Chamada para submissões no dossiê: “Palestina no contexto do colonialismo”

USP

Nos últimos 100 dias, o mundo observa um “genocídio televisionado”, transmitido ao vivo pelas suas próprias vítimas. O debate público – bem como as ruas – estão tomadas por manifestações de solidariedade, posicionamentos críticos à hubris colonialista, bem como denúncias contra o apoio irrestrito de potências ocidentais como Estados Unidos da América, e, mais recentemente, o caso apresentado pela África do Sul contra Israel no Tribunal Internacional de Justiça, em Haia.

Desde a Nakba[1] em 1948, o evento que marcou o deslocamento forçado de aproximadamente 800 mil palestinos de suas terras e casas por milícias sionistas, pessoas palestinas foram sucessivamente deslocadas, expropriadas ou martirizadas, num longo processo de transferência e limpeza étnica mais tarde nomeado ongoing Nakba -Nakba continuada- (Masalha, 2021; Pappé, 2016). De 1948 em diante, a política sionista tem sido, uma necropolítica (Mbembe, 2018), que submete as pessoas palestinas, seus corpos, terras, casas e vidas a uma constante e implacável brutalidade do Estado de Israel.

A expansão colonial e ocupação do território em sua totalidade já estava prevista desde o início da ocupação, como um projeto de limpeza étnica da Palestina (Pappé, 2016). Na atualidade, o projeto de ocupação da Palestina segue vigente, com a expansão de colonatos em todo o território, seja na Faixa de Gaza (do que a agressão recente é exemplo) ou na Cisjordânia, onde pessoas palestinas sofrem com a segregação espacial e racial, configurando um regime de apartheid (HRW, 2021).

Fora do território, gerações de pessoas palestinas têm nascido e crescido na condição de refugiados, em campos de refúgio, como é o caso da Síria, Jordânia, Iraque e Líbano, ou se deslocado para outros países em busca de melhores condições de vida e acesso à cidadania. Atualmente o Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas (ONU) estima que exista cerca de 6 milhões de pessoas palestinas em refúgio (UNRWA, 2023). As condições existenciais variam de país para país, mas a apatridia impõe dificuldades onde quer que estejam, muitas vezes se traduzindo em empobrecimento, restrição de mobilidade social e geográfica, e, sobretudo, a impossibilidade de retorno à Palestina, premissa assegurada pelo direito internacional e a resolução 194 da ONU.

A partir desse contexto, diversas etnografias vêm sendo produzidas sobre a violência cometida contra pessoas palestinas pelo Estado de Israel, com a expansão do colonialismo de assentamentos, o controle dos seus corpos – biolítica (Foucault, 2010; Mbembe, 2018), desafios de mobilidade e narrativas orientalistas, islamofóbicas ou mesmo antiárabes. Ao mesmo tempo, muito se tem dito sobre os modos de existência palestinos, que resistem e criam os meios de existir sob a ocupação. Portanto, a partir do diálogo com as etnografias brasileiras, buscamos compreender, por um lado, como a ocupação se materializa na existência de nossos interlocutores e suas as formas de (r)existir, tanto na Palestina como fora do território, o que abrange pessoas palestinas no Brasil.

Nesse sentido, esse dossiê tem como objetivo apresentar a temática a partir de análises e etnografias sob um prisma antropológico. Consideramos, ainda, o compromisso ético e político envoltos na produção antropológica, que visa contribuir não apenas para o debate científico, mas para novas formas de construção de mundo possíveis. Portanto, esperam-se trabalhos que contribuam com a perspectiva crítica e que abordem – direta ou tangencialmente -, o tema da ocupação colonial sionista da Palestina e seus efeitos (e resistência) sobre o povo palestino e seu território.

As submissões de artigos e ensaios serão aceitas até dia 22/03/2024 somente em nosso site: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo.

Os trabalhos devem seguir as normas de submissão da Revista Cadernos de Campo. Dúvidas devem ser encaminhadas para o e-mail: [email protected].

 

[1] Palavra em árabe que significa “catástrofe” usada para descrever os eventos brutais da ocupação da Palestina em 1948.

REFERÊNCIAS

FOUCAULT, Michel. 2010. Microfísica do poder. São Paulo: Edição Graal

MBEMBE, Achile. 2018. Necropolítica. Biopoder, Soberania, Estado de Exceção, Política de morte. São Paulo: n-1 edições.

HRW – Human Right Watch. 2021. Disponível em:  https://www.hrw.org/pt/news/2021/04/27/378578 Acessado em: Maio de 2021.

MASALHA, Nur. A expulsão dos palestinos: o conceito de “transferência” no pensamento político sionista 1882-1948. São Paulo: Editora Sundermann, 2021.

PAPPE, Illan. 2016. A limpeza étnica da Palestina. (traduzido por Luiz Gustavo Soares). São Paulo, Editora Sundermann.

UNRWA – United nations relief and works agency for palestine refugees in the near east. 2023. Disponível em: https://www.unrwa.org/ Acesso em: 28 Dez 2023

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