Podia ser mais uma crônica de um desastre anunciado. Afinal, era de conhecimento público que o fim do financiamento oriundo de um programa do Banco Mundial e os profundos cortes no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) levariam ao encerramento da verba que mantém o monitoramento do desmatamento do Cerrado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em 31 de dezembro do ano passado.
Nem era muito: para manter a equipe, formada por vinte pesquisadores, seriam necessários R$ 2,5 milhões ao ano. Mas, como o Estadão lembrou, o corte de 87% no orçamento do MCTI em 2021 serviu para que o governo turbinasse outros seis ministérios para atender a interesses de deputados e senadores: Desenvolvimento Regional, Agricultura e Pecuária, Comunicações, Educação e Cidadania, por ordem de valores recebidos.
Além de jogar fora um enorme capital científico, como destacou Edegar Rosa, do WWF-Brasil ao g1, o blackout de dados sobre desmatamento do Cerrado compromete ações de comando e controle sobre a grande caixa d’água do país, onde estão as nascentes de 8 das 12 grandes bacias hidrográficas brasileiras. Em última instância, isso eleva o risco sobre as seguranças hídrica, energética e alimentar do país – todas dependentes de bons níveis dos reservatórios hidrelétricos e de água potável e, portanto, da conservação do bioma.
Embora o atual diretor do INPE, Clézio De Nardin, tenha declarado pelas redes sociais que o monitoramento do Cerrado não vai parar, o Instituto já desmobilizou a equipe de pesquisadores focados no monitoramento do bioma e prevê a manutenção dos dados apenas até abril. A DW também noticiou o apagão científico.
O que garante que esta história terá um final diferente é a ação da sociedade civil. Nesta segunda (10), o MapBiomas anunciou que possui um sistema de alertas pronto para entrar em atividade, em caso de apagão dos dados do INPE. ((o))eco e g1 noticiaram o anúncio do MapBiomas.
A propósito: segundo dados do sistema PRODES, do INPE, o Cerrado brasileiro perdeu 8.531,44 km² de vegetação nativa entre agosto de 2020 e julho de 2021. Trata-se da maior extensão desmatada desde 2016. Curiosamente, os números foram divulgados no último dia de 2021: dia 31 de dezembro. O Globo traz os detalhes.
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TI Parque do Araguaia está no topo do ranking de focos de queimadas do Inpe em 2021 – José Cruz / Agência Brasil