MPF pede que Tesouro Nacional devolva R$ 3,2 bilhões retirados de fundo de direitos coletivos

Governo federal agiu ilegalmente ao remanejar recursos para pagamento da dívida pública

O Ministério Público Federal (MPF) quer que o secretário do Tesouro Nacional, Paulo Valle, restitua ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD) quase R$ 3,2 bilhões remanejados para o pagamento da dívida pública. O fundo destina-se à reparação de prejuízos coletivos, como a degradação do meio ambiente e danos a consumidores, mas há anos vem sendo alvo de contingenciamentos para mascarar o saldo das contas públicas. A situação piorou nos últimos meses, após o governo federal redirecionar o equivalente a 82% dos recursos disponíveis com base em uma interpretação equivocada da Emenda Constitucional nº 109/2021.

O texto, aprovado em março, permite que o saldo de fundos públicos do Poder Executivo seja utilizado para a amortização da dívida. O FDD, porém, é um fundo especial de natureza vinculada. Isso significa que ele não pertence à estrutura do governo federal, e todo o dinheiro nele depositado deve se reservar ao objetivo estabelecido pela lei que o rege (Lei nº 9.008/95). As quantias são oriundas do pagamento de multas judiciais e administrativas aplicadas a infratores que violam os chamados direitos coletivos e destinam-se obrigatoriamente ao financiamento de ações que revertam os danos causados à sociedade.

Ainda que as permissões da EC 109/2021 abrangessem o FDD, a destinação dos recursos para outros fins só seria possível a partir da consolidação das contas referentes ao exercício fiscal deste ano, como também determina a emenda. No entanto, o Ministério da Economia ignorou todas as barreiras previstas no texto e determinou o remanejamento de R$ 3,198 bilhões do fundo, saldo que não corresponde ao balanço de 2021, mas aos vários anos de contingenciamento. O acúmulo é resultado de sucessivas aprovações orçamentárias que reservaram parcelas ínfimas das quantias do FDD aos projetos que deveria financiar. O restante permaneceu vinculado ao fundo apenas como crédito contábil, sem disponibilização para uso efetivo em ações de reparação coletiva.

A recomendação do MPF ao secretário do Tesouro é destinada também ao presidente do Conselho Federal Gestor do FDD, Paulo de Tarso Cancela Campolina de Oliveira. Ambos têm 45 dias para informar o acatamento dos pedidos e as medidas tomadas para a restituição do fundo. Caso as providências não sejam implementadas, Valle e Oliveira ficam sujeitos a medidas judiciais, como o ajuizamento de ações.

“Os valores do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos não são passíveis de alocação à amortização da dívida pública”, destacou o procurador regional dos Direitos do Cidadão adjunto em São Paulo, José Rubens Plates, autor da recomendação. “A interpretação apressada, açodada e irresponsável do Poder Executivo levou ao remanejamento indevido de verbas bilionárias que seriam aplicadas na recuperação de bens lesados em setores essenciais da sociedade brasileira, na reparação de danos de diversas naturezas.”

Em 2018, o MPF ajuizou uma ação civil pública para acabar com os constantes contingenciamentos do FDD. Na época, a Justiça Federal em Campinas (SP) acolheu os pedidos e concedeu uma liminar determinando que o dinheiro fosse integralmente destinado às finalidades do fundo, com ordem para que o orçamento federal do ano seguinte já considerasse essa previsão. Porém, a decisão provisória foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região após a União recorrer. O processo segue em tramitação, ainda sem o proferimento de sentença.

Leia a íntegra da recomendação do MPF

Assessoria de Comunicação
Ministério Público Federal em São Paulo

Ilustração: Agustín Sciammarella.

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