Acordo judicial garante titulação de território quilombola em Ubatuba (SP)

Esta será a primeira propriedade quilombola reconhecida em área sobreposta por parque no estado de São Paulo

Ministério Público Federal em São Paulo

Um acordo assinado nesta segunda-feira, 18, assegura a propriedade de uma área de 3,3 mil hectares em Ubatuba (SP) à Associação dos Remanescentes da Comunidade do Quilombo da Fazenda. O grupo ocupa o local desde o fim do século XIX, mas vinha enfrentando dificuldades para o uso de seu território devido à sobreposição pelo Parque Estadual da Serra do Mar, criado em 1977. O documento é resultado da atuação do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU) em defesa dos direitos da comunidade tradicional. Os compromissos foram assumidos pela Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado de São Paulo, Fundação Florestal, Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), Fundação Cultural Palmares e pela própria entidade quilombola.

O objetivo do acordo é garantir o direito fundamental de titulação do território quilombola para a reprodução do modo de vida da comunidade, compatibilizando-o com a preservação do meio ambiente. A presença de um grupo tradicional, que se mantém com atividades de baixo impacto e com o uso sustentável dos recursos naturais, por meio de práticas como o roçado e o turismo de base comunitária, contribui para a preservação de áreas nativas como esse importante remanescente da Mata Atlântica em Ubatuba.

Segundo o acordo, o Itesp terá 18 meses para fazer o levantamento fundiário e o memorial descritivo do território tradicional. Após a conclusão dessa etapa, o órgão atuará em conjunto com o Executivo estadual para expedir o título de propriedade coletiva aos quilombolas em até um ano, sendo averbadas na matrícula do imóvel as restrições ambientais delimitadas no documento.

Outro compromisso fixado no acordo é a adoção de medidas pelo governo paulista para recategorizar dois trechos do Parque Estadual da Serra do Mar, os chamados Sertão da Fazenda e Ponta Baixa, áreas onde se concentra a maioria das moradias da comunidade. Para isso, deverá realizar estudos técnicos em até 12 meses e apresentar um projeto de lei para que o local deixe de ser parque (unidade de conservação de proteção integral) e se torne Reserva de Desenvolvimento Sustentável.

A recategorização do território não só viabilizará o modo de vida tradicional da comunidade, mas também permitirá o estabelecimento de até 608 residências no Sertão da Fazenda e na Ponta Baixa. No total, a área destinada a moradias passará dos atuais 133 mil para 353,7 mil metros quadrados. O acordo descreve uma série de critérios para a construção de novas habitações, como a destinação dos imóveis apenas a integrantes do próprio Quilombo da Fazenda, afastando-se o risco de ocupação por pessoas estranhas à comunidade.

O documento assinado nesta segunda prevê também a exclusividade da Associação dos Remanescentes Quilombolas na gestão do turismo de base comunitária no local e fixa as atribuições tanto da entidade quanto da Fundação Florestal do Estado de São Paulo para o desenvolvimento do manejo sustentável do território. O acordo estabelece ainda o compromisso do governo paulista de identificar eventuais ocupantes não quilombolas e removê-los da área a ser titularizada.

Quando cumprido, o pacto encerrará a disputa judicial sobre o assunto. A titulação do território quilombola em Ubatuba é objeto de uma ação civil pública contra o Estado de São Paulo, a Fundação Florestal e o Itesp, ajuizada em 2018. O acordo ocorreu por meio de mediação realizada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, após as partes recorrerem de uma sentença da Justiça Federal que julgou parcialmente procedentes os pedidos em primeira instância.

Esta não é a primeira vez que o Quilombo da Fazenda obtém o reconhecimento de seu direito territorial com o apoio do MPF. Em setembro, a comunidade recebeu o Termo de Autorização de Uso Sustentável (Taus) Coletivo referente a uma área de 8,2 mil metros quadrados pertencente à União na Praia da Fazenda.

Arte: Secom/PGR

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