O bando. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

Estão por aí. Vejo. Sinto. Ouço. Em todos os lugares. Nos bares, becos e bancos de praça. Nas casas, lares felizes para os que veem de fora – e de longe. Nas igrejas, nos trabalhos e nos vai e vens das ruas apinhadas de gente apressada com atenção dividida entre vitrines e gente com cara de ladrão. Sim, eu sei. Estão perto. Muito perto. Onde menos se espera. E mais ainda onde se espera.

Palavras duras ditas de peito estufado e punho cerrado pedem ditadura. Outras, publicadas em caixa alta sem acentos, pontos, vírgulas ou quaisquer outros entraves à escrita que deve sair como que vomitada de sentimentos em palavras, em jorros e engasgos. Espalham pelo ar sua presença. Para que todos vejam. Para que se contaminem também. Para sujarem outras mentes e espíritos das imundícies violentas acalentadas pelos que são do bando.

Continuam por aí. Não acabou. Coisas assim não acabam com uma eleição. Ou prisão de centenas ou até de milhares dos tolos do bando. O bando não some enquanto ainda houver a raiva que os consome. Não acaba quando acaba a grana ou o acampamento que os amontoa a olhos vistos – berçário de performances coletivas grotescas. Não some quando as coisas somem porque ainda que o bando seja uma coisa, não é da natureza das coisas aquilo que os amontoa. As gentes do bando são só a casca e a cara do bando, não sua alma. O que os une é fluido. É o que deles sai. É o que neles há.

O bando é feito de sentimentos baixos. Daqueles que fazem do homem o macho que violenta, bate e mata. Dos mesmos que fazem de algum pedido de tudo na vida tornar-se alguém que faça outros perderem tudo na vida, até a vida. São aqueles sentimentos que só geram alegrias quando das tristezas dos outros. Sentimentos que fazem, dos que são do bando, gente que só é capaz de construir algo para destruir outro algo ainda mais valioso. Algo que sente não ser seu e que se não é seu, não pode ser de mais ninguém.

O bando não faz os sentimentos. Os sentimentos fazem o bando. O bando só faz as ideias que dão palavras aos sentimentos. Palavras ditas por quem não faz ideia do que diz. Porque não há ideias por detrás das ideias. Há só sentimentos e o vazio no qual o que se ouve ou vê vira discurso, postagem, textão, meme, mitagem ou qualquer outra forma de sentir para fora, de espalhar o sentimento. O bando cresce na comunhão da tristeza, na ilusão das frustrações tolas, nos devaneios ilusórios de grandeza e nobreza de uma gente cujo espírito é vil e incapaz de sentir, incapaz de compreender e mais incapaz ainda de praticar qualquer ato de genuína grandeza.

E continuam por aí. Ainda que silenciados por um tempo. Continuarão enquanto houver ódio, tristeza e ressentimento suficiente para criar comunhões de ressentidos. União de tristezas sob a ilusão de que suas tristezas terão fim com o fim da alegria de outros. Com o fim de outros. Com o fim de tudo.

Ilustração: Mihai Cauli 

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