Idosos, grávidas e crianças Bororo são retirados de aldeia diante de incêndio no Pantanal

Fogo da Terra Indígena Teresa Cristina demorou onze dias para ser controlado; moradores ainda convivem com a fumaça e com dificuldades no abastecimento de água e de alimentos; eles fizeram fotos do fogo e da retirada por ônibus e enviaram à reportagem

Por Leonardo Fuhrmann, em De Olho nos Ruralistas

Os indígenas da etnia Bororo tiveram de retirar crianças, grávidas e idosos de dentro da Terra Indígena Teresa Cristina, no município de Santo Antônio do Leverger, no Mato Grosso, em função do incêndio que atinge o Pantanal. Ao todo, 45 indígenas foram levados para o posto da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) de Rondonópolis no último domingo. Pelo menos outros 50 foram removidos para casas de parentes. Segundo Cleidiane Koriga, que faz parte do grupo de líderes de saúde da tribo Gomes Carneiro, os indígenas retirados estavam com problemas de saúde em razão da fumaça. “A nossa aldeia chegou a ficar cercada pelo fogo”, afirma.

Segundo ela, a situação causa uma dupla preocupação. A maioria dos indígenas que foi levada das aldeias não estava saindo de lá pelo temor de contaminação pela pandemia de Covid-19. “Eles estavam permanecendo dentro do território para evitar possível contagio, sem ir para outros lugares”, diz. Muitos têm doenças que podem agravar o quadro de saúde nos casos de Covid-19, como diabetes e hipertensão. Em Rondonópolis existem 156 casos confirmados da doença entre indígenas.

Ao todo, moram cerca de 500 indígenas nos 35 mil hectares da TI. A demarcação do território é mais do que centenária, mas boa parte das terras foi roubada dos indígenas e sua homologação jamais foi concluída. A primeira demarcação foi feita pelo marechal Cândido Rondon, em 1896, com uma área de 166 mil hectares. As terras passaram a ser invadidas com o apoio do governo estadual principalmente a partir dos anos 1950. No meio dos anos 1970, ainda durante a ditadura, o processo começou a ser refeito garantindo aos indígenas apenas 25% da área original. Declarada em 2005, a TI não foi concluída até hoje.

INDÍGENAS LUTARAM SEM EQUIPAMENTOS CONTRA O FOGO

O incêndio começou a atingir a TI no último dia 04 e foi combatido pelos indígenas desde então, com o apoio de Bororos de outras regiões e da etnia Bakairi. “Muitos de nós tivemos de enfrentar as chamas mesmo sem treinamento e equipamento apropriado”, afirma Cleidiane.

Um jovem que liderava um dos grupos de combate foi intoxicado pela fumaça e precisou ser socorrido. O posto da Funai dentro da aldeia chegou a ser destruído pelo fogo. Com o apoio de bombeiros, acionados pela Funai, o incêndio dentro da reserva foi controlado na última segunda-feira. A fumaça, no entanto, continua causando problemas aos indígenas. Aqueles que foram retirados ainda não sabem quando voltarão para casa.

Mas não é apenas a fumaça que impede a retomada da vida normal pelos indígenas. A queimada destruiu plantas que eram usadas para a coleta de alimento, ervas medicinais e outros cultivos , além de afastar a caça. Outro problema que já vinha se agravando é com a água e a pesca. “O nosso rio está secando”, explica a indígena. “A gente enfrenta problemas com queimadas todos os anos, mas nunca tinha sido tão grave como agora”.

A Polícia Federal iniciou uma operação contra o desmatamento na segunda-feira. Segundo a instituição, o dano ambiental apurado supera mais de 25 mil hectares do bioma pantaneiro, atingindo Áreas de Preservação Permanentes e os limites do Parque Nacional do Pantanal Mato-Grossense e da Serra do Amolar. Para o delegado Alan Givigi, responsável pelas investigações, há indícios de que os incêndios tenham sido provocados por fazendeiros, com o objetivo de expandir os pastos para o gado.

Foto principal (Divulgação/Bororo): imagens foram tiradas pelos indígenas e enviadas ao De Olho nos Ruralistas

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

4 × cinco =