Poluição em rio causou danos antropológicos a indígenas que tiveram que abandonar cemitério de ancestrais em MT, diz laudo

Vazamento de rejeitos após rompimento de tubulação de usina deixou água de rio poluída. Famílias aguardam indenização há 15 anos e pedem para fazer parte de ação judicial.

Por g1 MT

Um laudo pericial encomendado pelo Ministério Público Federal (MPF) apontou danos antropológicos aos indígenas da etnia Umutina que vivem na região de Barra do Bugres, a 164 km de Cuiabá, após terem que abandonar o cemitério onde estavam enterrados os ancestrais deles.

Muitas famílias tiveram que deixar suas casas e a área onde está o cemitério após o vazamento de resíduos de uma usina de cana-de-açúcar no Rio Bracinho, que abastecia a comunidade e era usado para a pesca de subsistência, em 2007.

Uma tubulação se rompeu, poluindo a água do rio, impactando o meio de subsistência da comunidade indígena que ainda hoje sofre com os danos, principalmente porque até hoje não houve decisão judicial indenizando as famílias.

Alguns indígenas tiveram que migrar para outros locais e algumas até saíram do meio rural para o urbano, abandonando a cultura e história de ancestralidade. À época, cerca de 100 famílias viviam na área.

O cacique Cacildo Amajunepá, que também teve que deixar a área com a família, disse que, depois do vazamento, os peixes que antes eram pescados para o consumo ficaram escassos.

“Tivemos que deixar tudo e procurar outra renda, pois até então nossa renda era o peixe. Precisamos vender tudo que tínhamos para tomar outro rumo. Tínhamos gado, plantações”, pontuou.

Há uma semana, houve um pedido da Associação Indígena Balatiponé, por meio da assessoria jurídica da entidade, para que os indígenas recebam diretamente as indenizações pedidas pelo Ministério Público Federal (MPF) à Usina Itamarati S/A.

Até agora, os moradores estavam sendo representados apenas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e, nesse caso, os recursos financeiros seriam destinados a um fundo do órgão e os indígenas afetados com o vazamento do duto poderiam não recebê-los diretamente. O pedido ainda vai ser analisado pela Justiça.

A reportagem tentou contato com a assessoria jurídica da usina, mas não obteve retorno até a publicação dessa matéria.

A análise pericial antropológica foi feita a pedido do Ministério Público Federal (MPF), que move a ação contra a usina.

Duas perícias foram feitas, uma sobre danos ambientais e outra sobre prejuízos antropológicos. Com o resultado, o presidente da associação pede à Justiça reparação ambiental avaliada em R$ 2 milhões; para danos morais, R$ 10 mil para cada família indígena e R$ 22,3 milhões por danos materiais.

O acidente foi no dia 29 de julho de 2007. Por um período, houve o vazamento de vinhaça – um líquido malcheiroso da sobra de uma destilação.

Na argumentação do pedido à Justiça, a Associação afirma que a terra indígena é considerada um bem sagrado e tudo o que vem a partir dela também ganha essa definição e respeito, como as plantas, que “se ela nasce em certo lugar, é dali que ela fica”.

“A perícia antropológica foi capaz de quantificar os danos sofridos pelos indígenas e conceituar a moral de tais povos, a qual está ligada à sua cultura e costumes”, diz trecho do documento.

À época, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) aplicou uma multa ambiental de R$ 4 milhões após uma investigação que demonstrou um dano ambiental com instrução in loco pelas autoridades, depoimento dos indígenas e com apoio do órgão sanitário municipal.

Na ação, a entidade ressalta que o rio é o principal meio de subsistência, não apenas para alimentação a partir da pesca e abastecimento de água às famílias, mas também para irrigar a plantação de café.

A comunidade iniciou um projeto de exportação dessa cultura, o que depende da irrigação do rio, mas ainda está contaminado pelo vazamento da vinhaça.

Entrada da comunidade Umutina-Balatiponé. Foto: Vivência Umutina

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