Ocupação sem-terra de duas décadas recebe pedido de reintegração de posse em Porto de Pedras (AL)

Famílias camponesas da comunidade Domingas resistem há mais de 20 anos na luta pela terra

Por Lara Tapety, CPT AL

As famílias camponesas do acampamento Domingas, situado em Porto de Pedras, no litoral norte de Alagoas, receberam na terça-feira, 12, o mandado de reintegração de posse com o prazo de 15 dias para a desocupação voluntária da área. Há mais de 20 anos elas ocupam parte do imóvel rural denominado Recanto da Baianinhas.

Apesar de haver uma negociação em curso intermediada pelo Governo do Estado de Alagoas, através do Instituto de Terras e Reforma Agrária (Iteral), com a possibilidade da aquisição da área ocupada, o conflito no campo se intensificou. Os agricultores, acompanhados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), temem perder tudo o que têm para sobreviver e garantir o sustento de seus filhos e netos.

De acordo com o mandado assinado pelo juiz de direito José Afrânio dos Santos Oliveira: “No prazo, deverão retirar barracos e demais construções e fazer a colheita dos produtos por eles plantados, se houver, sem praticar qualquer tipo de danificação. Não realizada a desocupação de forma voluntária, ressalto que a reintegração será feita de forma compulsória com o uso da força policial, caso seja necessário”.

Diante da iminência de mais um caso de violência no campo, a CPT entrou em contato com o Iteral e com a Câmara de Conciliação Agrária, órgão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).

O governo do estado busca uma solução com o proprietário do imóvel rural no sentido da aquisição da área. Já a Câmara de Conciliação Agrária do governo federal encaminhou ofício ao magistrado solicitando atenção especial a situação das famílias acampadas e à defensoria pública pedindo prestação de assistência jurídica urgente a elas.

No ofício ao juiz, a diretora Maíra Coraci Diniz, escreve: “Esta Câmara de Conciliação Agrária foi informada que se trata de uma ocupação pacífica de famílias vulneráveis, compostas por muitos idosos e crianças, que estão cultivando alimentos em parte do terreno que estava sem nenhuma destinação. Tais famílias reivindicam o território para fins de reforma agrária, diante da alegação de que a área estava há anos sem destinação alguma”.

Conflito no campo – A situação das famílias camponesas da comunidade Domingas já foi comunicada pela CPT às autoridades anteriormente, inclusive, em denúncias de ameaças feitas por homens armados aos agricultores e as agricultoras.

“Antes era bem legal aqui. Mas hoje em dia a gente está passando por um problema sério. Muita ameaça. Os cabra [sic] chega aí com aquelas Hilux, três chegou, doze caras aí; da outra vez veio quatro (caminhonetes), tudo armado, com umas pistolas, dizendo: ‘Aqui é o pouco, e lá dentro tem muito, viu minha gente! Vocês têm 15 dias para desocupar isso aqui’. E passava cinco ou seis dias e voltava de novo. E a gente vive nesse tremendo medo – como diz a história – a gente está dormindo e quando escuta a zuada [sic] do carro já fica assustado”, conta o camponês Sebastião Domingos dos Santos.

Conhecido como Báu, Sebastião mora há 10 anos no acampamento. Ele relata que saiu do corte de cana para trabalhar na roça. Lá, planta abacaxi, cana caiana, maracujá, macaxeira, entre outros alimentos.

Aos 72 anos de idade, Maucina Varlerlei Silva, está há 20 anos em Domingas. A senhora alegre e cheia de vida adora trabalhar com hortaliças e frutas. Quando questionada como vendia seus produtos, Dona Maucina grita:

“Bom dia Alagoas, olha eu! Olha a cebolinha! Olha o pimentão! Olha a pimenta! Quem vai querer? Chega para cá!”. O sonho de quem atingiu a chamada melhor idade no acampamento é a conquista da terra: “O meu sonho é eu ganhar, se eu tiver o merecimento, porque eu já estou assim né e talvez eu nem chegue lá. Mas eu peço a Jesus que faça eu alcançar a vitória de nós todos aqui”, disse.

Além das pessoas que chegaram na área a partir da ocupação, há também quem vive ali desde antes da falência da fazenda. Esse último é o caso do senhor José Cícero de Araújo. “Meu filho mais velho está completando 34 anos e é o tempo que eu tenho aqui”, relata o ex-funcionário da fazenda. Inicialmente, ele trabalhava fazendo o coroamento e adubação de coqueiros e laranjeiras; depois, foi tratorista durante 15 anos. “Aí foi o tempo que a fazenda faliu e eu fiquei trabalhando na agricultura de enxada, fiquei trabalhando plantando roça. Quando o pessoal chegou, fiquei aqui”. O agricultor, que sequer recebeu alguma indenização pelo tempo de serviço, hoje planta uma variedade de produtos que é entregue para ser merenda de escolas da prefeitura do município e do estado. Entre os alimentos da roça de José Cícero estão macaxeira, banana prata, banana comprida, milho, feijão de corda e inhame.

As famílias camponesas da comunidade Domingas produzem alimentos para subsistência e para alimentar a população da cidade. Elas sonham e vivem com fé da conquista da Terra Prometida.

Foto: Agência Brasil

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