Mestranda africana acusa PF em Guarulhos de racismo e maus-tratos

Geraldine espera resposta da PF há onze dias para seguir viagem para sua cidade natal

Por Bruna Lima / Gilberto Amado, no Metrópoles

A estudante beninense Geraldine Fadairo, de 28 anos, afirmou ter sido vítima de racismo e xenofobia por parte de agentes da Polícia Federal no Aeroporto Internacional de Guarulhos, durante uma abordagem antes de pegar um voo de partida para seu país. Os policiais também não teriam dado tratamento digno a ela e à filha, uma menina de 2 anos. No dia 31 de maio, a mestranda em antropologia estava embarcando para Porto Novo, capital do Benin, quando foi detida pela PF por suspeita de transportar cocaína nos tecidos de estampa africana que levava de presente para a família.

O agente federal que havia pedido o passaporte de Fadairo e que a levou com sua filha para uma sala com celas disse, segundo a estudante, que, se dependesse dele, todos os africanos que chegam ao Brasil iriam para a cadeia. “Vocês chegam no nosso país e acham que podem fazer o que quiserem. Se dependesse de mim, eu prendia todos vocês”, repetiu à coluna a fala do policial. Ela relembra também que o mesmo agente havia interceptado alguns nigerianos momentos antes.

Fadairo faz parte de um programa de estudos fruto de uma parceria entre o Benin e o Brasil. Ela chegou no país há oito anos e mora em Belém com a filha e o marido — que também é beninense.

A jornada para visitar Porto Novo, sua cidade natal, começou no dia 31 de maio. Mãe e filha saíram da capital paraense às 15h e chegaram a Guarulhos às 23h. Durante o check-in para Benin, o funcionário da companhia aérea Ethiopian Airlines telefonou para alguém e pediu para que Fadairo levasse suas bagagens para uma sala, alegando que a esteira estava quebrada. “Mas enquanto eu levava minhas malas, eu vi que uma mulher branca fez o check-in e botou a bagagem na esteira”, contou a estudante, lembrando que perguntou para o funcionário se havia algo de errado. Ele negou.

Dentro dessa sala, um agente da Polícia Federal pediu que Fadairo entregasse seu passaporte e o cartão de embarque. Sua bagagem foi inspecionada e apreenderam os tecidos de estampa africana para fazer um teste de detecção de cocaína. O resultado teria dado positivo e os agentes a encaminharam para a sala que continha uma cela, localizada no departamento da Polícia Federal. A mestranda foi impedida de contactar seu marido, e ela e sua filha ficaram detidas a noite inteira. Horas depois, informaram Fadairo que o resultado havia sido um falso positivo.

“Os policiais estavam me acusando de ser traficante, me questionaram como eu tinha coragem de envolver uma criança de dois anos em tráfico de drogas. Eu fiquei muito nervosa, eles estavam me pressionando para confessar algo que eu não fiz”, contou Fadairo. Os policiais também teriam a ameaçado dizendo que iam levar sua filha para o Conselho Tutelar.

Às 3h da madrugada, já no dia 1º de junho, informaram Fadairo que o resultado havia sido um falso positivo, mas que ela precisava ficar nas dependências para uma averiguação mais minuciosa. Segundo a mestranda, sua filha, desconfortável, chorava. Ela contou ter pedido aos agentes para amarrar a criança nas costas, uma técnica cultural africana para acalmar bebês, mas o pedido foi negado. “O policial disse que não sabia o que era e que eu não podia fazer aquilo lá”. Fadairo insistiu, mas o agente federal disse que bastava segurar na mão da criança para acalmá-la.

Por causa da viagem, que durou um dia inteiro desde Belém, a criança não havia se alimentado direito e começou a ficar febril. Um delegado se sensibilizou com a situação e deixou que a mãe preparasse um mingau para a filha na cozinha da PF.

Após vários testes, Fadairo foi liberada, mas já havia perdido o voo para Benim. Os policiais federais disseram que a passagem seria remarcada por eles. Ela e sua filha foram deixadas sem assistência no Aeroporto de Guarulhos e tiveram que procurar um lugar para passar a noite. A mestranda, que não vê sua família há seis anos, está esperando até hoje a remarcação da passagem. Há onze dias, ela e sua filha estão hospedadas de favor na casa de uma conhecida em São Paulo.

Além de não poder estar com a família, a espera está fazendo com que Fadairo perca compromissos acadêmicos. A viagem para Benin também tem o objetivo de concluir a pesquisa de campo do mestrado que faz no Museu Paraense Emílio Goeld, em Belém.

A mestranda disse que desde que chegou no Brasil luta para se estabelecer economicamente, e se emocionou ao contar seu desejo de apresentar a filha aos avós.

“É muito triste querer ver minha família depois de tanto tempo, querer que minha filha conheça os avós, ter sido acusada de tráfico de drogas e estar esperando há onze dias para seguir para o meu destino”.

À coluna, a assessoria da Polícia Federal disse que “o agente responsável pela abordagem negou a prática de racismo/xenofobia e destacou que na unidade todo o procedimento foi acompanhado por testemunha externa”. Em relação às passagens, explicaram que não foi possível realizar o reagendamento porque o bilhete teria sido emitido com milhas. A Polícia Federal não afirmou o que fará para ressarcir o prejuízo de Fadairo nem se vai investigar as acusações feitas por ela.

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