No mês passado, o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes, peitou a Assembleia Legislativa do Estado e vetou uma lei para proibir a construção de usinas hidrelétricas em toda a extensão do rio Cuiabá, umas das principais artérias hídricas do Pantanal. A justificativa oficial foi de que a medida seria inconstitucional, mas outras razões podem ter contribuído para essa decisão.
Uma reportagem da Agência Pública destacou a atuação de Mendes na defesa de empreendimentos na bacia hidrográfica pantaneira. Ao longo de sua gestão, o governador mato-grossense pressionou entidades, órgãos públicos e políticos para flexibilizar a legislação e viabilizar a construção de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) na região. Entre os potenciais beneficiários dessa pressão, estão parentes do governador e de um ex-secretário de sua gestão no MT.
Um dos alvos do lobby pró-hidrelétricas no Pantanal foi a Agência Nacional de Águas (ANA). Em 2018, ela chegou a suspender a construção de seis PCHs da empresa Maturati Participações S/A; no entanto, depois de muita pressão do governo mato-grossense e de empresários aliados, as obras foram liberadas pela ANA dois anos depois.
Como se a coisa não fosse suficientemente esquisita, um dos projetos de PCH que pode ser destravado com o veto de Mendes beneficia o filho dele, Luiz Antônio Tavares Mendes. O projeto da PCH Santo Antônio pretende aproveitar as cabeceiras do córrego Aguaçu, no município de Santo Antônio de Leverger, em uma região conhecida como “Arco das Nascentes”, onde afloram os principais rios que abastecem 70% das águas do Pantanal. Inicialmente, o projeto era tocado pelo ex-bicheiro João Arcanjo Ribeiro, mas depois de sua prisão foi assumido pelo próprio Mauro Mendes, que repassou o empreendimento ao filho depois de sua eleição ao governo do MT.
O veto de Mendes à lei que proíbe PCHs no rio Cuiabá está sendo questionado pelo Ministério Público mato-grossense, que manifestou “preocupação” com a decisão do governador e o impacto ambiental potencial desses empreendimentos na bacia pantaneira. Em nota, o procurador-geral da justiça do estado, José Antônio Borges Pereira, afirmou que a derrubada da proibição de hidrelétricas no rio Cuiabá pode causar efeitos parecidos com aqueles sofridos pelo rio Jauru nos anos 2000, quando a construção de seis PCHs culminaram em seu secamento.
“Caso cenário semelhante ocorra no rio Cuiabá, põe-se em risco um curso d’água importantíssimo, do qual depende a maior aglomeração urbana do estado e boa parte de sua atividade cultural e econômica. O rio Cuiabá já sofre diversos impactos ambientais (desmatamento nas cabeceiras, efeitos da usina de Manso e lançamento de efluentes), mas certamente a instalação dos empreendimentos pode agravar e potencializar o cenário de degradação ambiental”, destacou Pereira.