Pecuarista que promete 15º salário caso Bolsonaro vença desmatou área de Cerrado

Cyro de Toledo Junior e a esposa, Lulude Meirelles, acumulam multas aplicadas pelo Ibama por desmatamento e incêndio em área de proteção, justamente na fazenda onde ele fez promessas para funcionários; Cyro figura em processo no qual trabalhador diz ter ficado sem água potável

Por Alceu Luís Castilho, Bernardo Fialho e Nanci Pittelkow, em De Olho nos Ruralistas

Viralizou nesta quarta-feira (04) vídeo em que um fazendeiro promete vantagens financeiras aos funcionários de sua fazenda caso Bolsonaro seja reeleito. “Tô aqui para dizer que o Nelore Cyro Fazenda Água Fria, se o Bolsonaro ganhar, (…) eu dou um 15º salário”.

Diante da atenção dos vaqueiros, o patrão completa: “E se ele ganhar no primeiro turno, eu dou um 16º salário”. Sem deixar dúvidas sobre qual voto ele espera dos trabalhadores em outubro, ele arremata: “Eu quero gente que pense igual a mim e vista a camisa da fazenda. Certo?”.

Conhecido como Nelore Cyro, o pecuarista se chama Cyro Fagundes de Toledo Júnior. Ele confirmou a oferta somando R$ 90 mil aos funcionários ao Painel da Folha, mas negou que esteja comprando votos.

De Olho nos Ruralistas identificou um histórico muito peculiar do fazendeiro: de multas por desmatamento no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a empréstimo controverso de dinheiro público junto ao Banco da Amazônia.

MULTA POR DESMATAMENTO FOI PARCELADA EM 60 VEZES

Em 2011, durante o governo Dilma, a propriedade localizada em Araguaçu (TO) recebeu multa de R$ 32 mil do Ibama por desmatar 31,35 hectares de cerrado sem autorização do órgão ambiental competente.

Em junho de 2018, no último ano do governo Temer, ele conseguiu o parcelamento da multa — a essa altura corrigida para R$ 72 mil — para ser paga em 60 vezes, até maio de 2023. A cobrança está em execução pelo TRF3 de São Paulo, onde ele reside.

Nascido em Curitiba, Cyro é casado com Maria de Lourdes Almeida Meirelles, de uma tradicional família do interior paulista. Parceira do marido na fazenda, ela foi multada em mais de R$ 200 mil pelo Ibama por queimar na mesma fazenda em Araguaçu um campo de Cerrado desmatado de mais de 200 hectares, sem autorização. Parte do crime ambiental ocorreu em Área de Proteção Permanente, às margens do Córrego Tesoura.

Apesar dos processos relativos ao órgão ambiental serem de competência federal, Lulude Meirelles, como é conhecida, obteve diversas vitórias no Tribunal de Justiça de Tocantins, em um processo que se arrasta desde 2014.

A fazendeira alega que o incêndio foi criminoso, executado por terceiros, e que ela e os funcionários fizeram Boletim de Ocorrência, mas no processo do Ibama — consultado por este observatório — consta que a queimada ocorreu em dias consecutivos e que o incêndio foi intencional.

FUNCIONÁRIO DIZ QUE CYRO O DEIXOU SEM ÁGUA POTÁVEL

Corre ainda contra Cyro de Toledo Junior um processo trabalhista que cobra R$ 96.727,62 por diversas irregularidades. Segundo relata o reclamante, ele foi contratado como tratorista, mas acumulava as funções de vaqueiro e de serviços gerais. Sozinho, cuidava do gado, fazia cercas e fazia a retirada e carregamento de madeira, “carregando toras de madeira que chegavam a pesar 50 quilos”, conforme descrito no processo.

O funcionário foi contratado em Araguaçu (TO) para trabalhar em uma fazenda no município de Jussara (GO), distante mais de 20 quilômetros da cidade mais próxima, sem veículo para se deslocar e inicialmente sem água potável, o que o obrigava a comprar água mineral.

Com dores no joelho e no ombro por conta do excesso de peso que carregava na fazenda, o funcionário ouviu de Cyro que “doente era quem tinha câncer e não qualquer bobeira”, quando avisou que precisava se ausentar para fazer exames e receber atendimento médico.

Em três anos, o reclamante não tirou nenhum dia de férias, o que é contra a lei. Cyro também não pagou sua mudança de volta para Araguaçu, a 570 quilômetros de Jussara, quando o dispensou sem justa causa. O processo ainda não foi julgado.

CASAL SOMA EMPRÉSTIMO MILIONÁRIO E ENGAJAMENTO POLÍTICO

Para a Fazenda Água Fria, Lulude Meirelles obteve em 2010 e 2012 empréstimos que somam quase R$ 7 milhões junto ao Banco da Amazônia, via Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO), criado pelo governo federal para fomentar o desenvolvimento da região. Ela deu como como garantia cabeças de gado e chegou a ser investigada por movimentações atípicas, mas foi inocentada.

Maria de Lourdes Almeida Meirelles conta no podcast Campo e Batom que cresceu em uma fazenda no interior de São Paulo. Depois que se casou, gerenciou a transportadora do marido e atualmente é a responsável pelo gestão da Fazenda Água Fria. Nas suas redes sociais, Lulude Meirelles já compartilhou imagens antipetistas e o apoio ao candidato Aécio Neves (PSDB) nas eleições de 2014.

No Instagram da Fazenda Água Fria, entre gado nelore, touros e cavalos mangalarga marchador, imagens estampam a bandeira do Brasil e bois ilustrados em verde e amarelo.

À Folha, Cyro disse que não houve compra de votos:

— Nós somos todos cabos eleitorais. Aqui na fazenda somos cabos do Bolsonaro. Vamos votar nele. Mas isso foi mais uma brincadeira. Será dado [o bônus], mas não vou dar dinheiro para político, vou dar dinheiro para os meus funcionários se o Bolsonaro ganhar. Só isso. Se o Bolsonaro ganhar, quero que eles tenham um Natal feliz. Não estou comprando voto de ninguém. Só que nós, em peso, votamos no Bolsonaro.

Ele mesmo calculou o custo do Natal feliz dos funcionários:

— O que sentimos na fazenda é que os salários estão muito baixos e o custo de vida, muito alto. Todos os meus empregados estão com problema. Então, uma forma que vi de ajudar e resolver o problema foi isso. Não existe intenção de compra de votos. Essa brincadeira vai me custar R$ 90 mil se o Bolsonaro ganhar.

Foto principal (Divulgação/Governo do Tocantins): fiscalização flagra desmatamento

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