MPF move ação para anular licenças concedidas à Eletronuclear para construir nova instalação nuclear em Angra (RJ)

Para tal projeto, são necessários estudo de impacto ambiental e divulgação do pertinente relatório de impacto ambiental (EIA/RIMA), audiências públicas, consulta prévia e informada às populações tradicionais circundantes e prévia aprovação do Congresso Nacional

Procuradoria da República no Rio de Janeiro

O Ministério Público Federal (MPF) move ação civil pública, com pedido de liminar, contra a Eletronuclear, a Comissão nacional de Energia Nuclear (CNEN) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para suspender empreendimento em Angra dos Reis (RJ) considerado uma nova instalação nuclear. Os órgãos reguladores expediram licenças simplificadas para uma situação em que a Constituição Brasileira prevê a aprovação por parte do Congresso Nacional, além de estudo de impacto ambiental e divulgação do pertinente relatório de impacto ambiental (EIA/RIMA), audiências públicas, consulta prévia e informada às populações tradicionais circundantes. (Número da ACP: 5000859-25.2020.4.02.5111)

“As licenças ambientais foram expedidas indevidamente. Isso porque, os depósitos a seco possuem natureza jurídica de nova instalação nuclear. Nesse sentido, evidente a necessidade de autorização prévia do Congresso Nacional para a sua implantação (art. 21, XXIII, “a”, da CF), o que não ocorreu no caso concreto. Por outro lado, tratando-se de atividade de significativo impacto ambiental, há necessidade de realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental e de seu relatório (EIA/RIMA – Art. 2º, da Resolução Conama nº 01/86), sobretudo por se tratar de armazenamento de combustíveis irradiados, ausente no caso concreto, tendo sido expedida licença ambiental pelo Ibama apenas com fundamento em Relatório Ambiental Simplificado (RAS)”, detalha a ação.

Diante disso, o MPF requer, sob pena de multa até o valor total de R$ 18 milhões, que a Eletronuclear se abstenha de concluir obras e/ou utilizar a Unidade de Armazenamento Complementar a Seco para Combustíveis Irradiados (UAS) da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA) até que seja procedido o regular licenciamento ambiental, precedido de prévia realização de EIA/RIMA e cumpridos os demais requisitos legais (consulta prévia e informada de populações tradicionais, audiências públicas, aprovação do Congresso Nacional). Já ao Ibama e à CNEN, que não emitam qualquer renovação, nova licença ou autorização referente ao caso e sustem os efeitos da: a) 1ª Licença de Construção Parcial (LPC1) da Unidade de Armazenamento Complementar a Seco para Combustíveis Irradiados (UAS) da CNAAA, em Itaorna, Angra dos Reis, RJ, concedida pela CNEN, por meio da Resolução n. 242, de 18 de abril de 2019; b) Licença de Construção da Unidade de Armazenamento Complementar a Seco para Combustíveis Irradiados (UAS) da CNAAA, em Itaorna, no Município de Angra dos Reis, concedida pela CNEN, por meio da Resolução n. 249, de 5 de setembro de 2019; c) Licença Prévia (LP) Nº 617/2019, concedida pelo IBAMA, no dia 03 de setembro de 2019; d) Licença de Instalação (LI) n. 1310/2019, concedida pelo Ibama, no dia 03 de setembro de 2019. No mérito, o MPF pede que seja declarada a nulidade dessas licenças, com a obrigação de não fazer ao Ibama e à CNEN para não emitir nova licença ambiental de Unidade de Armazenamento Complementar a Seco para Combustíveis Irradiados (UAS) na CNAAA sem a realização prévia de EIA/RIMA e sem o cumprimento dos demais requisitos legais apontados nesta inicial.

“O debate não se trata da conveniência e oportunidade do implemento da unidade de armazenamento a seco em face de outras tecnologias disponíveis, mas procura-se a tutela jurisdicional com respeito ao regramento constituição, supralegal e infraconstitucionais de proteção ao meio ambiente e às populações tradicionais. Supostos argumentos nacionalistas ufanistas de defesa do “progresso” não permitem o atropelo dos ditames normativos estabelecidos, sob pena de desmoralização do próprio ordenamento jurídico e, consequentemente, descrédito da própria democracia”, alerta o procurador da República Ígor Miranda, autor da ação.

