A vereadora era “o mais ativo símbolo da resistência aos interesses econômicos dos irmãos” Brazão, aponta a Procuradoria
Redação Brasil de Fato
A motivação para a execução da vereadora Marielle Franco (Psol) teria sido os embates da parlamentar contra loteamentos clandestinos na Zona Oeste do Rio de Janeiro, de acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), em denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF).
No documento, enviado na última terça-feira (7), o órgão de investigação apontou um conjunto de projetos dos irmãos Chiquinho Brazão, deputado federal, e Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), que teriam sofrido resistências devido à atuação de Marielle Franco na Câmara Municipal carioca.
De acordo com a PGR, os irmãos “possuíam interesse econômico direto na aprovação de normas legais que facilitassem a regularização do uso e da ocupação do solo, bem como o respectivo parcelamento, especialmente em áreas de milícia e de loteamentos clandestinos na cidade do Rio de Janeiro”.
“Qualquer embate ou disputa nesse campo específico da política municipal representava, portanto, uma ameaça a seus negócios e a dos diferentes grupos de milícias com os quais se associaram”, afirma a PGR na denúncia assinada pelo vice-procurador-geral da República, Hindenburgo Chateaubriand Filho.
O órgão aponta, ainda, para desentendimentos entre os irmãos Brazão e o então vereador Marcelo Freixo, presente na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Milícias. No relatório do colegiado, há indícios de que os irmãos eram os “beneficiários do curral eleitoral formado pela atuação da milícia de Oswaldo Cruz”. Na época, em 2008, Marielle era assessora de Freixo.
Esses fatores teriam contribuído “para elevar o estado de animosidade entre os irmãos Brazão e o PSOL”. “Mas ainda não se cogitava de nenhuma reação violenta. Em primeiro lugar, porque as políticas de regularização fundiária, de interesse dos denunciados, não haviam sido afetadas. Além disso, Marcelo Freixo gozava de grande projeção política. Eliminá-lo poderia gerar grande repercussão”, justificou a PGR.
Foi só quando Marielle, enquanto vereadora, passou a confrontar diretamente os irmãos Brazão que o cenário mudou. “Foram nas divergências sobre as políticas urbanísticas e habitacionais que os irmãos Brazão perceberam a necessidade de executar a vereadora. Se antes João Francisco [Chiquinho] aprovava sem dificuldades as suas pautas de interesse, a chegada de Marielle mudou radicalmente esse quadro”, pontuou a procuradoria.
Segundo a PGR, a Marielle se tornou “a principal opositora e o mais ativo símbolo da resistência aos interesses econômicos dos irmãos”. “Matá-la significava eliminar de vez o obstáculo e, ao mesmo tempo, dissuadir outros políticos do grupo de oposição a imitar-lhe a postura.”
Denúncia contra irmãos Brazão
Na última terça-feira (7), a PGR denunciou os irmãos Brazão pelo assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. O ex-chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, também foi denunciado pelo caso. Os três estão presos preventivamente desde março. As prisões ocorreram após a delação do ex-policial militar do Rio de Janeiro Ronnie Lessa, réu confesso por matar Marielle. Ele está preso desde março de 2019 e foi condenado em julho de 2021 por destruir provas sobre o caso.
Dois dias depois, nesta quinta-feira (9), a Polícia Federal (PF) prendeu Robson Calixto da Fonseca, conhecido como Peixe, ex-assessor de Domingos Brazão por envolvimento na gestão de negócios imobiliários irregulares dos irmãos Brazão. Ele é acusado de participar da organização criminosa liderada pelos irmãos.
Também foi cumprido um mandado contra Ronald Alves de Paula, o Major Ronald, apontado como um dos responsáveis por monitorar a rotina de Marielle. Ele já está preso na Penitenciária Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, por outros crimes.
Major Ronald monitorou as redes sociais de Marielle Franco e identificou que a vereadora estaria em um evento na Casa das Pretas, em 14 de março de 2018. Segundo a PGR, tratava de uma “oportunidade para a execução do homicídio”, uma vez que o local estava fora do trajeto costumeiro da vereadora. Essa era uma exigência do delegado e ex-chefe de Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, para evitar conotações políticas.
A informação foi repassada para Edmilson “Macalé”, que fazia a ponte com Ronnie Lessa, “que aceitou a empreitada homicida, pois os irmãos Brazão expressamente afirmaram que o então chefe da Divisão de Homicídios da PCERJ [Rivaldo] teria contribuído para preparação do crime, colaborando ativamente na construção do plano de execução e assegurando que não haveria atuação repressiva por parte da Polícia Civil”.
Edição: Rodrigo Chagas
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Foto: Marcelo Camargo /Agência Brasil