Ameaças do garimpo e invasões: o que se sabe sobre a Terra Indígena Baú, onde lideranças dizem ter detido garimpeiros no PA

Rio Curuá que corta a TI é rota de balsas garimpeiras e alvo de disputa judicial em relação a empreendimento de extração de ouro que, segundo o MPF, pode causar poluição.

Por Taymã Carneiro, g1 PA

A Terra Indígena Baú, cuja área equivale a 1,5 milhão de campos de futebol em Altamira, no sudeste do Pará, vive um novo episódio de avanço do garimpo ilegal de ouro no território homologado em 2008. Mas a região já sofre com o avanço da extração ilegal e de investidas de empreendimentos em busca do ouro.

Na TI, vivem cerca de 190 indígenas dos povos Pu´rô, que são isolados, e os Kayapós. A região é uma das afetadas pela usina hidrelétrica de Belo Monte.

Neste sábado (21), nove garimpeiros estão detidos por lideranças em uma aldeia, após tentativa de reativação de garimpo.

Kayapós dizem ter detido garimpeiros após tentativa de reativar garimpos em terra indígena

A localidade não possui rede de internet ou telefone e a comunicação só é feita via rádio amador por meio de frequência.

É uma das unidades de conservação da Terra do Meio na região entre os rios Xingu, Iriri e Curuá, que é um aglomerado de terras protegidas por lei e que estão sendo alvo de outras invasões por garimpeiros registradas este ano.

A Terra do Meio abriga, além da TI Baú, as áreas Mekragnoti e Curuaya; duas reservas extrativistas (Resex Iriri e Riozinho do Anfrísio); duas unidades de conservação estaduais – Floresta Estadual do Iriri e Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu; a Floresta Nacional (Flona) de Altamira e a Estação Ecológica (Esec) da Terra do Meio.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), todas as áreas da Terra do Meio sofrem com o aumento das invasões por grupos criminosos de grileiros, madeireiros e garimpeiros. Entre os pontos de vulnerabilidade, estão as falhas de fiscalização, de acordo com o órgão.

Em abril deste ano, a liderança Dotô Takahire, do povo Kayapó da TI Baú, disse que o avanço sobre o Curuá, que banha o território, é rota de garimpeiros que têm penetrado nas áreas protegidas da região.

Takahire afirmou que o rio pode ter sido a rota que levou uma balsa gigante de garimpo até as terras Xipaya.

“O Rio Curuá está contaminado por mercúrio e o Ministério Público está tentando resolver nossa situação, mas cadê a Funai? A Funai parou de ajudar os indígenas. Vocês brancos dizem que a terra é da União e vocês mesmos invadem a terra”, afirmou.

No início deste mês de maio, três garimpos clandestinos ilegais de ouro foram fechados durante uma operação federal conjunta nas terras Kayapó.

Os maquinários estavam em plena atividade dentro da terra indígena. Três escavadeiras hidráulicas, motores, documentos e galões com mercúrio – metal altamente poluente, foram apreendidos.

Projeto minerário

Além do garimpo ilegal, que promove invasões em áreas que deveriam ser protegidas, o Ministério Público Federal (MPF) aponta em processo, que tramita na 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), mais impactos relacionados à mineradora Coringa Gold Project, no limite de Novo Progresso e Altamira.

Em abril de 2019, o órgão já havia emitido parecer preliminar sobre possível contaminação por mercúrio na TI Baú.

O projeto da Mineradora Chapleau Exploração Mineral Ltda, do grupo Anfield Gold Corp, pretende explorar de ouro e prata, em mina distante 11 km da TI Baú, do povo Kayapó. O g1 tentou contato com a empresa, mas não ainda não havia obtido resposta.

Segundo ambientalistas da Rede Xingu+, o empreendimento também fica muito próximo ao rio Curuá, considerado um dos principais rios para os indígenas e que corta a TI Baú.

O MPF pede que o projeto minerário tenha licenças ou autorizações concedidas apenas depois de demonstrar que não causará impactos à região e após consulta prévia aos indígenas.

Segundo o MPF, o empreendimento pretende explorar 50 mil toneladas de ouro por ano e “ainda não há dimensão precisa dos impactos socioambientais da atividade, que pode afetar mais de 300 famílias do Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Terra Nossa e 506 indígenas da etnia Kayapó Mekrãnogti, além de ter grande potencial de contaminar o rio Curuá”.

Em dezembro de 2021, atendendo a pedido do MPF, o desembargador federal Souza Prudente, relator do processo no TRF1, em decisão provisória, determinou a suspensão, pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), da concessão de novos títulos de exploração à mineradora Chapleau.

Recursos foram apresentados ao Tribunal, mas o MPF apresentou contrarrazões no último dia 30 de março.

Para o MPF, não se trata apenas de direitos fundamentais dos indígenas Kayapó Mekrãnogti. “O licenciamento do projeto minerário ignora o domínio federal do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre a área do PDS Terra Nossa e expõe as famílias assentadas a um risco desconhecido”.

Nova invasão

O caso mais recente é registrado esta semana, quando um grupo de garimpeiros foi detido em aldeia Kayapó, na tentativa de desativar um garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Baú, no sudoeste do Pará.

Segundo liderança na aldeia, há nove garimpeiros detidos e ‘derramamento de sangue pode acontecer a qualquer momento‘.

Organizações indígenas em contato com os Kayapós informaram que os indígenas querem a presença da Polícia Federal para retirar os invasores detidos.

Os Kayapós relatam que flagraram os invasores tentando reativar um garimpo conhecido como Pista Nova, que fica dentro da TI.

Ainda segundo os Kayapós, o grupo ainda pretendia chegar até um segundo garimpo na região, conhecido Pista Velha, onde indígenas que estariam dando apoio aos invasores instalaram uma aldeia.

Liderança cobra ação de autoridades sobre invasão de garimpeiros em área indígena no Pará

Há risco de conflito entre os próprios indígenas – envolvendo os que apoiam o garimpo e os que são contra a exploração ilegal, segundo o Ministério Público Federal (MPF).

Informações da aldeia, coletadas por organizações indígenas, apontam que cerca de 40 indígenas ou mais podem se envolver no conflito.

O MPF informou, em nota, que acompanha a situação tensa na Terra Indígena Baú e que acionou as polícias Federal (PF) e Civil do Pará (PC) a fim de que tomem providências urgentes.

O MPF requisitou à PF que seja utilizada uma aeronave da operação “Guardiões do Bioma”, conduzida pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública para realizar uma ação imediata na área indígena.

Em nota, a PF disse que tomou conhecimento do assunto e que “está buscando a confirmação mínima dos dados”. Caso confirmado, a corporação disse que realizará operação no local.

A Polícia Civil do Pará, também acionada pelo MPF, disse que “irá atuar dentro de suas atribuições no caso”.

Aldeia Kayapó, na TI Baú, em Altamira, no Pará. Foto de outubro de 2018. Foto: Ascom MPF-PA

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