“Estão querendo implodir o sistema elétrico brasileiro”: comissão da Câmara dos Deputados discute a privatização da Eletrobras

A medida provisória que desestatiza a empresa foi discutida em audiência pública virtual, nesta sexta (7/5), da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados (CLP). Especialistas também apontam risco de apagões e aumento das tarifas.

Pedro Calvi / CLP

No dia 23 de fevereiro, o governo federal entregou ao Congresso Nacional a Medida Provisória 1.031 de 2021, que prevê a privatização da empresa Centrais Elétricas Brasileiras S.A. – Eletrobras. De acordo com o Ministério da Economia, as vendas de ações da Eletrobras poderão render R$ 100 bilhões até o fim de 2022. 

O relator da MP é o deputado Elmar Nascimento (DEM/BA). Ele pretende apresentar a relatoria nos próximos dias, para votação antes que a medida perca a validade, dia 22 de junho.

Porém, a iniciativa do Executivo vem cercada de questionamentos.

“Estamos discutindo o futuro do Brasil. A privatização da Eletrobras representa a mudança mais radical na política energética nos últimos 80 anos no país.Desde os anos 30 o sistema estatal está presente e é fundamental no suprimento de energia e isso deve continuarcom novas tecnologias principalmente. A agenda da Aneel e dos ministérios está 40 anos atrasada. Ou apostamos no futuro ou essa falsa ideia de modernização. Estão querendo implodir o sistema elétrico brasileiro”, denuncia Ronaldo Bicalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A medida provisória inclui as subsidiárias Eletrobras Chesf, Eletrobras Eletronorte, Eletrobras Eletronuclear e Eletrobras Furnas. Também fazem parte da desestatização o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Eletrobras Cepel) e a Eletrobras Participações S.A. (Eletrobras Eletropar), por meio da venda do controle acionário da União.

As recentes privatizações de distribuidoras de energia elétrica no Brasil tiveram sempre dois efeitos, o aumento das tarifas e os apagões. As populações dos estados de Goiás, Acre, Rondônia, Roraima, Amazonas, Piauí e Alagoas sofrem com o descaso na prestação de serviço privatizado. Vale lembrar o recente episódio no Amapá, quando uma transmissora de energia privada deixou a maior parte do estado sem luz por 20 dias”, exemplifica o deputado Zé Carlos (PT/MA). Ele é um dos autores do pedido para a audiência pública, junto com os parlamentares João Daniel (PT/SE), Patrus Ananias (PT/MG) e Erika Kokay (PT/DF).  

A medida provisória inclui as subsidiárias Eletrobras Chesf, Eletrobras Eletronorte, Eletrobras Eletronuclear e Eletrobras Furnas. Também fazem parte da desestatização o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Eletrobras Cepel) e a Eletrobras Participações S.A. (Eletrobras Eletropar), por meio da venda do controle acionário da União.

O presidente da CLP, deputado Waldenor Pereira (PT/BA), destaca que “a privatização pode aumentar a conta de luz em mais de 16 por cento e isso pode afetar consumidores comerciais, residenciais e industriais, provocando uma alta geral nos preços. Vale lembrar que estudos mostram que 60 por cento dos custos de uma empresa são com energia elétrica”.

João Daniel (PT/SE), segundo vice-presidente da CLP, afirma que “não vamos abrir mãos do setor elétrico, faremos todo esforço possível para não aprovar essa medida, que custará caro no bolso do consumidor, como sempre acontece com tudo que é privatizado”.

Rito sumário

“É muito estranho que essa MP tramite em rito sumário, sem previsão de nenhum debate no Congresso. Mesmo com vários impedimentos, a Eletrobras socorreu grandes empreendimentos privados no país, além de vender energia mais barato. Agora está nesse processo absurdo de privatização, que é mais para atender os acionistas que o consumidor. Um equívoco proposital do governo na condução desse processo, que é mais político, com vistas em 2022, do que econômico”, pondera Fabíola Antezana, do Coletivo Nacional dos Eletricitários.

Clarice Ferraz, do Instituto Ilumina lembra que “estamos vivendo um cenário de muitas incertezas, com mudanças climáticas, como os recursos vão estar disponíveis ou não, como as pessoas vão consumir energia no futuro? Precisamos de energia limpa, de uma mudança de paradigma com fontes de energia renovável. E nada disso está no projeto de privatização. A privatização agora é uma atitude antidemocrática e negacionista”.

Para Paulo Roberto Gomes, diretor do Sindicato dos Trabalhadores na Industria de Energia Elétrica, “temos um governo sem credibilidade nenhuma para argumentar sobre a privatização da Eletrobras, e não vamos abrir mão de uma empresa pública”.

Possíveis benefícios

Thiago Magalhães, assessor da Agência Nacional de Energia Elétrica esclarece que a medida provisória define que haverá um aumento no capital social da empresa. O governo, atualmente acionista majoritário, ficaria autorizado a fazer uma oferta pública de ações.  “Nesse processo, a União receberia 20 bilhões de reais, e isso pode diminuir o custo para os consumidores e redução de gastos para o fornecimento de energia nas regiões Nordeste e Norte”.

Pedro Capeluppi, secretário especial adjunto de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, ressalta que “essa capitalização da Eletrobras faz parte de um aperfeiçoamento do sistema de energia, para termos mais qualidade e preços menores para o cidadão e para as indústrias. É esse nosso objetivo. Houve muita discussão desde o primeiro projeto, ainda em 2017, com sugestões da sociedade e parlamentares. Não é um debate que começou agora com a medida provisória”. 

Hamilton Almeida, da assessoria especial de Assuntos Econômicos do Ministério de Minas e Energia, afirma que a Eletrobras vem perdendo capacidade de geração de energia desde 1998 e que a capitalização deve mudar esse quadro. “Precisamos de uma empresa capitalizada com capacidade de caixa para participar dos leilões de produção e transmissão de energia, além de gerar empregos e renda. E para o consumidor, o que faz reduzir preço é a competição”.

“Estamos falando de mais recursos para saneamento básico, energia, de trazer capital privado para melhorar a realidade do povo brasileiro. Essa capitalização da Eletrobras vai recuperar bacias, como a de Furnas. Não estamos tratando de política nem defesa sindical”, coloca o deputado Paulo Ganime (Novo/RJ).

A empresa

A Eletrobras é a principal empresa de geração e transmissão de energia do país. Tem capacidade instalada de 51.143 MW, o que representa 30% do total no Brasil. Atua com as 48 usinas hidrelétricas, 12 termelétricas a gás natural, óleo e carvão, duas termonucleares, 62 usinas eólicas e uma usina solar, próprias ou em parcerias, em todo território nacional.

A íntegra da audiência pública está disponível, em áudio e vídeo, na página da CLP no site da Câmara dos Deputados.

Imagem: Trabalhadores do setor elétrico protestam contra venda de distribuidoras de energia pela Eletrobras, em frente ao Palácio do Planalto, Foto: Marcelo Camargo /Agência Brasil

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