DENÚNCIA: Vivendo em território há mais de um século, comunidade tradicional sofre despejo em Porto Velho (RO)

Com informações de Josep Iborra Plans (CPT Regional Rondônia)

Cerca de 50 famílias moradoras da Comunidade Vila São João II, localizada na BR-319 em Porto Velho (RO), procuraram a CPT Regional Rondônia por estarem sendo despejadas de suas terras. A violência aconteceu, mesmo apesar que a maioria da comunidade ser nascida e criada no local, uma propriedade titulada e registrada pelo avô deles.

Desde fevereiro deste ano, as famílias afirmam que pessoas armadas andaram circulando no local, intimidando os moradores e pressionando para as pessoas saírem, ameaçando derrubar as casas com as famílias dentro. “Todo dia estavam lá ameaçando, xingando, chamando os ocupantes de ladrão, de bandido”, relata uma moradora da comunidade, nascida no local e descendente do proprietário com título registrado. Revoltados com a situação, a comunidade se manifestou no dia 13 de março às margens da BR 319, se deslocando para a frente do INCRA, para chamar a atenção da opinião pública com a injustiça flagrante que estavam vivendo. 

Desde 2012, a comunidade sofre um processo de reintegração de posse na 9ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho, movido por uma fazenda vizinha. Segundo as famílias remanescentes do titular da propriedade, o problema começou depois que a fazenda vizinha ganhou o direito do usucapião de 27 hectares, mas acabou averbando o total 100 hectares, acreditam de forma irregular, no registro do Cartório de Imóveis do 2º Ofício da Capital, grilando 73 hectares e prejudicando os legítimos herdeiros do titular do local. Depois disso, teriam passado a vender a área grilada, desrespeitando a posse tradicional e direitos dos descendentes do titular da área. Ainda, contam, que quando as moradoras e moradores da Vila São João se declararam descendentes diretos do proprietário da área, eles foram acusados de terem falsificado os registros de nascimento e não serem descendentes legítimos do titular da área.

O avô dos moradores, o português Américo Lopes, chegou à região em 1914, e estabeleceu um engenho de melado e rapadura. Ele conseguiu registrar a terra em 1944 no estado do Amazonas, pois a região ainda era um território federal, sendo estabelecida como Estado somente na década de 1980. Américo está enterrado na Vila, assim como muitos outros ancestrais, no cemitério tradicional da comunidade. O Incra confirmou a existência do TD (título definitivo) no nome dele, registrado no Estado do Amazonas.

Segundo a defesa dos moradores, a reintegração de posse aconteceu de surpresa, por um oficial de Justiça antes mesmo de ter recebido a ordem de execução. A situação fica ainda mais tensa porque pessoas armadas estão impedindo a retirada dos bens e das estruturas das moradias.

Apesar de ter recebido visita técnica da Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça de Rondônia, e ter iniciado um processo de mediação, a reintegração aconteceu de forma cruel e injusta para dos moradores tradicionais do local. A maioria das famílias e duas empresas que estavam localizadas na mesma área, sendo uma delas um restaurante já saíram forçadas do local. Estes e outras famílias expulsas foram forçados a fazerem acordos após as decisões judiciais de reintegração e posse. A mesma está sendo objeto de recursos no TJ, com apoio da Defensoria Pública e de advogados pro bono, que tem agravado a decisão e entrado com uma ação anulatória da averbação irregular da área em conflito.

Ainda, os moradores têm apresentado vídeos e denunciam terem sofrido contínuas intimidações, humilhações e ameaças, especialmente de pessoas ligadas ao processo, que se apresentavam dizendo estarem armadas e apoiadas em todo momento pelas forças policiais. Que a polícia não tem atendido as denúncias apresentadas pelos moradores, mas em todo momento ignoraram os abusos da parte contrária no cumprimento da decisão judicial, inclusive agindo contra moradores que não estão relacionados no processo. 

Apesar dos conflitos, as famílias estão cheias de confiança, na defesa para rever seus direitos e suas roças e moradias: “Ainda não conseguimos voltar, mas seguimos com fé em Deus,  porque quem dá a última palavra é Ele”, conta uma das netas do seu Américo Lopes, pioneiro da Vila São João.

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