Contag quer ‘revisão total’ do programa de financiamento e novo plano de reforma agrária

Com mudança de governo, trabalhadores esperam reativação de políticas públicas e mais recursos. “Quem produz alimentos é a agricultura familiar”

Por Vitor Nuzzi, da RBA

A semana que passou trouxe certo alívio para as organizações de trabalhadores rurais, depois que o governo efetivou a direção do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), até então interina. A expectativa, agora, é de que com as nomeações dos superintendentes regionais as políticas voltem a andar, após dois meses de paralisação. Mas não basta, segundo o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), Aristides Santos. “O Incra tem que passar por um debate de reformulação”, afirma. “Tem uma questão orçamentária que ainda não está clara, mas tem coisas de gestão política.”

Agora, os rurais discutem a pauta do Grito da Terra para entregar ao governo até o final do mês. Depois de negociar a pauta com até 16 ministérios, em governos anteriores, o setor viveu maus bocados na gestão encerrada em 2022.

Imenso retrocesso

“Um retrocesso imenso”, diz Aristides. “Em 2015, chegamos a ter 600 milhões no Orçamento da União para assistência técnica. Agora, não chegava a 40 milhões. No PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), chegamos a ter 1 bilhão. No ano passado, tinha 180 milhões”, compara. Já no Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), não há reajuste no percentual da merenda desde 2015. “Ou seja, tudo isso está muito defasado. O Orçamento (deste ano) ainda é do governo passado”, lembra.

Assim, o presidente da Contag acredita que este será ano de “construção” e debate. “Os canais estão reabertos. o que isso vai gerar de política pública, de resultado, só mais à frente vamos perceber”, observa, esperando outra postura do poder público.

“Tinha área no governo Bolsonaro que estava pacificada já. O que o Incra fez? Desistiu da ação.” A dinâmica do campo muda, lembra o dirigente.

“Por exemplo, na França o Estado aluga as terras, não desapropria. Não estou dizendo que vai ser assim aqui, estou dando um exemplo. Tem terra pública sendo usada por grande proprietário que poderia ser destinada aos pequenos.”

Terra concentrada

Assim, a Contag defende um novo plano de reforma agrária, “atualizado aos tempos atuais”. São apenas 23% das terras nas mãos dos agricultores familiares, que produzem a maior parte dos alimentos consumidos internamente. A terra deveria ser melhor distribuída: “O problema não é só social. É político, é econômico, de desenvolvimento acima de tudo.”

Isso leva de novo ao Grito da Terra. “Do mesmo jeito que falei que temos que ter um novo plano de reforma agrária, novo Incra, nós também vamos propor uma reformulação no Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Segundo Aristides, o plano precisa ser aprimorado para acompanhar a realidade. A maioria hoje é excluída do financiamento.

Política precisa ser revista

“Hoje, basicamente, financia os agricultores e agricultoras que já estão num processo mais avançado de desenvolvimento. Aqueles que têm mais dificuldades não estão acessando o crédito. O que fazer com esse publico que está fora? Uma parte não tem como ser crédito – tem que criar uma linha de fomento.”

E, claro, isso passa também por mudanças na assistência técnica. “Temos que combinar isso com o incentivo ao cooperativismo. Precisamos revisar toda a política do Pronaf”, defende.

Mesmo com dificuldades no Congresso, Aristides também aposta no diálogo política. Na recente forma da Previdência, por exemplo, os sindicalistas conseguiram deixar os rurais de fora. “Só não conseguimos conversar com o Novo.”

Para sair do Mapa da Fome

Com isso, foram vários os fatores que levaram o Brasil de volta ao chamado Mapa da Fome. Não basta colocar dinheiro, diz Aristides, é preciso combater as fraudes. Para ele, faltou, por exemplo, mais mapeamento das pessoas atingidas. “Eram melhor mapeadas pelas prefeituras. Era pra ter saído do Mapa da Fome e virado essa página.”

Nesse sentido, o presidente da Contag defende foco no mercado interno, considerando que o agronegócio é voltado à exportação. “Isso porque não tem como sair (dessa situação) sem produzir alimentos, e quem produz é a agricultura familiar”, afirma. A produção de alimentos e a preservação ambiental serão os eixos do Grito da Terra 2023.

Foto: Divulgação/Mapa

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