Nikolas Ferreira, Caroline de Toni e outros celerados. Ultradireita indica, para comissões-chave da Câmara, parlamentares cujo papel é amplificar a pauta ultraconservadora, ocultando o debate dos temas nacionais. Há uma resposta eficaz a esta artimanha
por Glauco Faria, em Outras Palavras
O bolsonarismo conseguiu emplacar alguns de seus nomes mais importantes para comissões relevantes da Câmara dos Deputados, já com vistas a uma estratégia para as eleições de 2024. Entre elas, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que já estava sob controle da deputada federal Bia Kicis (PL-DF), e passou para o comando de Caroline de Toni (PL-SC). Para quem não conhece a parlamentar, trata-se de uma “bolsonarista-raiz”. Como lembra Bernardo Mello Franco, já pediu o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do STF e protestou contra a prisão do seu ex-colega de Câmara Daniel Silveira, afirmando que o Supremo havia se tornado “um braço forte da esquerda no Brasil”. Esteve no ato de Bolsonaro no dia 25, foi vice-líder de seu governo e já apresentou projeto para acabar com a cota feminina nas eleições.
Com o acordo feito entre o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e o PL, maior partido da Câmara, a imposição do seu nome tornou-se inevitável, apesar da resistência da base do governo, que tentou trocar seu nome nas negociações. Restou a promessa da parlamentar de que vai “estabelecer um diálogo com o governo”, na escolha que contou com votos petistas em função do “respeito à proporcionalidade”.
A CCJ é a mais importante das comissões não só porque, como as outras comissões, avalia os projetos antes de irem ao plenário da Casa, mas também pelo fato de poder barrar uma proposta por meio da análise da constitucionalidade.
Nikolas Ferreira na Educação
Se a CCJ pode causar estragos institucionais ao atrapalhar o trâmite de projetos importantes para o governo, o potencial de estrago político e eleitoral do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) no comando da Comissão de Educação é bem maior.
Nas redes, já foi resgatado um vídeo no qual Nikolas diz não poder falar sobre a Terra ser plana porque “não estudou isso”. Mas ele também protagonizou outros episódios lamentáveis, como na ocasião em que usou uma peruca para fazer um discurso transfóbico sobre o Dia Internacional da Mulher no plenário da Casa. Divulgou ainda uma gravação com uma adolescente transgênero de 14 anos usando o banheiro feminino de uma escola particular, o que lhe rendeu a instauração de um inquérito por parte do Ministério Público de Minas Gerais.
Com um ano legislativo mais curto em função das eleições municipais, Nikolas deve usar seu poder de agenda na comissão para pautar temas que possam influenciar no processo eleitoral e vários deles se relacionam com fantasmas inventados e fomentados por extremistas como “ideologia de gênero”, escolhas de livros didáticos, acesso a banheiros e “doutrinação ideológica” nas escolas.
Outras comissões
O bolsonarismo continuou à frente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, com Alberto Fraga (PL-DF), outra comissão na qual parlamentares da chamada Bancada da Bala fazem a defesa do autoritarismo e produzem material para circular em suas redes. E conseguiu emplacar Pastor Eurico (PL-PE) na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família.
Este também deve ser outro a fomentar os temas caros à extrema direita, já que foi o autor de um projeto de lei que proíbe o casamento homoafetivo do Brasil. Diante do fortalecimento do viés religioso já apontado no ato bolsonarista do dia 25 como arma eleitoral em 2024, o pastor da Assembleia de Deus deve convocar audiências e mesmo integrantes do governo para fomentar temas e causar constrangimentos à esquerda.
O resultado das escolhas das presidências dos colegiados na Câmara pode ser o fortalecimento do poder de pauta da extrema direita. A ideia é fazer com que problemas imaginários povoem o debate público, para que os reais fiquem em segundo plano – o que é danoso para o processo democrático.
Diante do cenário, o campo progressista terá que trabalhar as pautas que digam respeito aos problemas efetivos das pessoas nas cidades e prever cenários que possam surgir com as tentativas dos extremistas em acuarem os adversários. Resta saber ainda como será o comportamento daqueles que dizem estar situados no “centro democrático”: se vão aderir ao obscurantismo de forma oportunista ou se resistirão à tentação. O embate das eleições de 2024 não será simples, mas não se pode dizer que será um cenário surpreendente dado o que tem sido o panorama político do Brasil nos últimos anos.
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Deputado federal do PL de Minas Gerais discursa no Congresso, no 08/03/2023, ironizando as mulheres e trans e dizendo que, coma peruca loura, passava a ser a “deputada Nikole”. Foto: TV Câmara.