Morte de cacique Sebirop repercute entre entidades e pesquisadores: ‘Guerreiro e guardião dos saberes cosmológicos’

Líder indígena do povo Ikolen Gavião morreu em Ji-Paraná (RO) vítima de uma doença crônica no pulmão. Para o povo, além de guerreiro ele será lembrado como uma biblioteca, por ter vivido muitos fatos históricos.

Por Ana Kézia Gomes, g1 RO

O cacique do povo Ikolen Gavião de Rondônia, Catarino Sebirop, de 68 anos, que morreu na última sexta-feira (1º) em Ji-Paraná (RO) vítima de uma doença crônica no pulmão, levou consigo parte da memória de um povo. Para familiares ele será lembrado como exemplo de força. Ele deixa 13 filhos.

Segundo a família, Sebirop estava com problemas de saúde há dois anos. Ele passou por cirurgia para retirar pedra da vesícula e depois disso surgiram outros problemas, o mais recente era pulmonar. O cacique também chegou a ser infectado pela Covid-19.

g1 ouviu neste sábado (2) familiares, entidades e pesquisadores que conviveram com Sebirop, e cita abaixo as principais características do líder indígena.

Josias, um dos filhos de Sebirop, contou que o pai era “uma biblioteca”, por ter vivido muitos fatos históricos do povo.

“Ele aprendia e guardava tudo na memória. Aprendeu tudo com meu avô, que era uma lenda do povo Gavião, muito respeitado. Sabia de tudo da nossa cultura e meu pai herdou esse dom. Ele transmitia isso para os filhos e netos”, disse.

Catarino Sebirop também será lembrado como guerreiro, de acordo com entidades ligadas à causa indígena. Conforme informações da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), ele foi uma das lideranças que atuaram na luta para demarcação da Terra Indígena Igarapé Lourdes, além de liderar a retirada de invasores de áreas que deveriam ser protegidas em Rondônia e no estado de Mato Grosso.

Sebirop participou junto com a Fundação Nacional do Índio (Funai), dos primeiros contatos com diversos povos indígenas, como os Suruí e Uru-eu-wau-wau.

g1 conversou com Lediane Fani Felzke, doutora em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UnB) e professora no Instituto Federal de Rondônia (Ifro), que pesquisou sobre o povo Gavião em Rondônia e chegou a morar por aproximadamente 11 meses na aldeia, em contato com Catarino Sebirop.

Para ela, o cacique era o guardião dos saberes cosmológicos do povo Gavião, além de ser guerreiro.

“Ele era uma liderança regional e a memória dele precisa ser exaltada. Mais que uma biblioteca racional, ele era uma biblioteca cosmológica, pois conviveu com os pajés que já partiram. Ele era um líder político e espiritual ao mesmo tempo”, diz.

“As pessoas exaltam o lado dele guerreiro e isso tem que ser feito, mas ele também foi uma pessoa que valorizava os cantos e rituais. Sempre juntava os jovens, cantava e dançava as músicas dos pajés”, comenta a professora.

Durante os anos de pesquisa, Lediane Fani Felzke acabou desenvolvendo uma amizade com Sebirop e sua família, de acordo com ela, um dos ensinamentos que ele deixou foi o amor e a importância em registrar as histórias dos antigos, dos pajés que já se foram.

“Nós não-indígenas temos muito a aprender com os indígenas, pois eles têm esse olhar inclusivo. Eles respeitam os saberes dos antigos. Os Gavião são profundamente acolhedores. Sebirop foi uma liderança que sempre acolheu os seus aliados e mostrou que o saber do outro vem para somar”, lembra.

Terra indígena Gavião

Os Ikolen, também conhecidos como Gavião, vivem na região do município de Ji-Paraná (RO), próximo da divisa com o estado de Mato Grosso.

Segundo informações Instituto Socioambiental (ISA), a população se distribui em seis aldeias: Igarapé Lourdes, Ikolen, Cacoal, Nova Esperança, Castanheira e Ingazeira.

Cacique do povo Ikolen Gavião de Rondônia, Catarino Sebirop. Foto: Reprodução Redes Sociais

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