Passagem de ciclone extratropical pelo Rio Grande do Sul deixou mais de 40 mortos. Procuradores apuram se autoridades se omitiram em medidas preventivas ao desastre.
O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito civil para apurar as providências tomadas pelo poder público em relação às enchentes que atingiram a região serrana e do Vale do Taquari no Rio Grande do Sul na semana passada. O desastre deixou pelo menos 44 mortos, com outras 46 pessoas ainda desaparecidas.
De acordo com o MPF, o objetivo do inquérito é “averiguar possíveis responsabilidades quanto a medidas que poderiam ter sido tomadas para mitigar e prevenir os efeitos adversos das inundações, bem como proporcionar ações de comunicação e resposta no auxílio à população atingida”.
Inicialmente, o MPF pretende analisar a conduta e a resposta das prefeituras e da Defesa Civil dos municípios de Bento Gonçalves, Caxias e Lajeado. Os procuradores também solicitaram à Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Estado informações sobre a conclusão do zoneamento ecológico e econômico, bem como a criação de possíveis comissões de mudanças climáticas. Estadão, g1 e O Globo deram mais informações.
A resposta do poder público no RS ganhou destaque na imprensa na última 4ª feira (6/9) depois do governador Eduardo Leite afirmar à GloboNews que os institutos de meteorologia não indicaram o volume histórico de chuva que caiu no estado.
O chefe do Executivo gaúcho foi desmentido pela agência MetSul, que antecipou a possibilidade de chuvas acima de 300 milímetros no começo de setembro. “Os modelos, assim, anteciparam os volumes de chuva. A gravidade do que se avizinhava já era conhecida muitos dias antes. A ciência meteorológica cumpriu seu papel”, destacou a MetSul. Exame e UOL repercutiram a notícia.
Na mesma entrevista, Eduardo Leite também causou polêmica ao bater boca com o jornalista André Trigueiro. O governador se irritou ao ser questionado sobre medidas de prevenção a desastres climáticos, o que ele entendeu como uma acusação ao governo do estado e “falta de empatia” do jornalista com a situação.
“Quando ocorre um evento dessa escala, dessa ordem de grandeza de tanta dor e sofrimento, é nosso dever fazer perguntas. (…) Eu falei de cultura de prevenção, que não necessariamente se resolve apertando botão em quatro anos. (…) Não estou culpando ninguém”, justificou Trigueiro. A celeuma foi abordada por diversos veículos, como Correio Braziliense, IstoÉ e UOL.
De fato, não foi por falta de aviso que as autoridades gaúchas não atuaram para prevenir o desastre. Como bem lembrou o g1, a Região Sul do Brasil registrou 71 dos 92 alertas de tempestade perigosa emitidos pelo governo federal nos últimos dez anos. A esmagadora maioria desses alertas aconteceu em Santa Catarina (64), seguida por RS (cinco) e Paraná (duas).
“A gente precisa não só de obras para tentar minimizar ou reduzir os efeitos dos eventos extremos, mas também desenvolver junto aos gestores públicos e à população uma cultura de prevenção”, comentou o professor Pedro Luiz Côrtes, do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), ao portal ((o)) eco.
Sem medidas preventivas, o impacto humano e material das chuvas extremas fica ainda mais latente. A Folha trouxe um levantamento preliminar da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) que estimou o prejuízo decorrente do ciclone extratropical no RS em R$ 1,3 bilhão. Os setores de comércio e agricultura concentram a maior parte das perdas, pouco mais de 650 milhões de reais até o momento.
Para a reconstrução das áreas destruídas, o governo gaúcho promete considerar a mudança climática em novos projetos de infraestrutura. “Dentro de todo evento climático, [incluindo] salvamentos, resgates, assistência humanitária e agora no processo de reconstrução, a gente já tem que levar em consideração essas novas condições climáticas”, disse Eduardo Leite, citado pela Folha.
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Mauricio Tonetto / Palácio Piratini