Eles já são 350 mil. Piso salarial e reconhecimento profissional vieram no ano passado. Agora, governo aposta em canal direto de comunicação com a categoria. Seu papel fundamental para enfrentar desafios sanitários do país será reconhecido?
por Guilherme Arruda, em Outra Saúde
Na entrevista coletiva que ofereceu na segunda-feira (8/4), ao lado de Lula, a ministra Nísia Trindade procurou apresentar o que menos tem preocupado a mídia nos últimos meses. Falou de seu programa à frente da Saúde. São políticas diversas, que vão de ensaios na digitalização do SUS à facilitação do acesso a consultas médicas com especialistas. Respondeu com ideias aos que a atacam com intrigas.
No elenco de propostas, destacou-se um capítulo: a ênfase na ação dos Agentes Comunitários de Saúde (ACSs). Já ao final do ano passado, segundo o então secretário de Atenção Primária à Saúde do MS, Nésio Fernandes, o governo havia credenciado quase 35 mil novos agentes, a maior expansão dos últimos dez anos. Os recursos destinados para a ampliação das equipes de Saúde da Família com ACSs, que chegaram a R$9,09 bilhões, também sofreram uma ampliação expressiva, de 27% em relação ao ano anterior. Na coletiva, a ministra anunciou mais duas novidades: a criação de um programa semanal e um canal de WhatsApp voltados para os agentes de todo o Brasil (o canal pode ser acessado aqui) – e uma ampliação do aplicativo que apoia seu trabalho. A ideia é que o Ministério repasse orientações e informações sobre ações especiais diretamente para os profissionais que estão atuando nos territórios, complementando a coordenação dos governos locais.
A movimentação sugere que o governo pretende oferecer uma atenção especial a estes profissionais. São cerca de 350 mil trabalhadores, se somados aos agentes de combate às endemias (ACEs) e os agentes indígenas de saúde. Além de numerosos, têm papel estratégico na execução das estratégias do SUS. E no imaginário da população, estão associados, por exemplo, ao combate a doenças que provocam temor, como a dengue. Nos últimos quinze meses, Nísia comandou um leque de ações voltadas para o estímulo à formação da categoria e à valorização de sua carreira.
Um leque de políticas de valorização
A sequência de medidas começou a tomar forma no início do ano passado. Em janeiro, Lula sancionou a Lei 14.536/2023, que reconheceu os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias como profissionais de saúde. Era uma demanda histórica das categorias, cuja carreira ficou fortalecida com a incorporação de direitos constitucionais restritos aos profissionais da Educação e da Saúde, como a acumulação remunerada de cargos públicos.
Em outubro, o STF determinou que a União poderia implementar um piso salarial nacional para os agentes de saúde. A remuneração mínima dos ACSs e ACEs foi fixada em dois salários mínimos pela Emenda Constitucional 120. A emenda também determinou que, “em razão dos riscos inerentes às funções desempenhadas”, terão assegurado o direito à “aposentadoria especial e, somado aos seus vencimentos, adicional de insalubridade”. O fornecimento dos recursos para viabilizar o piso ficou sob responsabilidade do Governo Federal.
Já em dezembro, concluiu-se a primeira turma do Programa Saúde com Agente, que qualificou 170 mil profissionais de 5,3 mil municípios. Criado por uma portaria de 2020 do MS e promovido em parceria com o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o programa oferece um curso técnico para a formação de agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias. Não é obrigatório realizá-lo para exercer a profissão: seu sentido é aprofundar os conhecimentos dos trabalhadores para “qualificar o acolhimento à população” e atuar em “conformidade com as necessidades do SUS”, diz a pasta.
Presente na cerimônia de formatura, Nísia anunciou a ampliação do programa, que passou a se chamar Mais Saúde com Agente. O currículo foi atualizado, para incluir disciplinas sobre equidade e combate às desigualdades. Outra novidade foi a parceria com as Escolas de Saúde do SUS. A turma do curso técnico a ser iniciada em 2024 – ainda não convocada – formará 180 mil novos agentes, havendo a expectativa, segundo o ministério, de capacitar mais de 300 mil profissionais, até o final de 2026.
As novas ações
Dentre as três novidades para os agentes de saúde anunciadas na segunda, o canal de WhatsApp já está no ar. O programa semanal, que será um videocast com atualidades, pautas de interesse e interação com os agentes, ainda não foi lançado. Já as mudanças a serem implementadas no aplicativo e-SUS Território terão o sentido de facilitar a “atualização das visitas à população em tempo real” e o “recebimento de informações oficiais” pelos ACSs e ACEs que o utilizam em seu dia-a-dia de trabalho, explica a apresentação da ministra.
O esforço por realizações imediatas (no jargão da política institucional, “entregas”) da pasta de Nísia relaciona-se a uma batalha pelos rumos do Ministério – cobiçado por grupos que vão do Centrão a setores do PT. A efetividade das medidas anunciadas no novo esforço de comunicação do MS ainda está por ser mensurada. Sua implementação é muito recente. Contudo, a opção por ações que valorizam uma categoria fundamental para a Saúde Pública é um bom começo – e demonstra o compromisso com o fortalecimento do SUS e de seus trabalhadores que, espera-se, deve seguir sendo o norte da pasta.
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Foto: Anasps