Fundadora e coordenadora executiva da Conaq, Givânia Maria da Silva está entre as 27 personalidades que tiveram os nomes removidos de homenagem; presidente da instituição, Sérgio Camargo, acumula declarações racistas
Por Márcia Maria Cruz, em De Olho nos Ruralistas
Sob a tutela de Sérgio Camargo, a Fundação Cultural Palmares vive uma verdadeira caça às bruxas. Nesta quinta-feira (02), a fundação publicou em seu site uma relação com 27 nomes que serão excluídos da Lista de Personalidades Negras. A medida é fruto da portaria nº 189, do dia 10 de novembro, que entrou em vigor neste mês, instituindo o critério exclusivo de homenagens póstumas.
Entre os nomes “apagados” pela devassa de Camargo está uma das principais líderes do movimento quilombola no Brasil: Givânia Maria da Silva, coordenadora executiva e fundadora da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq),
— Não considero que Sérgio Camargo seja um gestor. Um servidor público, que exerça um cargo de gestão efetiva, não pode se empenhar apenas em fazer desserviços. A sociedade precisa saber disto: o fato de ser um homem negro não o isenta de ser racista. O racismo é uma cultura e pode sim ser absorvida por pessoas negras, como é o caso dele. Considero que ele seja um instrumento do governo Bolsonaro, que tem um projeto maior de extermínio da população negra.
Alvo de ataques da extrema direita bolsonarista, a lista da Fundação Palmares homenageia homens e mulheres negros que trouxeram contribuição incontestável em suas áreas de atuação. Estão ali nomes como o da escritora Conceição Evaristo, do senador Paulo Paim (PT-RS) e da ex-senadora Marina Silva (Rede), dos cantores Gilberto Gil, Milton Nascimento e Elza Soares e de esportistas, como o medalhista olímpico Vanderlei Cordeiro de Lima. Pelo novo critério, eles serão todos excluídos da listagem.
‘MEDIDA TIRA OPORTUNIDADE DE CONHECER A HISTÓRIA DO POVO PRETO’
Em agosto, durante o especial Esplanada da Morte, De Olho nos Ruralistas escreveu o perfil de Sérgio Camargo, demonstrando como ele colabora com o projeto genocida de Jair Bolsonaro ao preferir a perseguição ideológica à ações concretas de combate à pandemia nas comunidades quilombolas: “Sérgio Camargo ignora as mortes quilombolas por Covid-19“.
Ele chegou à presidência da fundação por indicação do então secretário de Cultura Roberto Alvim, exonerado após divulgar um vídeo em que imitava discurso nazista de Joseph Goebbels, ministro da propaganda de Adolf Hitler. Sérgio Camargo continuou no cargo, onde ganhou atenção na mídia e nas redes sociais por suas declarações contrárias ao movimento negro.
Segundo levantamento da Conaq e da Terra de Direitos, entre 2019 e 2020, Camargo emitiu sete declarações de cunho racista, ficando atrás apenas do presidente Jair Bolsonaro no mapeamento: “Coordenação quilombola mapeia 49 declarações racistas de Bolsonaro e sua trupe“.
Para Givânia, essa busca constante dos holofotes pelo presidente da Fundação Palmares mascara as reais intenções de seu chefe. “Não quero discutir Sérgio Camargo como sendo algo importante, quero discutir o projeto racista, fascista e genocida do governo Bolsonaro”, afirma.
“Nem eu nem nenhuma outra personalidade da lista perde com a retirada da homenagem”, pondera. “A perda é do povo brasileiro, que deixa de ter esse canal para saber a própria história. Lamento porque ele tira dos filhos dele, dos netos, a oportunidade de conhecer a história do povo preto”.
A medida despertou reação imediata de movimentos sociais e da Justiça Federal, que deu cinco dias para que o presidente da Fundação Palmares explique o que motivou a decisão. Até o momento, não houve pronunciamento oficial da organização.
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Imagem principal (Reprodução): fundadora da Conaq, Givânia Maria da Silva diz que quem perde é o povo brasileiro