Fiscalização resgata 2.575 pessoas do trabalho escravo: 148 migrantes, 30 no setor doméstico e 80% negros

Setor rural concentra 73% do total. Entre os resgatados, havia 35 crianças e adolescentes

Por Vitor Nuzzi, da RBA*

O número de pessoas resgatadas em condições análogas ao trabalho escravo subiu para 2.575 no ano passado (31% sobre 2021), um total que ainda pode aumentar. Desde 2013 não havia mais de 2 mil resgatados em um só ano. Foram 462 ações de fiscalização em todo o país, segundo a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As denúncias ao Sistema Ipê, por exemplo, cresceram 66% ante 2021. Desde o início das fiscalizações, em 1995, o total de resgatados chega a 60.251.

No próximo sábado (28), celebra-se o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. A data foi escolhida por causa do assassinato, em 2004, de quatro funcionários do Ministério do Trabalho, em Unaí (MG). Nesta quinta-feira (26), às 17h, o Sinait, sindicato dos auditores-fiscais, realizará ato público virtual para homenagear os servidores.

Minas tem 41% dos casos

Minas Gerais foi justamente o estado com mais ações fiscais no ano passado. Foram 117, com 1.070 trabalhadores resgatados, 41,5% do total. Em seguida, vêm Goiás (49 operações e 271 trabalhadores encontrados) e Bahia (32 e 82, respectivamente). Apenas no município de Varjão de Minas, 273 foram resgatados de condições de trabalho consideradas degradantes, na atividade de corte de cana de açúcar.

Assim, entre as atividades econômicas, 362 pessoas foram resgatadas no cultivo de cana e 273 em atividades de apoio à agricultura. Além delas, outras 212 na produção de carvão vegetal, 171 no cultivo de alho, 168 no cultivo de café, 126 no cultivo de maçã, 115 em extração e britamento de pedras, 110 na criação de bovinos, 108 no cultivo de soja, 102 na extração de madeira, 68 na construção civil, 63 em restaurantes e 39 na confecção de roupas. O setor rural concentra 73% do total.

Trabalho escravo doméstico

Os fiscais encontraram ainda 30 pessoas em situação de trabalho escravo doméstico, em 15 unidades da federação. Dez apenas na Bahia. “Em razão da grande repercussão do resgate da trabalhadora doméstica Madalena Gordiano, no final de 2020, em Patos de Minas (MG), o número de denúncias aumentou em todo o país, o que levou a Inspeção do Trabalho a aumentar a fiscalização nesse setor” com o objetivo de verificar possível situação de escravidão contemporânea em ambientes domésticos rurais e urbanos, sendo que essa situação foi encontrada em 29 ações dentre as 43 realizadas em 2022”, afirmou o chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), Maurício Krepsky.

Outro dado mostra que 148 trabalhadores resgatados pelas equipes eram migrantes, número que dobrou em relação a 2021. Desse total, 101 eram paraguaios e 25, bolivianos. Havia ainda venezuelanos (14), haitianos (4) e argentinos (também 4).

Crianças e adolescentes

Entre os trabalhadores encontrados em situação análoga à de escravo, havia também 35 crianças e adolescentes, em várias atividades, mas principalmente no cultivo de café (24%). Dez eram menores de 16 anos, enquanto 25 tinham de 16 a 18 anos.

Do total de 2022, 92% eram homens, 29% tinham de 30 a 39 anos e 80% se declararam negros ou pardos. Além disso, quanto à escolaridade, 23% afirmaram ter estudado até o quinto ano incompleto e 20% haviam cursado do sexto ao nono, também incompletos. Já 7% dos trabalhadores resgatados se declararam analfabetos.

Indenizações somam quase R$ 8,2 milhões

As indenizações somaram R$ 8.187.090,13, o que inclui verbas salariais e rescisórias em razão da rescisão imediata dos contratos de trabalho. O vínculo de emprego com a formalização de contratos alcançou 1.122 trabalhadores. Foram recolhidos mais de R$ 2,8 milhões para o FGTS.

Além dos auditores-fiscais do trabalho, as operações dos grupos móveis incluem Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (DPU). De acordo com o MPT, em 2022 houve crescimento de 17% nos termos de ajuste de conduta (TACs) e de 8% no total de ações civis públicas (ACPs) ajuizadas.

A coordenadora nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete), Lys Sobral Cardoso, vê avanço das instituições no combate ao crime. “Apesar de ainda encontrarmos casos de trabalho escravo tantos anos após a abolição formal da escravatura no Brasil, o aumento do número de denúncias e de resgates revela que o Estado está conseguindo aperfeiçoar, cada vez mais, o combate às violações de direitos no país”, afirmou.

Com informações do MPT, MTE e Sinait.

Imagem: João Ripper

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