Escassez de testes e de sistema informatizado são possíveis causas para subnotificação de casos de Covid-19 em comunidades

Danielle Monteiro, no Informe Ensp

Pesquisas apontam que há subnotificação extrema de casos confirmados de Covid-19 no Brasil, indicando um total dez vezes maior em comparação ao atualmente registrado. Isso significa que seriam mais de 1,6 milhão de infectados, contra os 514.849 mil confirmados até a última segunda-feira (1/06) pelas Secretarias Estaduais de Saúde. Isso porque, entre outros fatores, existe alta incidência de assintomáticos. Em média, 80% dos indivíduos contaminados pela doença não apresentam sintomas, segundo pesquisas internacionais.

Nas favelas do país, a situação não é diferente, inclusive nas comunidades e territórios mais vulneráveis do Rio de Janeiro, como Rocinha e Complexo do Alemão. De acordo com o Painel de Atualização de Coronavírus nas Favelas do Rio de Janeiro, criado pelo portal Voz das Comunidades, até esta segunda-feira (1/06), o Alemão registrou 85 casos confirmados de Covid-19, com 28 óbitos. No entanto, de acordo com dados do Painel de Covid-19 da prefeitura do Rio de Janeiro, foram 11 casos confirmados e 5 óbitos, até a referida data.

Na Rocinha, segundo dados do portal Voz das Comunidades, foram 206 casos confirmados e 55 mortes, contra 195 casos e 42 óbitos contabilizados pelo painel da prefeitura do Rio de Janeiro. A comunidade é a que possui maior número de casos confirmados entre as favelas cariocas, o que, segundo o portal Voz das Comunidades, pode ser creditado a características da geografia local, como becos apertados, pouca ventilação e baixa incidência de sol, as quais favorecem a proliferação de doenças respiratórias. Na segunda posição do ranking de favelas mais afetadas pela Covid-19 está a Maré, com 191 casos e 52 óbitos, seguida pela comunidade do Jacaré, com 147 casos e 19 mortes. No total, são 1.123 mil casos confirmados e 266 óbitos nas comunidades do Rio de Janeiro, segundo dados do Covid-19 nas Favelas.

É sabido que existe uma subnotificação de casos do novo coronavírus em todo o mundo. No entanto, pode haver fatores específicos que explicam os números maiores que os oficiais nas regiões mais pobres do Brasil, como as comunidades cariocas. Entre os elementos que podem favorecer esse cenário, está a escassez de recursos materiais para a realização de testes voltados à população local. “Muitos usuários chegam à Unidade de Saúde pedindo a testagem, mas, na Atenção Básica, não temos esse recurso para fazer. Outra questão relatada pelos usuários é a ausência de realização de testes em pacientes que estavam em estado grave, chegando a virar óbito, no serviço de saúde de grande porte”, relata uma aluna da Pós-Graduação da ENSP e enfermeira da Unidade de Saúde da Rocinha.

A profissional de saúde conta que, como não é realizado o teste em todos os pacientes graves suspeitos de infecção pelo novo coronavírus, as certidões de óbito não identificam a causa da morte como Covid-19, mas sim como Síndrome Respiratória Aguda não especificada, o que pode comprometer a mensuração final de casos da doença.

A falta de interesse por parte de um olhar específico voltado a populações menos favorecidas, somada à tentativa de inviabilizar problemas sociais existentes há tempos no país, também pode explicar a subnotificação de casos em comunidades, segundo a profissional de saúde. “Com a intenção de se prevenir da pandemia, são necessários recursos básicos como água e habitações com infraestrutura, o que não existe na realidade de quem vive em regiões mais pobres. Não divulgar os reais dados é uma forma de não trazer à tona essas desigualdades sociais”, afirma.

Outra possível explicação para os números superiores aos oficiais em regiões vulneráveis é a falta de uma metodologia de notificação informatizada na Estratégia de Saúde da Família. “Na Unidade de Saúde onde trabalho, a notificação é toda manual. Existe um carro que passa uma vez por semana para recolher essa notificação, e isso comprova certa morosidade no sistema”, relata Luiza Pereira, aluna de Pós-Graduação da ENSP e enfermeira da Unidade de Saúde de Duque de Caxias.

Foto: Paula Cavalcanti

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