MPF pede urgência em julgamento sobre rombo bilionário do governo federal em fundo de direitos coletivos

Demora para análise de liminar pode tornar desfalque irreversível e ameaça projetos de reparação a danos sociais

O Ministério Público Federal (MPF) solicitou que a Justiça Federal julgue com urgência um pedido de liminar para que a União restitua ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD) R$ 3,2 bilhões remanejados para o pagamento da dívida pública. O MPF ajuizou uma ação civil pública em dezembro de 2021 requerendo que a Secretaria do Tesouro Nacional fosse imediatamente obrigada a devolver os recursos, que se destinam à reparação de prejuízos coletivos, como a degradação do meio ambiente e danos a consumidores. Até o momento, no entanto, o pedido não foi analisado.

A demora ameaça inviabilizar o retorno das quantias e sua aplicação nas finalidades previstas. Ao longo de 2021, o governo federal redirecionou o equivalente a 82% dos recursos disponíveis no FDD com base em uma interpretação equivocada da Emenda Constitucional nº 109/2021. O texto, aprovado em março do ano passado, permite que o saldo de fundos públicos do Poder Executivo seja utilizado para a amortização da dívida. O FDD, porém, é um fundo especial de natureza vinculada. Isso significa que ele não pertence à estrutura do governo federal, e todo o dinheiro nele depositado deve se reservar ao objetivo estabelecido pela lei que o rege (Lei nº 9.008/95).

As quantias do FDD são oriundas do pagamento de multas judiciais e administrativas aplicadas a infratores que violam os chamados direitos coletivos e destinam-se obrigatoriamente ao financiamento de ações que revertam os danos causados à sociedade. Ainda que as permissões da EC 109/2021 abrangessem o fundo, a destinação dos recursos para outros fins só poderia ter ocorrido a partir da consolidação das contas referentes ao exercício fiscal do ano passado, como também prevê a emenda.

No entanto, o Ministério da Economia ignorou todas as barreiras previstas no texto e determinou o remanejamento de R$ 3,198 bilhões do FDD. O saldo não corresponde ao balanço de 2021, mas ao montante contingenciado por vários anos. O acúmulo é resultado de sucessivas aprovações orçamentárias que reservaram parcelas ínfimas das quantias do fundo aos projetos que deveria financiar. O restante permaneceu vinculado ao FDD apenas como crédito contábil, sem disponibilização para uso efetivo em iniciativas de reparação coletiva.

A ação do MPF está em andamento na 13ª Vara Cível Federal de São Paulo. A tramitação já teve idas e vindas. Em janeiro, a unidade da capital paulista chegou a remeter o caso à subseção judiciária do Distrito Federal, alegando não ter atribuição para julgá-lo. A ordem foi revertida poucos dias depois em segunda instância. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) acolheu um recurso do MPF e manteve a ação em São Paulo.

Na decisão mais recente, a 13ª Vara informou aguardar a União apresentar sua contestação para então analisar o pedido de liminar. Porém, as considerações da defesa já haviam sido protocoladas em dezembro, quando a União manifestou-se sobre a tutela provisória e requereu o seu indeferimento. Com isso, destaca o MPF, os princípios do contraditório e da ampla defesa já foram observados, o que permite a apreciação da liminar requerida antes de qualquer nova manifestação das partes.

“Há risco de dano irreparável ou de difícil reparação caso não se determine que os recursos sejam restituídos ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD), de onde nunca deveriam ter saído. Isso porque, à medida que o tempo passa, fica ainda mais difícil a restituição por conta da vultuosidade dos recursos”, afirmou a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, órgão do MPF em São Paulo responsável pela ação.

Em 2018, o MPF já havia ajuizado uma outra ação civil pública para acabar com os constantes contingenciamentos do FDD. Na época, a Justiça Federal em Campinas (SP) acolheu os pedidos e concedeu uma liminar determinando que o dinheiro fosse integralmente destinado às finalidades do fundo, com ordem para que o orçamento federal do ano seguinte já considerasse essa previsão. Porém, a decisão provisória foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) após a União recorrer. O processo segue em tramitação, ainda sem o proferimento de sentença sobre o mérito.

O número da ação ajuizada em dezembro de 2021 é 5036410-48.2021.4.03.6100. A tramitação pode ser consultada aqui.

Leia a íntegra da ação

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