Por Cimi
Diante da morosidade do Poder Público e sob constantes invasões, na madrugada desta sexta-feira, 30, os Mbya Guarani decidiram agir para retomar parte do território tradicional. Durante a retomada, os indígenas destruíram as cercas e os barracos dos invasores instalados no tekoha – lugar onde se é – Pindó Poty, localizado no Bairro Lami, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
Há semanas os indígenas têm exigido e aguardam as providências legais do Ministério Público Federal (MPF) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) sobre as invasões, que não têm sido coibidas pelas autoridades e, por conta disso, têm se intensificado. O desmatamento e loteamento do território indígena são as consequências mais diretas deste problema.
Segundo informações dos Mbya Guarani, enquanto se reuniam com o MPF nesta quinta-feira (29), do outro lado da Terra Indígena os invasores desmataram e lotearam mais uma parte do tekoha. A situação, então, se tornou ainda mais inaceitável para os indígenas.
“O que vemos são os invasores avançando sobre o território tradicional. Por isso, nos levantamos com a força da reza, do canto e também com a proteção de bordunas, arco e flecha. Fomos até o local da invasão e derrubamos as cercas, as casas e decidimos acampar no local”, relata liderança do povo Mbya Guarani.
A ação realizada pelos Xondaros e Xondarias teve início às 5 horas desta sexta com a retirada das cercas. Romper as cercas, derrubar os barracos e a queima destes símbolos dos invasores se torna, para os indígenas, um ato político de resistência. No mesmo local estão sendo construídas estruturas de suporte aos indígenas para não permitir mais a entrada de invasores.
“Há duas semanas ocorrem intensas denúncias, por parte dos Mbya Guarani, acerca das invasões. Basta os indígenas reagirem para que os órgãos de repressão sejam acionados”
Os Mbya Guarani esperam que os invasores devem reagir com uma reintegração de posse contra a comunidade do tekoha Pindó Poty e afirmam que irão continuar em luta até a garantia completa do direito sobre seu território tradicional. “Que se faça cumprir, na prática, a segurança definitiva de nossa comunidade e a proteção do território contra as invasões”, cobram.
A comunidade Pindó Poty está mobilizada e vigilante dentro da área que foi retomada dos invasores. A situação, por enquanto, é de tranquilidade. Assim descreve a situação o coordenador do Cimi Regional Sul, Roberto Liebgott, que compõe ainda a Equipe Porto Alegre da entidade, que assim que soube da retomada prestou solidariedade e apoio aos Mbya Guarani.
“O MPF foi acionado e segundo informações a Polícia Federal foi acionada para ir até a área. Há duas semanas ocorrem intensas denúncias, por parte dos Mbya Guarani, acerca das invasões. . Basta os indígenas reagirem, diante da omissão pública, para que os órgãos de repressão sejam acionados, de forma imediata, acionados”, pontua Liebgott.
As invasões ao território são tamanhas que imagens do esgoto que corre dentro da Terra Indigena, oriundo do empreendimento comercial Bom Lami, foram feitas pelos Mbya Guarani.
Vigília e solidariedade na retomada
Desde quinta, 29, os Mbya Guarani realizaram rituais e, a partir de seus rezos e do clamor à ancestralidade, articularam as ações com o objetivo de dar um basta diante das ameaças e das invasões. Agora, conforme descrevem os indígenas, o momento é de vigília, de resistir na área retomada e exigir agilidade do Poder Público na garantia do território.
Em apoio e solidariedade, indígenas de outras aldeias têm apoiado a retomada. “A gente veio para apoiar os parentes aqui no Rio Grande do Sul, pois recebemos o aviso que a terra tinha sido invadida”, explica Marcelo Mbya Guarani, cacique da Terra Indígena de Canelinha, em Santa Catarina.
Como uma das lideranças na resistência, em solidariedade aos Guarani do tekoha Pindó Poty, Marcelo afirma que irão permanecer no território. A ideia, diz o cacique, é “passar a noite para a gente receptar as pessoas que invadiram. Também, já deixar a moradia feita, para assim que retornamos para nossa aldeia essas famílias ficarem garantidas nesta terra que é do povo Guarani”.
“Porque a terra é nossa e nós dependemos da terra, sem a terra não tem a nossa cultura prevalecida dentro de uma comunidade: demarcação já!”
Para Liebgott, a luta por justiça não pode parar, ainda mais diante de poderes públicos e de governantes omissos e negligentes. “A covardia dos que governam contribuem para o aumento da insegurança, violência e injustiças”, destaca. A entidade tem acompanhado as denúncias dos Guarani e suas ações em prol da terra tradicional, na cidade de Porto Alegre, há muitos anos.
Neste momento de tensão, a comunidade Mbya Guarani espera contar com o apoio das instituições, entidades, movimentos sociais, populares e com as demais comunidades e povos tradicionais.
A vigília segue por tempo indeterminado, pois segundo as lideranças se trata de uma retomada e, no geral, a este direito a resposta recebida pelos indígenas é violenta por parte de invasores. “Porque a terra é nossa e nós dependemos da terra, sem a terra não tem a nossa cultura prevalecida dentro de uma comunidade: demarcação já!”, finaliza o cacique Marcelo.
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Imagem: Os Mbya Guarani queimaram cercas e barracas dos invasores. No local, vão construir morados e espaços para a comunidade – Crédito da foto: Alass Derivas