Águas baixando, conta subindo: governo gaúcho já calcula R$ 62 bilhões em prejuízos, enquanto indenizações, que já somam R$ 1,6 bilhão, devem mais que dobrar.
Bilhões de reais já foram destinados ao Rio Grande do Sul para recuperação e apoio à população gaúcha após a catástrofe climática que durou um mês inteiro. No entanto, o preço da tragédia ainda não atingiu seu teto. Com o recuo das águas, é hora de fazer mais cálculos. E as cifras continuam subindo.
Preliminarmente, o governo do RS estima prejuízos de R$ 22 bilhões em fluxo de transações e de R$ 35 a R$ 40 bilhões em estoque de capital. Por isso, pede socorro da União para garantir neste ano um nível de arrecadação equivalente ao de 2023, além de um programa de flexibilização de contratos de trabalho para empregados da iniciativa privada, em modelo semelhante ao da chamada Lei do Bem [Benefício de Manutenção de Emprego e Renda], aplicada no período da pandemia de COVID-19, detalha o Valor.
Uma análise do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) havia mostrado que 95% dos 3,2 milhões de empregos no estado foram atingidos pela tragédia. E outro levantamento, da plataforma LifesHub, detectou que o impacto é ainda maior em micro e pequenas empresas.
Em entrevista à CBN, Ademar Paes Júnior, CEO da LifesHub, informou que cerca de 195 mil micro e pequenos negócios foram impactados pelos alagamentos, afetando pelo menos 711 mil empregos diretos. Para o especialista, é preciso apurar o olhar para essas empresas, e assim, restabelecer tanto a dignidade dos empreendedores quanto das pessoas que trabalham nesses setores.
Para Paes Júnior, as empresas enfrentam uma situação de calamidade. E agora, após uma fase de grande atenção humanitária, é crucial o foco nas micro e pequenas empresas, que foram duramente afetadas e precisam de apoio.
Outro setor a atualizar as contas é o de seguros. As estimativas de indenizações na faixa de R$ 1,6 bilhão devem mais que dobrar rapidamente, disse o presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), Dyogo Oliveira. Pelo último levantamento da associação, há duas semanas, o total de sinistros reportados já tinha passado de 23 mil, informa o Investing . com.
Um dos símbolos da paralisação do estado é o aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, onde a água deixou aviões submersos. No fim de semana passado, começou a operação de limpeza do terminal, mostra o g1, e o aeroporto só deverá voltar a operar no Natal, avalia o governo federal.
A retomada da economia no RS após a tragédia climática deve ter metas claras e começar pelo saneamento e pela garantia de dignidade das pessoas. Sem isso, a reconstrução pode levar décadas, e o estado pode ter fuga de jovens, avaliam especialistas ouvidos pelo UOL.
“O que temos é um cenário de guerra”, lembrou Mário Mendiondo, coordenador científico do Centro de Estudos e Pesquisas em Desastres (CEPED) da USP. “Se houver um plano claro, a recuperação, em vez de décadas, pode levar anos.”
E nesse momento em que a recuperação vai ganhando contornos mais nítidos, Mahryan Sampaio chama atenção no Um só planeta para a necessidade de que a adaptação climática gaúcha seja antirracista. Ela frisa que adotar medidas extraordinárias para desastres sem pensar em planejamento é como “secar a água que cai de uma torneira aberta, em fluxo contínuo”.
“A sequência de erros na gestão de riscos climáticos têm custado vidas, e a carne mais barata do mercado continua sendo a carne negra. Hoje existem cerca de 6,8 mil famílias quilombolas no RS que foram severamente atingidas. Quando questionado, o poder público afirma que será impossível atender a todos. Nos encontramos novamente em uma representação da necropolítica: escolhe-se quem vive e quem morre com base na cor da pele, em classe social, gênero e CEP. E esse é um dos motivos que ilustra que, além de cobrar por políticas efetivas de adaptação, é fundamental que elas sejam antirracistas.”
Em tempo 1: A quantidade de chuvas que caiu no RS entre o fim de abril e o começo de maio foi tão grande que rompeu a escala do gráfico usado para visualizá-las, destaca a Agência Pública. O mapa de anomalia de precipitação do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), que compara os volumes observados no mês com a média histórica de 1961 a 1990 para o período, não foi capaz de dar conta da dimensão do fenômeno. “Toda a área em azul mais escuro no estado ficou acima de 500 mm, de ponta a ponta. Em Porto Alegre, a normal climatológica para maio é de 112,8 mm, mas choveu 539,9 mm”, explica Marcelo Schneider, coordenador do distrito de meteorologia de Porto Alegre do INMET. Na capital gaúcha, foi o mês mais chuvoso em 108 anos, desde quando começaram os monitoramentos contínuos do INMET na região, em 1916.
Em tempo 2: No próximo fim de semana os municípios gaúchos podem registrar em 72 horas um acumulado de chuva superior à média prevista para o mês, com os volumes podendo variar entre 150 mm a 200 mm, alerta a Defesa Civil. As instabilidades ocasionadas pela passagem de uma frente fria vão atingir todo o estado, mas as regiões dos Vales, Metropolitana, Porto Alegre, Litoral Norte e Serra deverão ter os maiores acumulados, informam g1, Valor e Agência Brasil. No domingo (9/6), o total de mortos pela tragédia climática que atingiu o RS em maio subiu para 173, e o número de desaparecidos caiu de 44 para 38, detalha o g1.
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Foto: Ricardo Mansur – Palácio Piratini