Crime e (falta de) castigo no Faroeste Amazônico

ClimaInfo

Novo Progresso (PA) é um retrato da Amazônia sob o governo Bolsonaro. Nascido nos escombros do desenvolvimentismo caolho dos governos militares, o município figura hoje entre as áreas com maior índice de desmatamento, impulsionado por invasões de Terras Indígenas e Unidades de Conservação, e pelo garimpo. Da mesma forma, a violência calo de Almeida / FolhaPressLontra as comunidades indígenas cresceu nos últimos quatro anos, com os criminosos aproveitando o desinteresse do poder público em fiscalizar e defender a lei.

O descaso oficial e a audácia criminosa transformam o município – e muitas outras áreas da Amazônia – em uma terra de ninguém. “Novo Progresso é uma espécie de Velho Oeste brasileiro”, lamentou Ane Alencar, do IPAM, à Amazônia Real. “Um território onde aparentemente o crime compensa, porque há Terra Indígena e Unidades de Conservação sendo invadidas constantemente e as pessoas não respeitam as leis”.

O governo Bolsonaro, com seu saudosismo dos tempos ditatoriais, revitalizou a mentalidade destrutiva de atores políticos e econômicos da Amazônia, que enxergam a derrubada da floresta como único caminho para o progresso. “São pessoas com a mentalidade do colonizador, do agronegócio, do ‘bandeirante’ portador do desenvolvimento”, explicou Edna Castro, socióloga e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Em outras regiões da floresta, o clima de “faroeste” é ainda mais acentuado. No Amazonas, a Folha mostrou como o estado antes tido como o mais preservado da Amazônia se transformou em epicentro da devastação sob Bolsonaro. Além do desmatamento crescente, o Amazonas também virou palco de conflitos socioambientais, expostos recentemente pelos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips no Vale do Javari.

“Tem uma coisa que articula todos os problemas: o padrão de desenvolvimento que vem predominando na Amazônia toda e no estado do Amazonas. Uma modernização que se beneficia da exploração de recursos naturais – madeira, terra, minério, águas – e ignora o conhecimento e os modos de vida das populações locais”, afirmou Marcelo Seráfico, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Já em Roraima, um dos problemas crônicos por trás da destruição ambiental e da violência fundiária é a expansão do garimpo, principalmente na Terra Indígena Yanomami. De novo, a omissão governamental abriu espaço para que grupos criminosos avançassem floresta adentro nos últimos anos.

“Essa intensificação no ritmo do desmatamento em Roraima tem atores já conhecidos em outras regiões da Amazônia, como grileiros e garimpeiros, que se aproveitam de fatores como a flexibilização das penalidades relacionadas a crimes ambientais e a sensação de impunidade”, assinalou Bianca Santos, do IMAZON, à Folha.

Quando o assunto é ilegalidade em Terras Indígenas, o descaso governamental se torna cúmplice do crime. Um exemplo disso foi abordado pelo InfoAmazonia: em Roraima, o governador Antonio Denarium tem ressaltado a queda nos índices de mortes violentas e ignorado solenemente a explosão de ameaças e agressões contra as comunidades indígenas.

“As mortes que acontecem no campo, que têm indígenas como vítimas ou não, elas não entram nesses dados e sequer há uma atenção voltada para que entrem”, analisou Alan Fernandes, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Um levantamento do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) apontou que Roraima é o 3o Estado com maior número de assassinatos de indígenas do Brasil, com 32 mortes confirmadas em 2021.

Em tempo: O assassinato do ambientalista José Gomes e sua família em janeiro passado, em São Félix do Xingu (PA), segue sem resolução. O crime ocorreu em uma área reivindicada pelo fazendeiro Francisco Torres de Paula Filho, vulgo Torrinho, candidato a deputado estadual no Pará, e irmão do prefeito do município, João Cleber de Sousa Torres. Ativistas questionam a falta de avanços da Polícia Civil no caso. “Não há informação nenhuma, até hoje não se sabe qual é a linha de investigação nem o que já foi feito no caso. Por que tanto mistério?”, disse José Batista Afonso, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ao InfoAmazonia.

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