Pau D’Arco: chacina, assassinato de líder rural e ameaça de despejo

Lista da Comissão Pastoral da Terra contabiliza 32 assassinatos de mulheres e homens no campo em 2019, em todo país.

Pedro Calvi, CDHM​

Fernando dos Santos Araújo, que sobreviveu ao massacre do município de Pau D’Arco em 2017, no sudeste paraense, era um desses líderes e agora faz parte das estatísticas de 2021. No dia 26 de janeiro, foi morto com um tiro na nuca, no lote dele na Fazenda Santa Lúcia, para onde havia voltado depois de fazer parte do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas e sair da região.

De acordo nota da Comissão Pastoral da Terra, Fernando escolheu voltar “na esperança de conseguir um lote de reforma agrária com a criação do Acampamento Ana Júlia”.

No dia 23 de outubro de 2019, a justiça intimou o município de Pau D’Arco a apresentar em até 15 dias um levantamento das famílias que estão na área, com o perfil da atividade agrícola e benfeitorias. Na época, a remoção foi marcada entre o período de 27 a 31 de janeiro de 2020. Em agosto, o despejo foi suspenso em razão da pandemia de Covid-19.

“O clima de tensão é alto na Fazenda Santa Lúcia, tanto pelo risco de morte de trabalhadores rurais, como no caso de Fernando, quanto pela ordem judicial de reintegração de posse contra cerca de 200 famílias de trabalhadores rurais sem-terra ocupantes do local, que tramita na Vara Agrária de Redenção”, alerta o presidente da Comissão de Direitos e Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), Helder Salomão (PT/ES).

Logo após o assassinato de Fernando Araújo, a presidência da CDHM solicitou ao subprocurador-geral da República e procurador Federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Vilhena; ao procurador-geral de Justiça do Estado do Pará, Gilberto Martins e para Walame Machado, secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social do Pará, uma série de ações sobre a situação na região.

Entre os pedidos, o acompanhamento do conflito fundiário que culminou com a chacina há três anos e com a recente execução de Fernando Araújo; providências, tanto na esfera penal, conferindo celeridade aos processos dos homicídios, quanto na esfera cível, com a fiscalização da elaboração e execução do plano de remoção e dos trâmites no Incra e no Iterpa (Instituto de Terras do Pará) do processo de destinação da Fazenda Santa Lúcia para a reforma agrária.

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará respondeu, no dia 22 de fevereiro, que foi aberto inquérito policial para apuração e com os “procedimentos policiais de praxe”.

Defensor de direitos humanos preso

Também em janeiro, a presidência da CDHM foi comunicada da prisão do advogado e defensor de direitos humanos José Vargas Sobrinho Júnior, no dia 1º de janeiro. Ele tem histórico de defesa dos direitos humanos no sul do Pará e ficou conhecido por sua atuação no caso da chacina de Pau D’Arco, além de iniciativas em defesa de indígenas e sem-terra da região.

José Vargas foi acusado de suposto envolvimento no desaparecimento do ex-candidato a vereador Cícero José Rodrigues de Souza. Foram enviados ofícios ao governador do Pará, Helder Barbalho, Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e ao procurador-geral de Justiça do Pará, pedindo informações e imparcialidade na investigação.

A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social respondeu no início de fevereiro informando que o advogado José Vargas Sobrinho está em prisão domiciliar, com rondas policiais constantes para segurança, enquanto as investigações seguem.

No dia 4 de janeiro a justiça negou um pedido de habeas corpus feito pela OAB paraense.

A chacina

A chacina no município de Pau D’Arco, em 2017, resultou na morte de dez trabalhadores rurais, nove homens e uma mulher. Foi durante uma ação policial na Fazenda Santa Lúcia. Os policiais foram denunciados pelo Ministério Público paraense e a Justiça determinou que 16 fossem levados a júri popular, o que ainda não aconteceu. Testemunhas afirmaram que as vítimas nem tiveram chance de defesa. Exames balísticos comprovaram que houve execução.

Conflitos

Dados divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) apontam que o número de conflitos no campo aumentou 23% entre 2018 e 2019, sendo que a região Norte é a mais afetada: 51,6% de mortes e conflitos ocorreram nessa localidade em 2018.

A CPT aponta a desigualdade na distribuição de terra no Brasil como uma das mais acentuadas do mundo, associada a um histórico de conflitos, grilagem e impactos.

De acordo com reportagem do Instituto Humanitas da Unisinos (RS) e divulgada pela CPT, o levantamento parcial de assassinatos por causa de conflitos no campo, em 2020, traz 18 crimes desse tipo.

Leia aqui a lista Assassinatos no Campo Brasil 2019.

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