O delegado Marcelo Xavier tornou-se presidente da Funai. Ailton Benedito tornou-se Secretário de Direitos Humanos da PGR. E Rocha sofreu censura do CNMP. O CNMP passará. Mas o exemplo de Wilson Rocha, frutificará.
No GGN
Ontem, o Conselho Nacional do Ministério Público, o mesmo que adiou por 40 vezes o julgamento de Deltan Dallagnol, aprovou moção de censura contra o procurador Wilson Rocha.
Não poderia ter feito opção melhor para demonstrar seu viés. Rocha é um representante do que de melhor o Ministério Público Federal pós Constituinte legou ao país. Sua defesa dos direitos dos indígenas é um marco na história dos direitos das minorias do país.
Pedro foi enterrado descalço, em um caixão muito simples, velado em cavaletes e conduzido por índios Xavante rumo à sepultura de terra adornada por uma bandeira do MST e um cruzeiro de pau, conforme descrição de Camilo Vanucchi no seu Facebook.
Na cerimônia, Rocha provavelmente foi a única autoridade aceita, demonstração maiúscula do respeito angariado por seu trabalho, em uma região na qual a defesa dos índios traz riscos de vida.
Rocha soube de Dom Pedro através de um livro escrito nos anos 70, “Creio na Justiça e na Esperança”, que sua mãe ganhou de uma amiga que teve os filhos presos na ditadura. Em 2013 foi ao Araguaia em uma missão coordenada pela subprocuradora Deborah Duprat. La conheceu pessoalmente dom Pedro. Foi tão intensa a impressão que, dois meses depois, Rocha pediu designação para atuar em questões do Araguaia.
Trabalhou quatro anos em casos difíceis, o mais pesado dos quais a desintrusão de Maraiwatsede, terra Xavante, ou seja, medidas legais para concretizar a posse efetiva da terra indígena depois da etapa final do processo. Foi um caso de ampla relevância política. A Força Nacional era convocada para expulsar os invasores. Bastava sair para haver outra invasão.
O MPF fez operação de interceptação de telefonia para identificar quem estaria por trás das invasões. Foram identificados os deputados federais Nilson Leitão e Osmar Serraglio. Um de seus assessores foi gravado negociando dinheiro para incluir questões de interesses de muralistas no relatório da PEC que pretendia mudar as formas de desapropriação de terras indígenas.
As denúncias contra ambos os deputados foram encaminhadas à Procuradoria Geral da República. Leitão foi denunciado junto ao STF; Serraglio escapou sob o argumento de que quem aparecia nos áudios era apenas um assessor dele. E o STF limitou-se a aceitar o pedido de abertura de inquérito contra ele.
Nas conversas, o delegado de Barra dos Garças Marcelo Xavier era tratado como aliado dos fazendeiros que invadiam as terras indígenas. Barra dos Garças é o local da prelazia do Araguaia. Rocha foi até Cuiabá e solicitou o afastamento do delegado. O pedido foi atendido. Como represália, o deputado Leitão abriu uma CPI da Funai e trouxe o delegado Marcelo para assessorá-lo. Vários procuradores foram representados, mas os casos foram arquivados na corregedoria do MPF por falta de fundamento.
Ontem, o procurador Wilson Rocha foi censurado pelo CNMP porque externou sua indignação contra as palavras abjetas de Jair Bolsonaro, em relação ao desaparecido político Fernando Santa Cruz, pai de Felipe Santa Cruz presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e por alguns retuítes.
Não usou palavrão, não xingou ninguém. Apenas mostrou a indignação própria dos homens justos.
Antes disso, o procurador Ailton Benedito, conhecido por sua atuação virulenta nas redes sociais de apoio ao bolsonarismo, representou contra Wilson Rocha acusando-o de violação do dever inerente ao cargo de procurador e crime de calúnia, por ter afirmado, nas redes sociais, que a recomendação de Benedito, para que o estado de Goiás revisse as medidas de enfrentamento do coronavirus, “ameaça a vida de seus pais, a vida de seus filhos, a vida em sua cidade”. O caso foi arquivado pelo CNMP.
Nesses tempos bicudos, o delegado Marcelo Xavier tornou-se presidente da Funai. Ailton Benedito tornou-se Secretário de Direitos Humanos da PGR. E a proposta de censura a Rocha foi apresentado ao CNMP pela Comissão processante do processo administrativo disciplinar, integrado por André Bandeira de Melo Queiroz e Patricia Ferreira Wanderley de Siqueira. Ainda será submetido ao plenário do CNMP que, em geral, apenas ratifica esse tipo de proposta..
O CNMP passará. Mas o exemplo de Wilson Rocha, frutificará.
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A íntegra dos documentos pode ser vista no site do GGN, AQUI.