Nota da Anafe: É hora de aprofundar o caráter republicano da Advocacia-Geral da União

A Advocacia-Geral da União (AGU) aparece com recorrência nos noticiários. Não há surpresa nisso. Afinal, trata-se da instituição responsável pela representação judicial e extrajudicial da União e pela defesa das políticas públicas e dos gestores e autoridades dos diversos poderes, órgãos e entidades federais. Além disso, cabe à AGU prestar assessoria e consultoria jurídica ao Poder Executivo Federal, e a suas autarquias e fundações, ajudando os gestores públicos no controle da juridicidade dos atos administrativos. Por fim, cabe especificamente ao Advogado-Geral da União defender a legitimidade das leis e atos normativos em face das ações de controle concentrado de constitucionalidade.

Apesar de sua relevância para a edificação do Estado Democrático de Direito, dos princípios e direitos fundamentais e dos valores democráticos, a AGU permanece um arranjo mal-acabado. Diferente do Ministério Público da União (MPU) e da Defensoria Pública da União (DPU), o Advogado-Geral não precisa ser escolhido entre os integrantes das carreiras da Advocacia Pública Federal. Pior que isso, os advogados públicos federais não têm sua independência técnica assegurada por meio de regras e de procedimentos que realizem o adequado equilíbrio entre a autonomia de seus membros e as exigências de unidade de sua atuação institucional.

Devido à fragilidade de seu arcabouço institucional, a AGU tem sido reduzida a mera correia de transmissão das escolhas do Chefe do Poder Executivo, sem compromisso com manter uma linha de coerência com teses institucionalmente defendidas. Todavia, é um equívoco pensar a AGU como um ministério do Poder Executivo, ignorando que os advogados públicos federais e o próprio Advogado-Geral da União, no exercício de suas atribuições institucionais, não fazem escolhas gerenciais ou políticas, mas atuam para que as escolhas feitas por gestores e autoridades políticas sejam realizadas em observância às balizas da lei e do Direito.

Nesse contexto, instituições de Estado, que executam função essencial à justiça, como a AGU, o MPU e a DPU, deveriam estar blindadas por regras que impedissem que suas chefias pudessem ser nomeadas para os tribunais superiores, notadamente o Supremo Tribunal Federal, sem que fosse observado um período mínimo de desincompatibilização (“quarentena”). Regras de quarentena, como sabemos, são essenciais à defesa da integridade das instituições públicas.

Infelizmente, em lugar do incremento dos arranjos institucionais voltados à reforçar o caráter público das funções essenciais à justiça, caminhamos em direção ao aprofundamento do risco de captura das instituições de Estado por interesses particularistas. A Proposta de Reforma Administrativa, por exemplo, irá legitimar, em lugar de impedir, o ingresso de pessoas de fora dos quadros da AGU em atividades estratégicas, técnicas e de gestão, por meio da criação dos chamados “cargos de liderança e assessoramento”, que poderão ser nomeados livremente, sem concurso público, com base em critérios predominantemente políticos. Trata-se de uma porta escancarada ao aparelhamento da Advocacia de Estado.

A quarentena do Advogado-Geral da União, do Procurador-Geral da República e do Defensor Público-Geral Federal seria um passo importante em favor da blindagem das instituições que eles chefiam da excessiva influência de fatores políticos, incrementando a realização de sua missão institucional. No caso específico da AGU, ela teria que ser combinada, ainda, com outras medidas voltadas a impedir a sua captura política, como a limitação da escolha do Advogado-Geral da União e dos ocupantes de funções estratégicas, técnicas e de gestão aos integrantes das respectivas carreiras, e o reforço das garantias institucionais necessárias a assegurar a independência dos advogados públicos federais.

Há, no Congresso Nacional, propostas adormecidas de alteração da Constituição e mesmo da Lei Orgânica da AGU, que permitiriam caminhar na direção aqui sugerida, à exemplo da PEC 82/2007.

Mas é preciso mais. A ANAFE – Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais defende que a quarentena aplicada ao Advogado-Geral da União, ao Procurador-Geral da República e ao Defensor Público-Geral Federal é medida urgente e necessária ao incremento do caráter público e republicano das instituições encarregadas do exercício das funções essenciais à justiça no âmbito da União, com destaque para a AGU.

Lademir Gomes da Rocha – Presidente da ANAFE

Calberto Coutinho da Costa – Presidente do Colegiado da ANAFE

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