Comunidade Quilombola Carrasco sofre sem água e com desmatamento irregular em Arapiraca

FPI identifica grandes áreas desmatadas, extração mineral irregular no território quilombola e ausência de água encanada, a menos de 8km da Prefeitura Municipal

Em visita da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco, revelou-se a realidade da comunidade de remanescentes do Quilombo Carrasco, situada em Arapiraca, a cerca de 8 km da Prefeitura Municipal. A população enfrenta há anos a falta de água, a contaminação da água dos poços artesianos e a degradação de seu território devido a grandes desmatamentos e extração irregular de recursos naturais, como barro e piçarra.

A visita, realizada pela equipe de Comunidades Tradicionais, coordenada pelo Ministério Público Federal (MPF), contou também com técnicos da Fundação Cultural Palmares (FCP), da Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas (Semarh), do Instituto do Meio Ambiente (IMA), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), além dos Ministérios Públicos do Estado de Alagoas (MPAL) e de Minas Gerais (MPMG).

Com uma população de 315 famílias, apenas 10% delas têm acesso à água encanada em suas residências. Apesar da maioria das casas possuir encanamento e de a Casal já ter realizado até solenidade de comemoração pelo abastecimento de água na comunidade, a água nunca chegou efetivamente aos moradores.

Já a água acumulada nos poucos poços artesianos na comunidade apresenta altos níveis de nitrato, tornando-a imprópria para consumo humano, servindo apenas para a agricultura familiar. Além disso, o sistema de saneamento é precário, com fossas e sumidouros, “o que pode ser a causa da contaminação da água”, explicou o técnico da Semarh.

A falta d’água atinge também a infraestrutura pública, onde a falta de água afeta diretamente a escola local e a Unidade Básica de Saúde (UBS), evidenciando o impacto direto da escassez hídrica na qualidade de vida. Ambos os equipamentos públicos são abastecidos por caminhões-pipa. A representante do IMA na equipe constatou que uma das cisternas da escola já não tinha água e outra estava com menos da metade de sua capacidade.

Para suprir carência de água nas casas, os moradores são obrigados a recorrer a alternativas custosas, desembolsando cerca de 350 reais a cada dois ou três meses para garantir água para consumo. Essa realidade destaca a vulnerabilidade socioeconômica enfrentada pela comunidade, onde muitos dependem da agricultura de subsistência, do Programa Bolsa Família e de atividades de faxina para sobreviver, ou deixam suas famílias por trabalhos – muitas vezes – degradantes em fazendas de outros estados do país.

Quintais produtivos agroecológicos

Apesar dos desafios, iniciativas fomentadas pela Coordenação Feminina Quilombolas de Alagoas – Dandara, como os quintais produtivos, têm sido implementadas, permitindo que as famílias cultivem alimentos como feijão, milho, mandioca e macaxeira, visando à segurança alimentar e à geração de renda. A Coordenação Dandara busca promover a união entre as comunidades, buscando melhorias coletivas e sustentáveis.

Os quintais produtivos agroecológicos, além de garantir uma alimentação saudável para as famílias envolvidas, ainda permite a geração de renda, uma vez que o excedente produzido pode ser comercializado.

No entanto, a falta de apoio institucional é evidente, com a comunidade relatando nenhum avanço por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), apesar de terem solicitado assistência para demarcação de seu território. Essa alegada demora do órgão tem deixado a comunidade vulnerável às ações de desmatamentos de novos empreendimentos.

O desmatamento irregular e a extração ilegal de recursos naturais como o piçarra têm impactado negativamente o meio ambiente local, ameaçando não apenas a biodiversidade, mas também a própria subsistência da comunidade quilombola, que depende do barro para produção de artesanato, violando a produção artística e cultural das “loiceiras”.

Para o procurador da República Eliabe Soares, titular do ofício de Povos e Comunidades Tradicionais no MPF em Alagoas, “diante desse cenário, é urgente que adotemos medidas efetivas para garantir o acesso à água potável, à proteção do território quilombola e o desenvolvimento sustentável da comunidade”. Já Érico Gomes, procurador da República que compõe o núcleo de meio ambiente no estado, destacou que “a situação de degradação ambiental é alarmante, os órgãos de fiscalização ambiental serão provocados a virem no povoado Carrasco”.

Para o enfrentamento das dificuldades que atingem a comunidade quilombola do Carrasco é fundamental a colaboração entre diferentes órgãos e organizações da sociedade civil, visando garantir os direitos humanos, sociais, culturais e ambientais desses cidadãos. O relatório que será produzido pela Equipe 10 de Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural indicará as ações integradas para a promoção do desenvolvimento sustentável e a garantia dos direitos das comunidades quilombolas.

A importância da preservação das comunidades quilombolas

O território dos remanescentes de quilombo é utilizado para garantir a sua reprodução física, social, econômica e cultural, pois é nele que acontecem as relações sociais, culturais, além de ser um elemento base para a preservação da cultura afro-brasileira.

A preservação da identidade, memória e ancestralidade garante a multidiversidade do povo brasileiro, formado pelas mais diversas culturas que devem ser preservadas para que o Brasil compreenda sua própria formação e história e seja capaz de implementar políticas públicas que garantam direitos às populações invisibilizadas.

Arte: Secom/PGR

 

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