PL 490 ataca direitos territoriais indígenas e é inconstitucional, analisa Assessoria Jurídica do Cimi

Em nota técnica, Assessoria Jurídica do Cimi avalia PL 490, que busca inviabilizar demarcações e abrir terras indígenas para grandes empreendimentos econômicos

Cimi

A Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) produziu uma nota técnica em que analisa o Projeto de Lei (PL) 490/2007, em tramitação na Câmara dos Deputados. Além de uma grande quantidade de dispositivos inconstitucionais, a análise aponta que o PL 490 afronta decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A análise baseou-se no relatório do deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA), relator do PL 490/2007 e de um grande conjunto de projetos apensados a ele na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Se aprovado na comissão, onde está em pauta, o projeto segue para votação no plenário da Câmara e, depois, para o Senado Federal.

A proposição legislativa, defendida pela bancada ruralista, prevê uma série de modificações nos direitos territoriais garantidos aos povos indígenas na Constituição Federal de 1988, inviabilizando, na prática, a demarcação de terras indígenas e abrindo terras demarcadas para os mais diversos empreendimentos econômicos, como agronegócio, mineração e construção de hidrelétricas, entre outras medidas.

Na avaliação da Assessoria Jurídica do Cimi, a própria forma do PL 490 é inconstitucional, pois a Constituição Federal não pode ser modificada por um projeto de lei. A nota técnica também aponta como falaciosa a justificativa do relator, de que apenas estaria consolidando em uma lei um tema já pacificado pelo STF.

Além de enumerar um grande conjunto de decisões do STF que vão no sentido contrário ao proposto no PL 490, a nota técnica aponta que a discussão sobre os direitos territoriais indígenas ainda está em aberto na Suprema Corte.

O fato de que os ministros determinaram, por unanimidade, a repercussão geral do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, que discute a demarcação da Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklãnõ, do povo Xokleng, evidencia esta contradição. Isso significa que o julgamento desse caso servirá de diretriz para os demais processos envolvendo demarcação de terras indígenas em todo o país.

“O Supremo nunca fixou uma tese ou pacificou a matéria indígena, tanto é verdade que foi conhecida a sua repercussão geral. Até uma definição pela Corte, os argumentos usados pelo relator do PL 490 e apensos são mera falácia, carecendo de viabilidade”, aponta a nota técnica.

“Não há que prosperar o referido projeto de lei por vício de inconstitucionalidade. Ainda que assim fosse, teria, necessariamente, de aguardar a definição da Suprema Corte quanto à análise final do RE 1.017.365”, avalia a Assessoria Jurídica do Cimi.

Entre as restrições às demarcações de terras indígenas que o PL 490 busca impor está a tese do marco temporal, segundo a qual os povos indígenas só teriam direito à demarcação daquelas terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988.

Esta tese deve ser analisada no processo de repercussão geral e também já conta com diversos posicionamentos contrários de ministros do STF – o que, na avaliação da Assessoria Jurídica do Cimi, também evidencia que não é um tema “pacificado” no Supremo, ao contrário do que defende a bancada ruralista.

“Desconsiderar o esbulho violento e os vícios nos processos de demarcação anteriores a 1988, bem como não levar em consideração as diretrizes constitucionais e técnicas para a efetivação da demarcação é violar o direito fundamental indígena à terra”, destaca a nota técnica.

A análise também identificou no PL 490 a previsão de flexibilizar o usufruto exclusivo das terras indígenas pelos povos originários, garantido pela Constituição, e inclusive a possibilidade de que a União se aproprie e disponibilize para a reforma agrária terras em que tenha havido “alteração dos traços culturais da comunidade”.

“O instituto é assimilacionista e garante que se os indígenas perderem parte dos traços (sic), podem perder o território, o que é um absurdo. Ainda, reafirma o regime tutelar da Funai sobre os povos indígenas, o que não se poderia em tempo algum admitir”, frisa a nota técnica.

Para a Assessoria Jurídica do Cimi, a possível aprovação do PL 490 implicaria em “retrocessos inimagináveis” para os povos indígenas – o que é vedado pela Constituição Federal. “O direito indígena é cláusula pétrea e não se submete a reformas legislativas”, aponta a análise.

Clique aqui para acessar a íntegra da nota técnica

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