Desinformação tornou-se negócio que usa a tecnologia para conquistar poder e é um grande risco à democracia

Afirmação da subprocuradora-geral da República Raquel Dodge foi feita em audiência pública da Câmara dos Deputados

Procuradoria-Geral da República

A desinformação tornou-se o instrumento de uma engenharia sofisticada que tem adaptado a propaganda a era das redes sociais com o propósito de destruir a democracia, transformar a natureza do jogo democrático, eliminar a intermediação política, estabelecer o populismo e conquistar poder. A afirmação foi feita pela subprocuradora-geral da República Raquel Dodge durante o seminário Impactos da Desinformação e da Violência Política para a Democracia, promovido pelas comissões de Direitos Humanos e Minorias e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados.

Dodge ressaltou a importância da democracia e o extenso processo percorrido para alcançá-la. Segundo ela, esse regime político foi o vencedor da “Longa Guerra”, período de 1914 a 1990 permeado por batalhas violentas, como a Primeira e Segunda guerras mundiais, e estratégicas, como a Guerra Fria. Conforme explicou a subprocuradora-geral, nessa época, a democracia, o tribalismo e o totalitarismo disputavam o domínio do Ocidente. Com a queda do Muro de Berlim, na Alemanha, as nações assinaram um tratado reconhecendo a vitória da democracia.

A representante do Ministério Público Federal (MPF) relatou que nos dias atuais, o embate é entre a desinformação e a democracia. Ela aclarou que, com as mudanças tecnológicas, a tática da desinformação foi definida em um novo território, passando do real para o mundo virtual, das redes sociais. “Estamos diante de uma nova forma de desinformação, muito distinta daquela que conhecíamos há mais de duas décadas”. Para Dodge, a grande diferença é o uso estratégico da tecnologia da informação e o desprezo pela democracia.

De acordo com a subprocuradora-geral, a desinformação tornou-se um negócio, no qual o produto é a própria pessoa, seus dados, sua atenção e seu voto. Segundo Dodge, esse processo não tem transparência, pois ninguém sabe exatamente como os dados pessoais são coletados, quem os armazena e como serão utilizados nessa estratégia. Dodge pontuou que a desinformação informatizada não é mero acaso ou trabalho amador, mas sim um negócio estruturado por investimentos de grupos privados que visam realizar e defender os próprios interesses.

Para Raquel Dodge, esse modelo negocial pode até mesmo disseminar ideias radicalmente opostas, caso a tendência instantânea mude, já que o intuito principal é inflamar paixões de grupos, articular medos, gerar insegurança e unir extremos contra as minorias, para assim, formar a maioria eleitoral. “Seu sucesso consiste na captação do voto dos furiosos e na incoerência coletiva, incluindo a destruição de reputações e o reforço de preconceitos. É, por isso, uma ação populista”, definiu.

Conforme explicou a subprocuradora-geral da República, o propósito da desinformação é substituir as instituições democráticas e assumir a condução da política e da vida social. Dodge destacou que os principais alvos são aqueles que a denunciam, como a imprensa, o Parlamento, as entidades de checagem de fatos, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a advocacia. Assim, para conter a atuação dessas instituições, os agentes da desinformação procuram sempre desacreditar o trabalho que elas realizam.

Mesmo assim, Raquel Dodge pontuou que as instituições de controle podem conter a desinformação e seu impacto na democracia. Segundo ela, assegurar a liberdade de imprensa e a independência do Parlamento, do Judiciário e do MP são algumas das alternativas. Além disso, garantir a efetividade da lei de proteção de dados também é uma providência que pode e deve ser tomada. Por fim, a subprocuradora-geral reforçou o papel fundamental da imprensa livre para investigar atos de desinformação, assim como para informar o público. “A imprensa dever ser protegida, para que exerça seu trabalho livremente e para impedir que seja cooptada pela desinformação negocial”, defendeu. A audiência pública foi realizada na tarde dessa quarta-feira (29) com transmissão pelos canais da Câmara dos Deputados.

Foto de Antonio Cruz, da Agência Brasil.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

four × 1 =