Lula não foi à Europa apenas para discutir uma nova agenda financeira global na Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global e confirmar que é um ícone pop mundial, ao defender a preservação da Amazônia no festival Power Our Planet. O presidente ainda tentou destravar o acordo entre União Europeia e Mercosul, particularmente junto à França, cujo parlamento aprovou um veto ao tratado.
Na viagem oficial de Lula por Itália e França, suas declarações sinalizaram um aparente impasse incontornável nas conversas. O presidente disse que as exigências da UE são uma “ameaça”, “inaceitáveis” e protecionistas, relatam O Globo, Valor e UOL. Entretanto, as falas são parte de uma estratégia para evitar que os questionamentos do bloco europeu sobre a pauta ambiental possam se tornar barreiras não tarifárias a produtos brasileiros.
De acordo com analistas ouvidos pel’O Globo, as falas do presidente não afastam o acordo, que é bem-visto pelo Brasil e seus sócios sul-americanos. Mas indicam que os termos não serão aceitos apressadamente para atender aos interesses dos europeus. E o foco do imbróglio está no agronegócio brasileiro, o principal vetor do desmatamento da Amazônia, e também de concorrência ao setor agrícola europeu.
Para diplomatas, era necessária a fala de uma liderança política com a visibilidade e a credibilidade que Lula tem na Europa para chamar a atenção para os novos pontos colocados pela UE que modificaram o texto fechado em 2019. O adendo, lembra O Globo, pede a antecipação de metas ambientais anunciadas pelos países em conferências internacionais, principalmente a redução das emissões de gases-estufa previstas no Acordo de Paris de 2015. O que é visto mais como uma barreira protecionista do que uma preocupação efetiva com o clima.
Por isso, as “espetadas” de Lula foram o “abre-alas” para aprofundar as negociações com a França. Lula havia dito que pretendia conversar com o presidente francês, Emmanuel Macron, “porque a França é muito dura nos seus interesses agrícolas”, informa o Valor.
Reforçando sua disposição para fechar o acordo, o presidente brasileiro reconheceu as dificuldades de Macron com o congresso francês. Por isso disse que conversaria com parlamentares de esquerda do país para mostrar a importância do tratado, informa o Valor. Apesar de reconhecer que é normal a França defender sua agricultura, assim como o Brasil defender as compras governamentais – o que também vem dificultando a conclusão das negociações –, Lula disse que o protecionismo europeu não tem sentido.
“Podemos melhorar outras coisas e podemos chegar a um acordo. Nós precisamos fazer acordo com a UE e a UE tem que fazer acordo com o Mercosul. Ambos precisam um do outro. É preciso deixar a arrogância de lado e colocar o bom senso”, disse Lula.
Em entrevista a rádios públicas francesas, Macron defendeu um acordo de transição ecológica com o Brasil, conta Jamil Chade no UOL. O pacto chegou a ser negociado durante o governo do inominável, mas não foi assinado, por motivos óbvios.
O entendimento, válido por três anos, abria “perspectivas de cooperação em vários setores-chave para os dois países: água, saneamento e gestão de resíduos, gestão de águas pluviais, inundações, eficiência energética e iluminação pública, mobilidade urbana de baixo carbono, gestão de recursos hídricos e habitação, especialmente para fins sociais”.
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Ricardo Stuckert