Para o professor e ex-PGR, o Supremo não pode compactuar com o arquivamento das investigações contra Bolsonaro relacionadas à CPI da Pandemia. Assista na TV 247
Por Marcelo Auler, no 247
Com sua experiência de mais de 40 anos como professor de Direito e 35 anos de carreira no Ministério Público Federal onde exerceu o cargo de procurador-geral da República (2003/2005), Claudio Fonteles defende que o Supremo Tribunal Federal, em uma inovação, rejeite o pedido de arquivamento da representação que senadores da CPI da Pandemia apresentaram contra o presidente da República Jair Bolsonaro. O arquivamento foi proposto pela subprocuradora-geral da República Lindôra Araujo.
No entendimento do ex-procurador-geral da República, o pedido da subprocuradora é teratológico, isto é, algo monstruoso, sem a devida fundamentação, o que justificaria essa “inovação” por parte da suprema corte. O caminho por ele apontado na entrevista que concedeu à TV247 é de que o STF entendendo que o pedido é indevido, encaminhe-o à apreciação do Conselho Superior do Ministério Público Federal para uma análise do comportamento da subprocuradora pelo órgão colegiado. O conselho é formado por dez membros: o procurador-geral e seu vice (membros natos) quatro procuradores eleitos pela categoria e quatro subprocuradores eleitos pelos seus colegas de subprocuradoria.
“Diante de um quadro de extrema gravidade, em que você tem fatos (do presidente Jair Bolsonaro) bastantes a caracterizar condutas que põem em cheque a permanência do sistema democrático, não se pode aceitar esse pedido de arquivamento”, explica. Indo adiante, aponta a saída: “acho eu, na construção jurisprudencial que é sempre válida, a suprema corte, sem violar o princípio acusatório, porque mantém a palavra final do Ministério Público, nega a priori o pleito de arquivamento e submete-o a exame do Conselho Superior do MPF. Se o colegiado considerar que não aconteceu generalidade alguma, mantém o arquivamento. Mas se constatar que essa é uma peça teratológica, designa outro subprocurador-geral para o trabalho acusatório”.
Na entrevista previamente gravada, Fonteles reclama que o atual procurador-geral da República, Augusto Aras, compromete a instituição na medida em que vem sendo reiteradamente omisso com relação aos crimes praticados pelo atual presidente da República.
“O que está acontecendo com o PGR, uma figura chave porque chefia esta instituição fundamental para a democracia, é que jamais poderia ter acontecido, ou seja, um quadro completo de omissão. Se há uma instituição – e os membros dela – que foi feita para não ser omissa, é justamente o Ministério Público, cujos membros, nos estados, são chamados de promotores”. Ele acrescenta: “promotores são os que promovem, os que sempre agem”.
Ele destaca que o Ministério Público, conforme previsto na Constituição de 88, é “uma instituição da sociedade, não de governo, nem de Estado algum. Essa instituição existe em defesa do regime democrático. É o seu primeiro grande ponto. Defendendo o regime democrático, ela defende a ordem jurídica sobre a qual repousa o regime democrático (…) Defendendo a ordem jurídica esta instituição zelará pela presença dos direitos individuais de cada um de nós e também dos direitos coletivos, dos direitos sociais, em uma convergência magnífica entre o eu e o nós. Portanto, existimos para isso. Mas o que se tem hoje é uma inércia absolutamente condenável por parte do senhor procurador geral da República que não cumpre essa sua missão constitucional.”
Fonteles admite ainda que a omissão possa ser gerada por interesses pessoais, nada republicanos: “a verdade nua e crua é que quando se omite é porque se busca algo para si próprio, para si mesmo. Quando se descumpre missões – e missões de relevo constitucional -, é por se objetivar interesse individual. O que se diz, a voz corrente, o famoso fato notório, é que o senhor Augusto Aras objetiva ser guindado a vaga na suprema corte”.
Diante desse entendimento, em 2021, Fonteles e outros subprocuradores da República aposentados apresentaram uma representação para que o Conselho Federal do MPF analisasse o possível crime de prevaricação por Aras (Representação contra Aras é a defesa do MPF). Mas o subprocurador Humberto Jacques, na vice-procuradoria-geral da República por indicação do próprio Aras, impediu que a representação chegasse ao Conselho Superior. No STF, a reclamação contra esta interferência não encontrou guarida, e foi negada pelo então ministro Dias Toffoli.
Hoje ele defende esse mesmo caminho para o caso da subprocuradora, diante do comportamento dela com as representações encaminhadas pela CPI da Pandemia contra o presidente Bolsonaro e outras autoridades. Para ele, o STF não pode compactuar com este pedido de arquivamento.
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