Liberação comercial do trigo transgênico pode ser decidida nesta quinta; entenda os riscos

Análise voltou à pauta da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) após dois meses

Daniel Giovanaz, Brasil de Fato

Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, deve decidir nesta quinta-feira (5) sobre a liberação comercial do trigo transgênico “para aumento de produtividade em situações e ambientes de baixa disponibilidade hídrica e resistente ao glufosinato, para uso exclusivo em alimentos, rações ou produtos derivados ou processados.”

O processo entrou na pauta da 243ª Reunião Ordinária da CTNBio, que ocorre de forma virtual a partir das 8h30. A liberação já foi aprovada pela subcomissão setorial das áreas humana e animal. O que está pendente é a análise da subcomissão setorial permanente das áreas vegetal e ambiental, que chegou a ser marcada para 10 de junho, mas foi adiada.

O adiamento ocorreu a pedido de integrantes da própria subcomissão, que solicitaram informações adicionais à empresa de sementes Tropical Melhoramento & Genética (TMG), autora do pedido de análise pela CTNBio, em março de 2019.

A variedade do cereal geneticamente modificado avaliada pela comissão é a HB4, da empresa argentina Bioceres.

Caminho sem volta

Segundo entidades de pesquisa ambiental e de saúde brasileiras e internacionais, as consequências do consumo humano do trigo transgênico e dos agrotóxicos utilizados em seu cultivo podem ser catastróficas.

Em 9 de junho, organizações que compõem a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida e o Grupo de Trabalho (GT) Biodiversidade da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) enviaram ofício ao Ministério Público Federal (MPF) e à CTNBio contra a liberação. As entidades denunciaram falta de transparência no debate do tema.

Uma vez aprovado, o trigo transgênico é considerado um caminho sem volta – assim como já aconteceu com o milho, a soja e o algodão.

“A possibilidade de que o trigo transgênico contamine as outras variedades de trigo é um risco quase inevitável”, explicou a bióloga Alicia Massarini, integrante do coletivo de cientistas contrários ao HB4, do coletivo Trigo Limpio, em entrevista recente ao Brasil de Fato.

“É impossível que as sementes não se misturem no processo de armazenamento e transporte. No campo também, porque, mesmo que o trigo seja uma planta autógama, que se fecunda a si mesma, uma pequena proporção de cerca de 3% pode experimentar polinização cruzada”, acrescentou a pesquisadora, lembrando que o Brasil não fez uma análise de riscos adequada e confiou cegamente nos critérios adotados pela Argentina, exportadora de trigo.

Veneno

A  Associação Brasileira da Indústria do Trigo estima que cada brasileiro consuma, em média, mais de 40 quilos do grão ao ano.

“O glufosinato de amônio, presente nos agrotóxicos utilizados no cultivo do trigo transgênico, pode causar alguns tipos de câncer. Também pode afetar o sistema reprodutivo, e é neurotóxico.

Muitos riscos para um produto tão importante na alimentação humana”, afirmou ao Brasil de Fato o engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo, representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio entre 2008 e 2014 e colaborador da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida.

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) classifica o glufosinato de amônio como 15 vezes mais tóxico do que o glifosato, alvo de ações na Justiça dos Estados Unidos por causar câncer.

A modificação genética no trigo é realizada exatamente para tornar a planta resistente ao produto, proibido na Europa e na maioria dos países desenvolvidos.

A possível aprovação na CTNBio teria impactos diretos na Argentina. O aval do Brasil é condicionante para a liberação da comercialização no país vizinho, autorizada no ano passado. O Brasil é responsável pela compra de 50% do trigo exportado pelos argentinos.

Edição: Leandro Melito

Fotos Públicas

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