. Só que, ao contrário da dupla de Tocantins, os dois mineiros não são parentes. E sim aliados políticos.

MP DIZ QUE ALIADO FAVORECEU CANDIDATO

Quando era diretor de desenvolvimento de projetos de assentamento do Incra-MG, Santos foi acusado pelo Ministério Público Eleitoral de usar pelo menos três vezes atos oficiais do Incra em Minas para favorecer a candidatura de Zé Silva. Foram entregas de máquinas agrícolas, como tratores, de domínio e concessão de assentamentos e visitas a projetos de assentamento.

Ele e o parlamentar são investigados por uso indevido da máquina pública. Caso sejam condenados, o deputado Zé Silva pode ter seu mandato cassado por crime eleitoral.

Confira um dos vídeos em que Santos, agora empresário, pede votos para o político:

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, Silva “distribuiu patrulhas mecanizadas (trator, carreta e grade) a 25 assentamentos agrários em Minas Gerais, fazendo uso autopromocional, com fins eleitorais, dessa distribuição”. Durante a entrega, com a participação de Santos, os políticos apareciam com material de campanha de Silva e chegaram a fazer um coro em alusão ao número do candidato nas urnas.

O observatório identificou vários vídeos onde Santos, em sua página no Facebook, faz campanha para o deputado. Ele e outros apoiadores, entre eles beneficiados pelas iniciativas governamentais, como assentados da reforma agrária, aparecem com o adesivo do candidato em suas camisas. O aliado pede explicitamente votos para Zé Silva.

Confira mais um desses vídeos:

DEPUTADO TROCAVA EMAILS COM SUPERINTENDENTE DO INCRA

Segundo uma reportagem publicada pelo Estado de Minas, o parlamentar chegou a trocar mensagens eletrônicas com os funcionários do Incra para discutir a organização das festas para a entrega das máquinas e chegou a sugerir mudanças nas prefeituras beneficiadas. Pelo menos quatro funcionários comissionados do Incra em Minas eram parentes de assessores de Silva ou filiados ao Solidariedade.

A Controladoria Geral da União, ainda de acordo com o jornal mineiro, apontou que o deputado e seus assessores trocaram 564 e-mails com Robson Fonzar, na época superintendente do Incra em Minas, e com Santos. O Incra ficou sob influência do Solidariedade durante a gestão do ex-presidente Michel Temer. Fonzar foi afastado por determinação da corregedoria do órgão.

Com as vitórias de Bolsonaro e Silva nas eleições de 2018, o parlamentar continuou com poder dentro da estrutura do Ministério da Agricultura e Santos acabou  nomeado secretário-adjunto da Secretaria de Agricultura Familiar, mesmo já sendo investigado por crime eleitoral.

Além de deputado federal, Zé Silva é presidente estadual do Solidariedade em Minas Gerais e líder do partido na Câmara. Foi secretário de Trabalho e Emprego do Estado durante a gestão do governador Antônio Anastasia (PSDB). Ele é integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o principal braço institucional da bancada ruralista.

TCU E MPF PREOCUPAM-SE COM MEDIDA PROVISÓRIA

Parlamentares de oposição e movimentos sociais ligados a povos tradicionais, ambiente e acesso à terra, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público Federal (MPF) manifestam preocupação com o texto que está no Congresso. O argumento é que a medida, criada a pretexto de favorecer pequenos produtores, na verdade beneficia criminosos especializados em invadir terras públicas.

A proposta facilita o pagamento de indenizações a quem não cumprir os requisitos necessários e não obriga o autor do pedido de regularização a estar radicado na terra para requerer a propriedade e permite a regularização em nome de empresas. Além disso, retira a exigência de vistoria nos imóveis rurais com até quinze módulos fiscais.

A versão de Zé Silva flexibiliza as condições para desmatamento após a titulação da área, desde que o proprietário adira ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) ou assine Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

Foto (Reprodução): Zé Silva e Ewerton Giovanni posam em frente aos tratores da discórdia

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