Cacique Avá Guarani é preso em plena pandemia acusado de roubo de espigas de milho no oeste do Paraná

Após a colheita de milho, crianças recolheram as espigas que ficaram no solo, não acessadas pela colheitadeira. O fazendeiro as acusou de furto

No Cimi

O cacique Crídio Medina, do tekoha Guasu Guavirá, aldeia Ywyraty Porã, município de Terra Roxa (PR), foi preso na noite da última quarta-feira (26) pela Polícia Civil local e levado à delegacia para prestar depoimento sobre um suposto roubo de milho. Os policiais o acusaram de acobertar “crime” cometido pelas crianças da aldeia.

Após a colheita de milho, numa propriedade vizinha ao tekoha, as crianças recolheram as espigas que restaram no solo, não acessadas pela colheitadeira. O dono da propriedade, ao perceber a ação, acionou a polícia, que encontrou dez sacas com espigas de milho no interior da comunidade. Com isso levou o cacique para prestar depoimento e o delegado decretou a sua prisão.

A comunidade está muito abalada, porque sem terra para plantar e sem condições de sair fora da aldeia para trabalhar, por conta da pandemia do novo coronavírus, ainda estão sofrendo com esse abuso. Classificaram como uma violência absurda, resultado de preconceitos. Segundo eles, as espigas de milho que a colheitadeira não alcança, rentes ao solo, nenhum proprietário, no geral, recolhe porque não paga o custo do trabalho. As crianças da aldeia, inocentemente, decidiram buscar algumas espigas para preparar avati ku’i (farinha) e para fazer o kangui e rora, bebida típica dos Guarani, produzida com milho maduro. Foram surpreendidos pelo dono da lavoura que considerou um crime de furto.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul entende a posição da comunidade e com a mesma intensidade denuncia esse ato de crueldade, racismo e preconceito. Os Guarani, que tiveram praticamente todas as terras roubadas e ninguém foi punido, agora são considerados criminosos por buscar sobras de alimentos. É um ato no mínimo covarde, num país em que autoridades são acusadas de rachadinhas e estão em liberdade, mas se torna crime quando um Guarani recolhe milho para se alimentar.

Pedimos ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Ministério Público Estadual (MPE) que intervenham nesse caso e verifiquem o crime de discriminação e racismo, bem como abuso de autoridade. Não é a primeira vez que os Guarani são acusados de crime. Em 2018, cinco Guarani do tekoha Mokoi Joegua, no município de Santa Helena, foram presos pelo corte de bambu, que seria utilizado num ritual religioso.

O Cimi Sul exige a imediata liberdade do cacique Crídio Medina e a investigação sobre o crime de racismo e discriminação.

Cimi Regional Sul

Chapecó (SC), 28 de agosto de 2020

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Osni Diaz.

Povo Avá Guarani na Tekohá Guasu Guavirá. Foto: Cimi Regional Sul

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