Os locais de armazenamento dos materiais nucleares, exceto aqueles ocasionalmente usados durante seu transporte, são considerados, por lei (art. 1º, inciso VI, alínea “c”, da Lei n. 6.453/77), instalações nucleares. Consequentemente, a natureza jurídica dos depósitos de rejeitos radioativos de alta radioatividade é de instalações nucleares. Os depósitos iniciais, de ordinário, são construídos de dentro do prédio de contenção das usinas nucleares, materializam uma situação transitória, até o seu descarte ou a sua transferência para um depósito final. O depósito inicial é parte de uma instalação nuclear ou radiativa. Já o depósito intermediário é destinado a receber e, eventualmente, acondicionar, rejeitos radioativos, objetivando a sua futura remoção para depósito final. Por fim, os depósitos finais constituem a verdadeira e definitiva solução para os rejeitos radioativos

“O licenciamento ambiental simplificado é reservado apenas a empreendimentos elétricos com pequeno potencial de impacto ambiental, verifica-se claramente que Usinas Termonucleares não estão nesse e que o procedimento de licenciamento a ser adotado deve ser precedido de EIA/RIMA, dado o potencial de impacto deste empreendimento ao meio ambiente. No entanto, no caso concreto, o licenciamento da Unidade de Armazenamento Complementar a Seco (UAS) foi realizado indevidamente mediante Procedimento de Licenciamento Ambiental Simplificado. Nesse particular, destaque-se que a UAS não é parte das instalações nucleares já consolidadas, não estava previsto no projeto de Angra 1, tampouco de Angra 2 ou, ainda, Angra 3. Portanto, é, efetivamente, uma nova instalação nuclear, compreendendo todos os riscos a ele inerentes”, explica.

Entenda o caso – O Inquérito Civil (MPF) n. 1.30.014.000035/2020-57 (originado do IC físico 1.30.012.000024/2000-43) e IC n. 1.30.014.000036/2020-00 (originado do IC físico 1.30.014.000009/2016-42) foram instaurados para apurar a regularidade do licenciamento ambiental do Repositório de Rejeitos Radioativos da Usina Nuclear de Angra I, II e III e exigências relacionadas ao Licenciamento da Unidade de Armazenamento Complementar de Combustível Irradiado (UFC) da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA).

Atualmente, o depósito inicial é feito em piscinas especialmente projetadas e construídas no interior do prédio de contenção das usinas nucleares, e são denominadas Piscinas de Combustíveis Usados (PCUs). Porém, está previsto para o próximo ano o esgotamento da capacidade de estocagem do rejeito nuclear. Diante da possibilidade de paralisação das operações destas unidades geradoras de energia, necessita-se da adoção de medidas para ampliação dessa capacidade.

Em 2015, a Eletronuclear optou pela implantação de UAS – Unidade Complementar de Armazenamento a Seco da CNAAA. Dessa forma, no Brasil, caminha-se para se ter as piscinas como depósitos iniciais dos rejeitos nucleares (PCUs), as Unidade de Armazenamento Complementar a Seco de Combustível Irradiado (UAS) como depósitos complementares, estando pendentes os depósitos finais.

A Unidade de Armazenamento Complementar a Seco (UAS) da CNAAA ocupará um polígono de 4.879,3 m² dentro do sítio da CNAAA e será composta pelas seguintes estruturas: (i) Área de Estocagem – 2.583,9 m²; (ii) Guarita – 45,2 m²; e (iii) Almoxarifado – 309,0 m². Para a execução do empreendimento, a empresa Holtec International venceu a licitação de contratação de Serviços e Fornecimentos para a implantação do empreendimento no valor total de USD 50.277.018,00.

Clique aqui e leia a íntegra da ação.

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