UFRJ: “Nota Técnica sobre o aumento de casos de Covid-19 no município do Rio de Janeiro e medidas para conter sua disseminação”

Universidade Federal do Rio de Janeiro
Grupo de Trabalho Multidisciplinar para o enfrentamento da Covid-19

Rio de Janeiro, 30 de novembro de 2020

Neste momento, países europeus, como Alemanha, Espanha, França, Itália e Reino Unido[1], enfrentam uma segunda onda da pandemia de COVID-19, conforme mostra a figura 1. Para reduzir a disseminação do SARS-CoV-2, deram início, então, a uma série de restrições de mobilidade[2], variando de lockdown nacional ou local a restrições de horário de circulação de pessoas (toque de recolher). 

Figura 1: média móvel de sete dias dos casos confirmados de COVID-19 por milhão de habitantes de Alemanha, Espanha, França, Itália e Reino Unido, 2020 (fonte: European CDC).

No Brasil, assistimos ao aumento acelerado de casos sem ter ocorrido o término da primeira onda. Os dados sugerem uma nova onda sobrepondo-se à primeira. Isso torna o problema mais grave e complexo. A população está há mais de oito meses com restrições de mobilidade. No entanto, muitos, especialmente os mais jovens, têm se aglomerado em festas, bares, praias e outros eventos sociais. O processo eleitoral, fundamental à democracia, também gerou aglomerações. Atualmente, a mobilidade no estado do Rio de Janeiro tende a se aproximar daquela de antes da decretação do isolamento social[3].

E as declarações públicas de autoridades governamentais afirmando que não retrocederão nas medidas de flexibilização ampliam a gravidade da situação. Destaca-se que tais medidas não foram acompanhadas de ações visando oferecer transporte público adequado a fim de evitar a sobrecarga, o que torna esse meio de mobilidade um provável foco de disseminação do vírus.

Estamos diante de um quadro muito preocupante no município do Rio. A figura 2 revela a evolução da COVID-19 na cidade. Notamos que a doença se eleva de forma acelerada e atinge seu auge na semana epidemiológica 18 (26/4 a 2/5). Segue-se uma queda mais lenta e, a partir da semana epidemiológica 26 (21/6 a 27/6), a doença volta a se elevar após as medidas de flexibilização. Posteriormente, a COVID-19 evolui ao longo de semanas com cerca de 3 a 4 mil casos e, na semana epidemiológica 41 (4/10 a 10/10), atinge em torno de 2 mil. Depois, o número de casos volta a aumentar de forma sustentada, não demonstrando ser uma flutuação aleatória: atinge, na semana epidemiológica 46 (8/11 a 14/11), a marca de 3.462 casos.

Figura 2: média móvel semanal dos casos notificados de COVID-19 por data de início de sintomas no município do Rio de Janeiro, 2020 (fonte: SES/RJ).

O impacto desse novo aumento de casos está se refletindo no aumento da demanda no Centro de Triagem e Diagnóstico (CTD) da UFRJ, como se pode ver na figura 3. A partir do dia 10/10/2020, houve um crescimento sustentado de casos com RT-PCR positivo para o SARS-CoV-2. Ressalta-se que os valores atuais são maiores que os de meados de maio.

Figura 3: média móvel de sete dias dos resultados de RT-PCR para o SARS-CoV-2 obtidos no Centro de Triagem e Diagnóstico (CTD) da UFRJ, 2020 (fonte: CTD/UFRJ).

O aumento dos casos já está provocando grande estresse no sistema de assistência à saúde. Segundo o painel “Indicadores do Plano de Retomada”[4] da prefeitura do Rio de Janeiro, a média móvel de sete dias do percentual de ocupação de leitos do Sistema Único de Saúde (UTI adulto) dedicados à COVID-19 (UTI/Srag – Síndrome Respiratória Aguda Grave) na Região Metropolitana I está em 93,5%. Já a média móvel de sete dias do percentual de ocupação de leitos de suporte à vida da Rede SUS no município está em 102,1%. Ou seja, não há vagas para internação

Como reflexo disso, existe grande sobrecarga das emergências dos hospitais e das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). O risco de ocorrerem óbitos sem que o paciente seja internado é elevadíssimo. São dados extremamente preocupantes. Estamos evoluindo em curto período para o colapso da rede de assistência aos pacientes, especialmente os mais graves. Ao se caracterizar tal situação, o momento será ainda mais dramático, pois ao longo do processo pandêmico aprendemos a lidar melhor com os casos graves e, atualmente, a probabilidade de cura é maior do que no princípio da pandemia, desde que o paciente consiga acesso aos serviços de saúde.

É urgente que as autoridades governamentais implementem ações para o enfrentamento desse novo aumento de casos de COVID-19. Nesse sentido, conclamamos os entes municipal, estadual e federal para uma ação unificada e adoção das seguintes medidas:

  1. Abertura imediata de leitos hospitalares, incluindo os de UTI, para absorver a crescente demanda por vagas.
  2. Contratação emergencial de profissionais de saúde para atuarem nesses leitos.
  3. Aquisição emergencial de equipamentos e insumos necessários para a assistência aos pacientes.
  4. Realização de ampla testagem por RT-PCR em todos os casos suspeitos, com rastreamento de seus contatos.
  5. Isolamento dos casos e contatos com RT-PCR positivo.
  6. Reforço nas campanhas de esclarecimento sobre as medidas preventivas.
  7. Ampliação da oferta de transporte público a fim de evitar aglomeração. 
  8. Suspensão imediata de eventos presenciais, sejam sociais, esportivos ou culturais.
  9. Fechamento das praias.
  10. Limitação e escalonamento do horário de funcionamento de estabelecimentos que permanecerem abertos.
  11. Rigorosa fiscalização dos estabelecimentos abertos.
  12. Avaliação da decretação de lockdown caso o cenário epidemiológico da doença se mantenha ou se agrave.

[1] https://ourworldindata.org/coronavirus, acessado em 29/11/2020.

[2] https://www.statista.com/chart/23330/coronavirus-restrictions-europe-map/, acessado em 29/11/2020.

[3] https://coronavirus.ufrj.br/wp-content/uploads/sites/5/2020/11/notatecnicaR_28_base2111.pdf, acessado em 29/11/2020.

[4] http://inteligencia.rio/planoretomada, acessado em 29/11/2020.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Emilia Wien.

Arte: Ascom/PFDC

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